Assim, os tipos vão mesmo
ganhar a guerra
O Islão fundamentalista instalou uma guerra na Europa. E nada leva a crer que não esteja a ganhá-la.
O boom do turismo em Portugal fica a dever-se à qualidade da
oferta, à gastronomia, às praias, ao clima, ao gosto de receber, aos
preços e à segurança. Salvo esta última característica, todas elas já
existem há muito tempo, pelo que é de admitir que seja precisamente esta
última a exercer uma forte pressão sobre a procura. Isto quer dizer que
o Islão fundamentalista está a ganhar a guerra que decidiu instalar na
Europa.
Há um indicador que evidencia ainda mais o andamento da guerra no
terreno: alguém de bom senso deixa o seu filho adolescente fazer um
interrail com paragens em Paris, Londres, Bruxelas, Berlim ou Istambul? É
de bom tom que os responsáveis políticos e as pessoas que estão
convencidas que o que dizem nas redes sociais é importante afirmem, nos
dias a seguir ao atentado, coisas como “ninguém nos verga”, “ninguém há
de destruir a nossa liberdade”, “nada vence a democracia” e afinidades
do género, mas se se pensar na questão durante cinco segundos, não é
preciso mais, não é difícil perceber que a vida na Europa não vai mudar:
já mudou.
E é neste ambiente em que o medo começa a infiltrar-se por todo o
lado e já não nos sai do pensamento que o presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump, resolveu fazer uma viagem de Estado como a que acabou
ontem ou anteontem. Mal se meteu no avião, Trump foi dormir com o
inimigo, num colchão de mais de 300 mil milhões de dólares. Ninguém sabe
ao certo se a ida do presidente dos Estados Unidos à Arábia Saudita foi
uma viagem de Estado, uma viagem de negócios ou um exercício prático de
alta diplomacia para efeitos curriculares – mas o certo é que, ele que
tudo pode e a quem tudo deve ser permitido, obrigou os países europeus a
olharem para aquilo tudo de boca aberta, sem terem a certeza se as
imagens seriam verdadeiras ou mera simulação computacional.
Pelos vistos, o Papa Francisco foi um dos que não teve dúvidas: tudo
aquilo aconteceu mesmo. No dia seguinte, recebeu o casal – quem
aconselhou a mulher e a filha de Trump a irem ao Vaticano vestidas
daquela forma merece a nossa eterna gratidão como alguém com um sentido
de humor invejável – com o semblante de quem está a olhar para um pedaço
de carne em avançado estado de podridão, mas ninguém está a ver e por
isso não tem de disfarçar. Como o Papa sabia que alguém estava a ver – o
mundo inteiro – e não quis disfarçar, o semblante de Francisco passa
diretamente para a condição de manifesto político ou, para ser mais
brando, de murro nos dentes.
A patusca viagem presidencial acabou como tinha começado: com um
dos seus mais incondicionais parceiros internacionais, o Reino Unido, a
acusar a Casa Branca de fuga de informação altamente confidencial sobre
matéria de terrorismo, tal como tinha acontecido dias antes com outro
incondicional país-amigo, Israel.
Ah!, é verdade: ainda houve a cimeira da NATO, onde Trump foi
avisar os desavisados parceiros europeus que, ou pagam, ou não há defesa
militar solidária para ninguém – o que vai com certeza obrigar o senhor
Jean-Claude Juncker a enviar uma nota interna aos serviços competentes,
para que estes deixem de contabilizar os orçamentos militares como
despesa, o que até pode ser bom para os défices dos Estados-membros.
No meio disto está a Europa – com os europeus sem saberem muito
bem onde enfiarem os filhos para não terem de ir prematuramente ao seu
funeral – exangue, desvairada e triste. Esperemos ao menos que não
desate tudo a correr para as urnas, a votar nos membros dos partidos da
extrema-direita – esses que, quando veem um muçulmano, ou desatam a
correr cheios de medo, ou chamam umas dezenas de capangas a soldo para
lhe dar um vingativo e altaneiro enxerto de porrada. Pode não ser por
mais nada, mas é mesmo isso que o Daesh quer que a Europa faça, e ao menos esse gosto não lho devemos dar.
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
27/05/17
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