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"OBSERVADOR"
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Nas “escolas de insucesso” professores
.olham para o chumbo como algo “natural”
Portugal é o segundo país da OCDE com mais chumbos precoces e o problema é particularmente grave no 2.º ano. Maioria das "escolas de insucesso" estão no interior e em Lisboa.
Portugal é o segundo país da OCDE com mais chumbos no ensino primário,
logo a seguir à Bélgica. Em 2015, 17% dos alunos que participaram no
PISA (com 15 anos) tinham repetido, pelo menos, uma vez no primeiro
ciclo. E é no 2.º ano de escolaridade que o problema é “particularmente dramático“.
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Não ignorando as dificuldades de aprendizagem, nem os contextos
familiares desfavoráveis, parece ser a forma como o chumbo é encarado,
por professores e diretores, a principal determinante para a sua
persistência, concluem os autores do projeto “Aprender a Ler e a
Escrever em Portugal”, apresentado esta segunda-feira.
Escrevem os autores que face à evolução da taxa de retenção no 2.º
ano de escolaridade, nos últimos anos, com uma “descida muito
significativa” entre 2001 e 2009, seguida de uma subida, “aparentemente,
o efeito das medidas de política para eliminar o problema do insucesso
nos primeiros anos de escolaridade (…) atingiu o limite da eficácia,
sendo agora mais difícil registar melhorias sólidas”. Entre essas
medidas contam-se a generalização do pré-escolar, a integração das
escolas do primeiro ciclo nos agrupamentos, entre outras. E a situação é
“particularmente dramática” no 2.º ano porque no 1.º é proibido chumbar
os alunos.
Mas a verdade é que para os professores entrevistados “o
tempo, ou seja, a repetência, é o elemento que permite compensar a
ausência das condições familiares”.
A maioria dos professores
entrevistados nas 127 escolas visitadas acredita não ser possível
eliminar por completo o insucesso no 1.º ciclo, sobretudo por causa do
contexto familiar. E referem que as medidas aplicadas ao longo do ano
para recuperar os alunos não são suficientes. Esses professores
“consideram que algumas crianças precisam de mais tempo para aprender” e, muitos deles, “consideram que aos seis anos muitas crianças revelam imaturidade, e que deviam entrar mais tarde na escola”.
Assim sendo, a maioria dos professores (87%) olham para o chumbo como “uma boa solução”, tendo “mais vantagens do que desvantagens”,
desde logo porque, segundo eles, permite adquirir e consolidar
aprendizagens. A repetência é, por isso, vista como uma oportunidade e
não como um problema”, lê-se nas conclusões do estudo coordenado por
Maria de Lurdes Rodrigues e por uma equipa de investigadores composta
por Isabel Alçada, João Mata e Teresa Calçada.
Perante estas
reacções, frisam os autores que se verifica “uma enorme distância em
relação aos debates científicos sobre o insucesso e a prática da
repetência”. “No mesmo sentido, não são equacionados ou sequer
invocados pela maioria dos professores os debates sobre medidas e
possibilidades alternativas de intervenção que rejeitam tanto a repetência como a passagem automática”.
O problema do insucesso e das dificuldades de aprendizagem está nestas escolas ‘naturalizado’, nada há a fazer a não ser aceitar isso mesmo e conformar as práticas pedagógicas a essa realidade.”
E
é esse distanciamento em relação aos estudos e debates científicos que
mostram a ineficácia do chumbo, mas também em relação à possibilidade de
envolver as famílias, e ainda o distanciamento em relação a soluções
alternativas ao chumbo e a transformação deste que é um problema de
ensino e aprendizagem, num problema de gestão e organização pedagógica
que “impede a resolução do fenómeno da repetência precoce e alimenta a
sua resiliência.”
Os autores frisam porém que em cerca de 900 escolas não se
chumbaram crianças no 2.º ano de escolaridade. E que o chumbo já é
percecionado como uma prática ineficaz, observando-se uma transição
“lenta” do chumbo para outras práticas pedagógicas. Aliás, mesmo algumas
das 127 escolas de insucesso visitadas em 2014/2015 já tinham mudado a
situação.
Maioria das escolas de insucesso estão no interior e em Lisboa
De 3.866 escoals primárias públicas, em 2013/14, 541 apresentavam taxas de chumbos superiores à média nacional em todo os anos de escolaridade.
Mas a análise levada a cabo pelos autores deste estudo permitiu
perceber que “o insucesso não atinge de forma idêntica todas as escolas
do país” e tão pouco é um “fenómeno disseminado”. O problema da repetição ocorre em cerca de dois terços dos concelhos (171). Seis em cada 10 “escolas do insucesso” estão localizadas em apenas 40 concelhos.
A
maior incidência de escolas de insucesso verifica-se nos concelhos do
sul, do interior e em Lisboa. Das 541 escolas de insucesso, 39 ficam em
Lisboa, o que corresponde a quase metade (42%) do parque escolar da
cidade.
Pode concluir-se que o problema do insucesso no segundo ano de escolaridade assume proporções mais dramáticas em escolas do interior do país e da periferia da cidade de Lisboa”, lê-se no estudo. Além disso, os autores confirmam que o insucesso é “tributário de desigualdades territoriais que as escolas não conseguem contrariar”.
Sublinham ainda os autores
que, em Portugal, como em muitos outros países, “o sistema de ensino
instituído conta para ter êxito, com as famílias” e “quando esta
variável não existe, quando não se pode contar com o apoio das famílias,
ou quando a família é uma força divergente, aumenta muito a
probabilidade de insucesso dos alunos”.
* Quando estes estudiosos foram professores qual era a taxa de insucesso na sua docência?
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