HOJE NO
"i"
"i"
A rede.
Dos “Pingas” à maçonaria,
todas as ligações do esquema
A procuradora Inês Bonina escreve algo deste género no início do despacho: o processo que envolve João Correia é impróprio para mentes simples.
O Ministério Público acredita que, para retirar dividendos públicos
em proveito próprio e dos seus cúmplices, João Correia montou um
esquema “excepcionalmente complexo” a partir da Direcção-Geral de
Infra-estruturas e equipamentos.
.
ARGUIDO-MOR |
Ele, o principal arguido, terá recorrido a uma rede de contactos que
estabeleceu ao longo dos anos: da maçonaria à universidade, passando
pela sua terra natal, Ordem dos Arquitectos e, last but not least, o
grupo de convívio “Os Pingas”. Como e onde se cruzam os 12 suspeitos?
João Alberto Correia
83 crimes
Num policial, caber-lhe -ia o papel de “cabecilha” do grupo. João
Correia chegou à direcção da DGIE pela mão de Rui Pereira – e não de
Miguel Macedo, como o i chegou a escrever. Foi depois reconduzido pelo
social--democrata, no final de 2012. O MP acredita que, desde a primeira
hora, fez uso de “amizades” e conhecimentos para pôr em marcha um
esquema de “troca de favores” e partilha indevida de verbas públicas.
Albino Rodrigues
37 crimes
A par de Luísa de Sá Gomes, Albino Rodrigues seria também um
braço-direito de João Correia dentro da DGIE. Além dos almoços e
jantares nos convívios organizados pelos membros do “Pingas” e
partilhados com o amigo arquitecto (faziam ambos parte do grupo), o
técnico superior e o ex- -director-geral da DGIE tinham um tipo de
ligação mais profunda: eram ambos maçons, “estando ligados por essa
qualidade e pelos deveres de obediência e lealdade que essa organização
professa”, sublinha a procuradora. Na verdade, em Maio de 2012, por
despacho de João Correia, Albino Rodrigues, actualmente com 58 anos, foi
nomeado para chefiar a divisão de obras da DGIE por alegada “urgente
conveniência de serviço”.
Luísa de Sá Gomes
4 crimes
Esta funcionária pública de 50 anos, mestre em Direito, foi chamada à
DGIE pelo próprio João Correia. A procuradora não é clara nem quanto à
forma como os dois se conheceram nem quanto ao momento, apesar de ambos
terem anos de trabalho nos gabinetes do Ministério da Administração
Interna – entre 2008 e 2011, Luísa de Sá Gomes foi directora de serviços
na Unidade Ministerial de Compras da Secretaria- -Geral do Ministério
das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. Já no final do processo,
refere o despacho de acusação, a responsável jurídica na direcção-geral
terá tentado apagar o rasto das múltiplas irregularidades cometidas nos
processos de adjudicação de contratos da DGIE. Também terá continuado a
cumprir as orientações de João Correia, mesmo depois de este ter
cessado as funções de director-geral naquele organismo público.
Henrique Oliveira
37 crimes
É o mais novo dos 12 arguidos (tem 35 anos). Empresário de profissão,
membro do “Pingas”, no currículo acumula outro pormenor: maçon, e, por
essa via, “irmão” de João Correia. O nome de Henrique Oliveira surge nos
corpos sociais de várias empresas directa e indirectamente envolvidas
nos contratos de reestruturação dos antigos governos civis, adjudicados
pela DGIE. A saber: é sócio-gerente da Primenext, director- -geral da
Interclima, sócio-gerente da Think Attitude, sócio da PH Set Lda.,
gerente de facto da A. Magarinhos. Várias das empresas que venceram os
contratos da DGIE acabaram por subcontratar a Primenext para realizar as
obras projectadas.
José Leal
3 crimes
Os caminhos de José Leal e João Correia cruzaram-se em 2011. Dois anos
antes, o empresário da Lousada conhecera Rui Correia, irmão do principal
arguido no processo. Rui pôs os dois em contacto e, no mesmo ano em que
foram apresentados, José Leal “efectuou uns trabalhos” para João
Alberto Correia que, à data, era responsável da Escola Superior
Gallaecia. O seu nome está “directamente ligado a duas empresas
favorecidas” no processo: é sócio- -gerente da José Leal – Sociedade de
Construções, Lda. (fundada em 1998) e da empresa Inexec – Sociedade de
Construções, Lda. (criada cerca de dois anos depois). Em causa estão
seis concursos atribuídos a estas duas empresas.
José Machado
3 crimes
Não sendo a mais longa amizade que João Correia tem no grupo, já soma
alguns anos. A relação do ex-director--geral da DGIE com José Machado
remonta, pelo menos, ao ano de 2005. Como os dois se conheceram, não é
claro. Mas a procuradora aponta para dados relevantes: o empresário
terá, por diversas vezes, realizado “trabalhos de construção civil” para
a DGIE sem que algum contrato tivesse sido assinado ou que houvesse
sequer concurso para o efeito. José Machado era vice- -presidente da
Joaquim Sá Machado & Filhos, S.A. Entre eles terão combinado
inflacionar valores de obras e acertado resultados de concursos que se
queriam públicos.
