.
* Directora do Zoo Santo Inácio
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
08/06/20
.
A Preservação da natureza
não pode ficar em extinção
O ritmo das mudanças ambientais naturais aumentou dramaticamente:
terramotos, o aumento da temperatura e consequente degelo, entre muito
outros. Mas, também a alteração provocada pelo homem sofreu acelerações,
a substituição de terrenos selvagens para urbanização ou cultivo
aumentou a um ritmo acelerado. O equilíbrio dos sistemas essenciais para
a vida é interrompido e, embora a natureza tenha uma resiliência
notável, não tem tempo suficiente para recuperar todas estas alterações.
Nos
primórdios do século XX, nada fazia prever que se dava início ao que
atualmente é considerada a sexta extinção em massa em curso no planeta
Terra. Hoje, o ser humano debate-se com um panorama, no qual, de oito
milhões de espécies no mundo, existem cerca de um milhão de animais e
plantas sob ameaça de extinção.
Este cenário negro, mas realista,
descortinado pelo relatório da Plataforma Intergovernamental sobre
Biodiversidade e Serviços Ecossistémicos (IPBES), publicado pelas Nações
Unidas em 2019, pode tornar-se permanente e irreversível se alterações
profundas e céleres não forem adotadas. As populações selvagens da
maioria dos principais habitats terrestres caíram em pelo menos 20%,
principalmente desde 1900. Pelo menos 680 espécies de vertebrados foram
levadas à extinção desde o século XVI e mais de 40% das espécies de
insetos estão em declínio, estando já 1/3 classificadas como ameaçadas.
Isto
demonstra que cada dia é um passo dado na direção do abismo para
centenas de espécies em risco e salvar estas espécies de uma extinção
quase certa é uma corrida contra o tempo, na qual os parques zoológicos
contribuem incrivelmente para amortizar estes números tão preocupantes.
A
biodiversidade é um quadro maravilhoso onde se pintam todos os seres
vivos que existem na Terra, com a sua diversidade genética e
ecossistemas distintos. Nesta pintura não existem personagens
secundárias ou figurantes. Cada uma destas espécies desempenha um papel
fundamental e tem um protagonismo que não lhe pode ser retirado. A
ausência de qualquer um destes atores pode alterar o curso da história,
encaminhando-nos para um desfecho que não é desejável.
Atualmente, todas as causas remetem apenas a um fator: o Homem. As
principais causas de extinção são a degradação e a fragmentação dos
habitats naturais, resultado da abertura de grandes áreas para
implantação de pastagens ou agricultura intensiva, urbanização,
poluição, incêndios florestais, indústria madeireira e mineira, e caça.
Esses fatores reduzem o total de espaços disponíveis para as espécies e
aumentam o grau de isolamento entre as suas populações, diminuindo a
diversidade genética, o que pode conduzir, eventualmente, à extinção de
espécies.
Outra causa importante que leva espécies à extinção é a
introdução de espécies exóticas, ou seja, aquelas que são levadas para
além dos limites de sua área do seu habitat natural. Essas espécies
apresentam vantagens competitivas e favorecidas pela ausência de
predadores e, aproveitando-se dos espaços criados pela degradação dos
ambientes naturais, dominam os nichos ocupados pelas espécies nativas,
eliminando-as.
Os parques zoológicos são agentes ativos na
garantia de que espécies que se encontram esbatidas e ameaçadas, não se
deixem apagar nos abismos da extinção. A questão é: como é que os
parques zoológicos desempenham o seu papel e porque são necessários?
A
missão de conservação das espécies é cumprida em várias linhas de ação.
Primeiramente, a reprodução. A forma mais intuitiva da preservação das
espécies é através da continuidade das mesmas garantindo uma linhagem
genética pura.
De seguida, existe o reconhecimento de que a
mudança começa com a consciência de que algo está mal e de que a ação é
necessária. É aqui que o papel dos parques zoológicos volta a ser
reiterado, desta vez enquanto entidades que sensibilizam e educam a
comunidade para a profundidade dos desafios que a fauna atravessa.
Os parques zoológicos permitem, às populações que os visitam, dar a
conhecer inúmeras espécies, que por razões de distância geográfica
existem apenas no imaginário ou muitas vezes são até desconhecidas pela
raridade de que são alvo. A complexidade de envolver as pessoas na
preservação prende-se com um lema difícil de que apenas defendemos
aquilo que nos é próximo e conhecemos.
Poder transmitir às pessoas quem
são os animais e as dificuldades que a vida selvagem sente, torna-se
essencial para que elas também possam desempenhar um papel
importantíssimo de embaixadores da natureza, ajudando a preservar.
Ao
participar e divulgar programas de conservação in-situ, os zoos apoiam o
restauro das populações animais nos locais de origem, reestabelecendo o
equilíbrio dos ecossistemas.
É através de uma rede de parques
zoológicos, à qual o Zoo Santo Inácio pertence, a Associação Europeia de
Zoos e Aquários (EAZA), que ocorre a partilha gratuitade animais.
Algumas espécies estão listadas no Programa Europeu de Espécies
Ameaçadas (EEP), onde existe um coordenador que sabe onde está cada um
dos animais pelos zoos da Europa e que trata de juntar os potenciais
"pares" ou formar bachelor groups (grupos com indivíduos do mesmo sexo),
contribuindo para a manutenção das espécies e sua variabilidade
genética.
Salvar a biodiversidade é um papel de todos nós, quer
seja através da mudança de comportamentos individuais, quer seja através
de partilha de conhecimentos e experiências, quer através de donativos e
apoio a estes espaços.
Está ao nosso alcance, enquanto parte
ativa do Ecossistema Terra, reconhecer os desafios que atualmente se
colocam à biodiversidade e abraçar o poder que todos temos de pincelar
este quadro com ações em prol da natureza. Neste caminho, o papel dos
parques zoológicos, que todos os dias contam com profissionais
dedicados, que colocam como prioridade o bem-estar dos animais e a
perpetuação das espécies animais, não pode ser esquecido.
Há um caminho, e há vontade! É preciso persistir e não desistir. O
comportamento que cada um de nós exprime será sempre observado e copiado
por alguém.
Conhecer estes espaços, os seus animais e sair de uma
visita ao Zoo Santo Inácio com a consciência renovada podem parecer
simples gestos, mas podem significar a garantia da sobrevivência e de
uma vida melhor para muitas espécies, inclusive da própria vida humana.
* Directora do Zoo Santo Inácio
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
08/06/20
.
Sem comentários:
Enviar um comentário