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Tele-rastreio diminuiu lista de espera
de dois anos para apenas um dia
Quando o programa de tele-rastreio dermatológico arrancou no Nordeste
transmontano, no início deste ano, a lista de espera para consultas
hospitalares da especialidade era de quase dois anos. Hoje a espera é de
um dia, afirma Luís Gonçalves, coordenador do Grupo de Trabalho de
Telemedicina, que explica que estão a estender o sistema a todo o país e
que há mais especialidades na calha. O objectivo é que possa haver uma
redução de 70% nas listas de espera de algumas consultas, como a
dermatologia, em que a ferramenta pode ser usada. O vice-presidente da
Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia, Jorge Cardoso,
considera que a medida poupa recursos, mas que nada em medicina é isento
de riscos.
Desde Janeiro
deste ano arrancou em Portugal o chamado “tele-rastreio dermatológico”,
ou seja, utentes que vão aos centros de saúde com lesões na pele são
vistos pelos médicos de família, que avaliam se o doente precisa de ser
visto por um dermatologista e se o pode fazer à distância. É no centro
de saúde que as lesões na pele são fotografadas, de acordo com regras
definidas numa norma da Direcção-Geral da Saúde, e depois enviadas para
dermatologistas dos grandes hospitais que decidem se a pessoa precisa de
ser vista numa teleconsulta (através de videoconferência) ou de forma
presencial no hospital. O que havia até agora em telemedicina no país
centrava-se sobretudo num sistema de teleconsultas de várias
especialidades no Alentejo e numa consulta de telemedicina de
cardiologia pediátrica do Hospital Pediático de Coimbra para países
africanos de língua portuguesa. De resto, “houve algumas experiências
pontuais que não se consolidaram”, resume.
Avançar com o
tele-rastreio no Nordeste transmontano teve a ver com o facto de não
haver na região nenhum dermatologista residente, diz. As pessoas de
Bragança tinham que se deslocar ao Hospital de Vila Real, explica o
responsável. “Os que tinham recursos iam a uma consulta privada ou
tinham de esperar.” A lista de espera andava nos 600 dias, refere.
Avançou-se com o tele-rastreio em 14 centros de saúde da região de
Bragança. Esperavam que em cerca de metade dos casos se concluísse que
não havia justificação clínica para os pacientes serem vistos por um
médico num hospital central, mas o número foi superior, explica Luís
Gonçalves, responsável pelo programa, que funciona na alçada dos
Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, uma empresa pública a que
cabe gerir várias valências tecnológicas do Serviço Nacional de Saúde.
No Nordeste transmontano 90% dos casos ficaram resolvidos, só 10% foram
encaminhados para cirurgia no hospital da região, em situações mais
simples, ou, quando havia suspeita de cancro, para o Hospital de S.
João, no Porto. “Resolveu-se o caso de 400 pessoas.”
O sucesso do
programa na região levou ao seu alargamento progressivo — o Hospital de
Gaia já o faz, assim como o de Viana de Castelo, o Centro Hospitalar e
Universitário de Coimbra, o Hospital de Setúbal está a analisar casos do
litoral alentejano. O programa está prestes a começar na região centro,
com Viseu, Guarda, Covilhã, depois serão Leiria e Castelo Branco. O
arranque está a fazer-se com três a quatro centros de saúde por
hospital, nota o responsável. Nesse sentido as administrações regionais
de Saúde estão a distribuir máquinas fotográficas em centros de saúde de
todo o país, “algo barato e útil”.
O que havia antes era o pedido
de consulta com o envio de dados clínicos, agora acrescem as imagens e a
informação circula de forma segura através do sistema informático do
programa Consulta a Tempo e Horas, explica. O médico faz a triagem
clínica com base nas fotografias. Os doentes têm de aceitar o
procedimento através de um consentimento informado e até agora não tem
conhecimento de recusas de doentes, adianta. “Só 20% dos pedidos de
consulta de dermatologia justificam uma ida a um hospital central.”
O objectivo é agora avançar com o mesmo sistema para a especialidade de angiologia cirurgia
vascular, isto, porque se verifica que 80% das pessoas que vão a
consultas desta especialidade em hospitais centrais fazem-no devido a
varizes. “Se forem mandadas fotos, as lesões podem ser observadas para
compreender o seu estádio. Antes de uma cirurgia há indicações que podem
prolongar o bem-estar sem cirurgia”, diz. Na oftalmologia quer-se
avançar com o tele-rastreio da retinopatia diabética, uma complicação
ocular que surge nos diabéticos e pode causar cegueira, através da
realização de retinografias nos centros de saúde e que depois serão
enviados por via informática para os médicos em hospitais.
Luís
Gonçalves diz que é verdade que, por enquanto, ainda só têm os números
de Bragança, mas que “os doentes poupam pelo facto de não terem que se
deslocar”. “Se a informação circula porque é que as pessoas hão-de
circular?” E garante que “não existe perda de qualidade”.
O
vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venerologia
diz que o tele-rastreio dermatológico “é uma boa medida que poupa
recursos”, em que é o dermatologista a decidir as situações “em que não
dispensa uma consulta presencial”. Admite, porém, que “na medicina não
há nada que não tenha riscos, os médicos também se enganam mesmo com o
doente à frente”; por isso, “o médico que tem dúvidas manda vir o
doente”.
O bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, diz
que “a telemedicina pode ser muito útil na boa organização e gestão do
Sistema Nacional de Saúde”, desde que sejam cumpridas algumas regras que
estão definidas no quadro deontológico dos médicos. “No caso das
teleconsultas têm de ser solicitadas pelo médico de família do doente,
que é a quem cabe a decisão última.” No caso da dermatologia, “a maioria
dos sinais são benignos e um diagnóstico destes pode ser feito por quem
tem grande experiência”. “É uma situação em que a telemedicina faz
sentido”, tal como no caso do rastreio da retinopatia diabética, “em que
se tira uma foto ao fundo do olho para que seja lida por um
oftalmologista”.
* Mais uma ferramenta para beneficiar a população doente e também, em alguns casos, como rastreio na medicina preventiva.
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