Ricardo Nobre
5 crimes
Ricardo Nobre é mais um dos amigos do “Pingas”, tendo, nesse âmbito,
partilhado momentos de convívio com João Correia. Além disso, o
empresário leiriense, de 37 anos, é sócio-gerente da Mudastone, Lda.
desde a fundação, em 2007. A Mudastone terá entrado no esquema de duas
formas: primeiro, “vencendo” directamente dois concursos lançados pela
DGIE; segundo, sendo subcontratada pelas empresas ERGSilva, Lda. e Blue
Bee, Lda. para a tal reestruturação de antigos governos civis – o
modelo-base de todo o esquema.
Bruno Cerqueira
2 crimes
João Alberto Correia deu aulas na Faculdade de Arquitectura e Artes da
Universidade Lusíada. Foi aí, no meio académico, que o arquitecto
estabeleceu os primeiros contactos com Bruno Cerqueira. Um era
professor, o outro foi aluno. Esse momento aconteceu nos primeiros anos
da década de 1990, mas a amizade que nasceu ainda no milénio passado
estendeu-se até aos dias de hoje – além da amizade, os dois partilham,
de resto, a mesma profissão: arquitecto. Foi o ex- -aluno quem, a
determinado momento, se deslocou aos locais das futuras obras para
determinar o que seria feito e a que preço – quando era. Essa função,
até à chegada de João Correia à DGIE, caberia aos técnicos daquela
direcção-geral.
Luís Fróis
5 crimes
Luís Fróis: director de operações, 40 anos. Era gerente da Tetmei mas,
para adensar a trama, colaborava também com a Nextinforman e com a
Informantem – empresas que se enredariam num jogo de contratação e
subcontratação alegadamente orquestrado com antecedência entre Fróis,
Henrique Oliveira e Henrique Muacho. Estes dois últimos reunir-se- -iam
nos almoços do “Pingas”, mas a procuradora deixa Fróis de fora desse
grupo. Onde seriam delineadas as movimentações, fica em aberto, tal como
a origem clara da ligação a João Correia.
Henrique Muacho
7 crimes
O gestor de empresas completa 44 anos nos próximos dias. É mais um entre
os cerca de dez membros do “Pingas” identificados pela procuradora Inês
Bonina. E, tal como outros camaradas de convívios, Muacho tem o seu
nome vinculado a duas empresas que terão beneficiado do esquema
alegadamente montado por João Alberto Correia. Neste caso, Henrique
Muacho é presidente do conselho de administração da Nextinforman
Infraestruturas, SA, e gerente da S.T.M.I. – Sociedade Técnica de
Manutenção Informática, Lda. Esta última detinha ainda participação
maioritária numa terceira empresa, a Tetmei (ligada a outros arguidos).
Carlos Farófia
9 crimes
Carlos Farófia tem menos cinco anos que João Correia, mas isso não
impede que estejam unidos por uma amizade de décadas. Os dois cresceram
juntos em Reguengos de Monsaraz, conheceram-se ainda jovens e trazem
desses tempos uma ligação que não se perdeu até aos dias de hoje. À
imagem de vários outros arguidos, Farófia está “directamente ligado a
duas empresas favorecidas” pelo ex- -director da DGIE: é sócio e gerente
da Lostipak – Construção, Carpintaria e Manutenções Técnicas (assumiu a
gerência em Setembro de 2011) e sócio-gerente da Divicode Lda. desde a
constituição da empresa, em 2013. Foram ambas subcontratadas por outras
duas (a Taer, Lda., e a Manuel Joaquim Malheiro, Lda.) em concursos da
DGIE.
Manuel Saldanha
1 crime
Foi a Ordem dos Arquitectos que juntou estes dois profissionais.
Conheceram-se há cerca de 12 anos e, em 2009, partilharam experiências
mais próximas ao integrarem uma lista de candidatura aos órgãos da Ordem
– que saiu vitoriosa da eleição. Saldanha foi eleito presidente do
Conselho Nacional de Disciplina, enquanto Correia foi eleito vogal do
Conselho Fiscal. João Correia terá adjudicado “projectos de arquitectura
a empresas e ateliês indicados por projectistas e arquitectos do seu
círculo de conhecimentos e com quem mantinha relações de amizade”.
Saldanha – sócio-gerente de uma empresa da área, seria um deles. Os
contornos dos serviços terão sido previamente acertados antes do
concurso público.
* Gente tão fina, tão fina, tão fina que até espeta, no bolso dos outros. Conserve estes nomes, faz bem à memória.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário