Movimentos migratórios são
positivos se forem bem geridos
Falta olhar para além da dimensão humanitária e das respostas de curto prazo. Falta reconhecer que a mobilidade humana nas suas várias formas e causas sempre existiu e continuará a existir.
Assistimos nestes dias a manifestações que juntam espontaneamente
dezenas de milhares de pessoas na Europa em apoio ao acolhimento de
refugiados, numa demonstração que é ao mesmo tempo de solidariedade para
com estas pessoas e de frustação pela incapacidade dos seus Governos
darem uma resposta à altura das circunstâncias.
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A crise migratória no Mediterrâneo não é uma situação isolada.
Acresce que o número de migrantes atingiu máximos históricos – uma em
cada sete pessoas no mundo é um migrante hoje em dia. 60 milhões de
pessoas estão a ser deslocadas e procuram refugio em várias partes do
mundo devido a múltiplas crises humanitárias, a instabilidade política e
situações de perseguição. Estes factores obrigam-nas a sairem das suas
casas em busca de segurança e melhores condições de vida, gerando forte
pressão migratória sobre os países de trânsito e de acolhimento. O
desespero e a falta de canais legais alimentam a migração irregular,
agravando os riscos ao longo das rotas migratórias e favorecendo o
mercado dos traficantes.
Também confrontada com esta realidade, a União Europeia não tem
conseguido encontrar um consenso político para receber e gerir os fluxos
de pessoas que chegam às suas portas. Estas são consideradas como um
peso ou até como uma ameaça. Há muito tempo que se assiste a uma
instrumentalização política do tema das migrações. Ao mesmo tempo
opta-se por soluções securitárias e de contenção que dificilmente serão
eficazes e sustentáveis.
A Europa enfrenta também outra realidade com a qual tem que lidar.
Está a envelhecer, e a população em idade activa está destinada a perder
7.5 milhões pessoas até 2020, de acordo com os dados da OCDE, com um
consequente desencontro entre necessidades laborais e competências e
qualificações disponíveis. Estas projeções pioram se excluirmos os
migrantes deste cenário.
Então o que está a faltar ou a falhar neste momento? Falta olhar para
além da dimensão humanitária e das respostas de curto prazo. Falta
reconhecer que a mobilidade humana nas suas várias formas e causas
sempre existiu e continuará a existir. Falta uma visão objectiva e uma
reflexão honesta sobre as nossas necessidades e o contributo que as
migrações, se bem geridas, podem dar às sociedades e às economias dos
países de acolhimento.
Apesar dos imigrantes não poderem por si só resolver os problemas
demográficos e as assimetrias do mercado de trabalho, deverão fazer
parte da solução. Em determinados países da Europa, inteiros sectores da
económica como a saúde, as tecnologias, o trabalho doméstico, dependem
de mão de obra estrangeira mais ou menos qualificada para o seu
funcionamento. Quem procura os nossos países pode dar um contributo
importante para a economia e o sistema de protecção social. Mas isso não
acontecerá se não houver políticas transparentes e realistas que
conduzam à criação de canais legais e seguros de migração, ao respeito
dos direitos humanos básicos dos migrantes, num espírito de
responsabilidade partilhada entre países de origem, trânsito e destino.
Na nova Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, adoptada
pelas Nações Unidas no fim deste setembro, as migrações finalmente
ocupam o lugar que merecem enquanto fator incontornável para um
desenvolvimento global inclusivo. Fica só reconhecer que as migrações
são relevantes para a prosperidade e o crescimento de todos os países,
tanto do Sul como do Norte do mundo.
Chefe de missão em Portugal da OIM
– Organização Internacional das Migrações
IN "OBSERVADOR"
25/09/15
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