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"JORNAL DE NOTÍCIAS"
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Cegos trocaram as bengalas
pelas tesouras da vindima
Cegos e amblíopes foram ao Douro à vindima: pousaram as bengalas, pegaram nos baldes e tesouras e tatearam as videiras para cortaram uvas, uma experiência única para alguns destes novos vindimadores.
Fernando Gabriel, 74 anos, toca a videira,
desvia as folhas e procura os cachos das uvas. Segue à risca as
instruções dadas pelo monitor da Quinta da Avessada, no planalto de
Favaios, concelho de Alijó.
"Temos
que procurar os cachos. Explicaram para se por a mão por baixo, para
cortar em cima e deitar no balde", afirmou à agência Lusa.
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Fernando
é cego desde os 18 anos, trabalhou como telefonista, está reformado e
fez questão de vir com o grupo da delegação do Porto da Associação dos
Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO) à procura de uma nova experiência.
Com
a ajuda da mulher, Teresa Gonçalves, avança para uma outra videira. Às
vezes encontra os cachos emaranhados e é "mais trabalhoso" encontrar o
pé da uva, onde coloca a tesoura, mesmo encostada ao dedo, e corta.
"Uma das recomendações que nos fizeram foi de chegarmos com os 10 dedos ao final", gracejou.
Esta
foi também a primeira vez que Maria do Céu Francisco, 57 anos,
vindimou. "Correu bem. Consegui apanhar um balde dos grandes de uvas,
não é aquele pequenino, dos outros grandes", frisou.
Ficou cega aos três anos e foi muito protegida pela mãe, que nunca a deixou trabalhar.
"Mexer
nas folhas, pegar o cacho na mão, ser eu a cortar, saber que esse cacho
vai dar vinho para outras pessoas beber, é uma coisa muito importante.
Eu achava o vinho muito caro, mas agora, vendo o trabalho que ele dá,
acho que o preço está muito justo", sublinhou.
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O casal Francisco,
48 anos, e Alexandra Figueiredo, 41 anos, aventurou-se nesta vindima com
a ajuda da filha que ia saltitando entre os dois para ajudar e dar
algumas instruções.
"Está a ser muito interessante. Estou a gostar muito", sublinhou Francisco.
Para
além da visão reduzida, Susana Monteiro, de 34 anos, tem uma
deficiência motora no braço direito que a obriga a sentir e cortar
apenas com a mão esquerda.
"Correu bem. Eu parto para as coisas
sempre com um pensamento positivo, tentando não bloquear e não complicar
as coisas só por complicar", frisou.
Susana faz parte da direção
da ACAPO e referiu que, quando sentiu perda de visão, deixou de sair de
casa sozinha. Hoje já o faz outra vez e disse que é feliz, como qualquer
outra pessoa.
"Recusamo-nos a ficar isolados, a ficar em casa.
Nós não somos os cegos e os coitadinhos. Somos pessoas que temos
mobilidade reduzida e há coisas que nós não fazemos, mas lutamos para
que sejamos autónomos e fazemos muitas atividades", afirmou Paula Costa,
de 48 anos e presidente da delegação do Porto da ACAPO.
Este grupo já experimentou conduzir jipe e, depois da vindima, segue-se o caiaque.
Paula
perdeu 95% da visão há 10 anos. "Quando vamos para as vinhas, para uma
aldeia, para o monte, vemos a paisagem. Quando perdemos a visão não
vemos a paisagem mas, se calhar, sentimos o resto que as pessoas com
visão não sentem, que é o barulho dos pássaros, os ruídos, os cheiros",
explicou.
Nesta experiência na vinha, destacou o barulho das tesouras, o toque das folhas, o sabor das uvas.
A
Quinta da Avessada recebe milhares de turistas durante o ano. No
período de vindima o número de visitantes praticamente duplica nesta
unidade que possui uma enoteca, onde se conta a história do Douro e se
desvendam os segredos da produção de vinho e do moscatel de Favaios.
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"É
a primeira vez que estamos a ter cegos a cortar uvas. Cortaram 20
bombos de uvas em 45 minutos, ninguém cortou os dedos e ficaram todos
muito satisfeitos", salientou o proprietário, Luís Barros.
A
equipa da quinta preparou-se para um cuidado extra com este grupo mas,
segundo o responsável, "não foi preciso". "Eles conseguem-se orientar
muito bem e cortaram muito melhor do que algum pessoal do campo",
brincou.
A vindima foi acompanhada pelos sons do acordeão e do bombo e ainda houve tempo para um baile improvisado.
* Uma maravilhosa jornada na Quinta da Avessada.
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