17/03/2015

FRANCISCO MOITA FLORES

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Tanto disparate!

O Ministério Público quer abocanhar a Polícia Judiciária. E não se percebe esta fome.

Esta semana houve momentos em que julguei estar a ler notícias de um manicómio e não sobre o País. A desorientação é grande, existe uma cultura do salve-se quem puder e, no domínio da segurança e investigação criminal, criou-se uma espécie de jogo sobre quem diz o maior disparate.

A coisa começou com um relatório feito por académicos e ex-governantes sobre os destinos da Segurança e tinha duas finalidades, nada originais, que revelam mais sobre o enquistamento intelectual dos autores do que sobre o que dizem querer melhorar: a existência de um ministério único para as polícias e uma polícia única. Um velho professor ensinava-nos: quem não sabe, teoriza. Este caso, onde se remete a investigação criminal para qualquer coisa vaga, e a Segurança é a pretensa prioridade central, cabe em tal ordem de grandeza.

Quem conhece as polícias na dimensão macro, quem lhe desconhece motivações, ações, quotidianos, teoriza, mas não sabe. Com uma desvantagem: aquilo que se propõe já foi testado noutros países e, em todos, houve um claro recuo. Aliás, muitos deles olham a realidade portuguesa como modelo a seguir.

Ao mesmo tempo, o Ministério Público quer abocanhar a Polícia Judiciária. E não se percebe esta fome. Porquê a PJ? Porque não todos os órgãos de polícia criminal? Teria mais lógica, pois aquela instituição dirige todos os inquéritos, estejam em que polícias estiverem. Esteve bem a ministra em matar a ideia delirante. Era um ataque contra a Constituição e o princípio da igualdade no tratamento dos crimes. Entregar a definição de políticas criminais a quem não é eleito, e não pode ser escrutinado, é, até, diminuir uma magistratura recolocando-a como chefe de polícias. Pior, é entregar a quem não nasceu para investigar territórios com particularidades únicas.

E, finalmente, é não perceber mesmo nada de investigação criminal, que se fundamenta na transversalidade e verticalidade da informação. Ao menos que fosse por um caminho coerente, rico e de serviço público sério e eficaz. Soubessem de investigação e saberiam que o caminho é outro: reconstruir uma nova Polícia de Investigação Criminal, sem ilhas e poderzinhos ridículos, nem olhando para umbigos, que refizesse laços e nós de uma estrutura tão necessária no combate ao crime. Para isso, é preciso coragem, desprendimento e pôr o País à frente de interesses paroquiais. Mas isso é chão que já deu uvas. Entrámos no mundo da anedota.

IN "CORREIO DA MANHÃ"
08/03/15


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