O independente
Toda a gente sabe que as autárquicas não são eleições nacionais, mas também toda a gente repete ou insinua com fervor que, apesar disso, nos dão uma ideia de às quantas andamos. Continuo a pensar que pouco nos dizem. E é preferível que assim seja. De outro modo, o que devemos pensar quando ouvimos os gritos de ‘I-sal-tino, I-sal-tino’ para receber o novo autarca de Oeiras? Que conclusões devemos tirar quando se elogia a famigerada humildade do derrotado Luís Filipe Menezes e se esquece a irresponsabilidade da sua candidatura desligada da realidade nacional? Que mérito tem António Costa quando o seu concorrente directo é ainda mais fraco como político do que como comentador desportivo? Mas apesar de tudo, talvez só no Porto pudemos ver um pouco do futuro que nos espera. Um independente que, apesar de ter apoio partidário, acreditam com alguma ingenuidade ser de sangue e moral novos. Qual será o independente nacional que nos espera?
Bom gosto
Uma
notícia no Telegraph chamou a minha atenção para uma realidade que me
estava a passar ao lado. Parece que o sucesso de Cinquenta sombras de
Grey, que não li, não vou ler e não gosto, fez aumentar as vendas de
brinquedos eróticos. Algemas, vibradores, etc, fazem agora parte dos
lares de muitas famílias. Muitas, mas não todas. Na pequena cidade de
Aberystwyth, no sul de Gales, a única sex shop abriu falência porque não
conseguiu vender um único par de cuecas atrevidas aos locais. A
proprietária da loja Nice ‘n’ Naughty, Trish Murray, avançou, desolada,
para uma explicação: ‘Talvez as pessoas de Aberystwyth não sejam
suficientemente perversas’. A perversão está aqui como tradução pouco
rigorosa de ‘kinky’, com as minhas desculpas. Penso que Ms Murray pode
estar a sobrestimar os produtos que vende e a subestimar os habitantes
desta terra de nome impronunciável. Pode ainda dar-se o caso de os
aberystwythianos terem bom gosto literário.
Em defesa da abstenção
Falei
aqui quase nada sobre as eleições autárquicas porque decidi há algum
tempo que não iria votar nestas eleições. As razões são simples. A
polémica sobre os dinossauros autárquicos deprimiu-me e uma pessoa
deprimida sai menos de casa. Depois, a decisão do Tribunal
Constitucional ainda me deprimiu mais. Se eu fosse o Tribunal
Constitucional (todo, bem entendido), tinha enviado a lei de volta para a
Assembleia, alegando não ter competência para decidir sobre um assunto
da responsabilidade dos senhores deputados. Assim, ficou tudo esquisito.
Havia um problema sério e ninguém o quis resolver. Na minha cidade de
Lisboa, os candidatos eram invotáveis, se me permitem o neologismo.
Perante um cenário impossível, a única decisão sensata era não pôr lá os
pés. No dia seguinte, muitos dos que votaram trataram com desprezo os
que se abstiveram de o fazer. Como se escolher não votar não fosse um
direito e a abstenção não tivesse significado.
Coragem feminina
As
notícias sobre a violação e morte de uma estudante num autocarro em
Nova Deli chegaram incompletas a esta parte do globo. Parece que um
sector da sociedade culpou a vítima. O guru Asaram Bapu foi uma das
personalidades que defendeu que a vítima agira mal ao ter resistido e ao
não ter chamado ‘bhaya’ (irmão) aos atacantes, que assim a teriam
deixado em paz. Como reacção aos comentários machistas como este,
algumas mulheres, entre as quais a actriz Kalki Koechlin, fizeram um
vídeo intitulado ‘It’s my fault’,
‘A culpa é minha’, em que apresentam as causas principais de violação. A
minha preferida aparece logo no início e tem a ver com o vestuário.
Nenhuma das opções apresentadas, da minissaia à burca, são aceitáveis.
Se a mulher estiver vestida de astronauta, também é culpada de ter sido
violada, ‘porque os homens têm olhos!’ O humor do vídeo não é para
estômagos sensíveis_e recomendo absolutamente:
www.youtube.com/watch?v=
8hC0Ng_ajpY.
Clientela selecta
Um leitor da
Slate perguntou ao editor de economia, Matthew Yglesias, por que razão
Walter White, o professor de Química que se torna fabricante de
metanfetaminas na série Breaking Bad e faz uma fortuna com a droga, com
os problemas adjacentes de lavagem e armazenamento do dinheiro, não põe o
dinheiro nas ilhas Caimão ou na Suíça. Yglesias, com desassombro
profissional, explica que os bancos na Suíça e nas famosas off-shores
foram feitos para os ricos fugirem aos impostos ou para maridos e
mulheres que querem evitar divórcios custosos. Estes bancos têm de
conhecer, pelo menos oficialmente, a origem do dinheiro. Os terroristas,
mafiosos, narcotraficantes ou ditadores não são os clientes adequados.
Os bancos suíços responsabilizam Hollywood pela percepção fraudulenta e
paradisíaca que deles tem o comum dos cidadãos. Não sei se o leitor terá
ficado satisfeito com a resposta. Eu não fiquei. E Hollywood não tem
nada a ver com isso.
IN "SOL"
09/10/13
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