26/09/2013

HELENA CRISTINA COELHO

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Flexíveis, 
mas pouco

O país anda suspenso por causa de 0,5%. É mais ou menos esta a distância que separa a meta do défice orçamental de 4% exigida pela inflexível ‘troika' da meta de 4,5% que o Governo português está a pedir para o próximo ano.

Parece coisa pequena, mas não é assim tanto: vale 800 milhões de euros e dela podem depender decisões tão relevantes como mais ou menos impostos, mais ou menos desemprego, mais ou menos cortes na despesa, mais ou menos austeridade, mais ou menos desesperança. Não é por isso de estranhar que a flexibilização do défice, mesmo que por míseros 0,5%, seja um novo credo na boca dos portugueses, uma aspiração maior numa economia que ainda vive em ajustamento forçado.

Há dois lados relevantes nesta moeda da ‘troika': um tem a ver com execução, outro com expectativa. O primeiro significa que a folga no défice, ainda que mínima, dá margem ao Governo para flexibilizar as suas próprias políticas: pode reduzir o ritmo e agressividade nos cortes da despesa, minimizar os níveis de desemprego, pode até dar espaço para baixar ligeiramente a carga fiscal e aliviar a pressão sobre famílias e empresas. E, claro, rouba-lhe argumentos para insistir na austeridade. O outro lado da questão tem mais a ver com estímulos: dar mais um furo no cinto da austeridade é dar um sinal de confiança aos portugueses, é dar um incentivo para consumir e investir (um pouco) mais, é criar uma expectativa mais optimista depois dos últimos anos de trabalhos forçados.

Ninguém espere, contudo, que a flexibilização seja o fim de todos os males. