O vazio
de um centro excêntrico
Era uma vez uma monarquia sem monárquicos, a que se sucedeu uma
república por republicanizar, até chegar uma de fascismo sem fascistas.
Corremos o risco de continuar uma democracia sem povo.
Mas fomos a
votos. Está decidido. Contudo, há uma verdade política, raramente dita,
que, neste dia seguinte, deve ser recordada: Salazar, se fosse a votos,
nos seus tempos áureos, venceria as eleições, mesmo dentro das regras
defendidas pelos oposicionistas. Até o senhor D. Miguel poderia ser mais
popular do que o senhor Imperador Regente.
O problema não é apenas
sabermos quem ganha e quem perde. O problema é deixarmos de ter um dono,
mesmo que ele use apenas feitores na gestão da fazenda. E passarmos a
ter uma oposição capaz de ultrapassar o reviralho. Com efeito, o nosso
sistema político é uma caixa negra que tem duas entradas de sufrágio
universal: a eleição do Parlamento e a eleição do Presidente.
Acresce
que a república portuguesa se encaixa na matrioska da União
Europeia e os principais partidos do nosso rotativismo fazem parte das
duas principais multinacionais partidárias de uma integração de que
dependemos.
Depois de governos de esquerda com temperamento de direita,
seguem-se governos de direita com hipocrisia de esquerda, para que meio
mundo fique ao serviço do outro, com os que andam de pé atrás a
continuarem dependentes dos que se puseram no bico do pé.
Os
governamentais ganharam, o PS não saiu do limbo e o PCP foi derrotado, à
esquerda, pelo Bloco. Continua a haver falta de centro excêntrico que
rime com a comunidade popular.
IN "PÚBLICO"
04/10/15
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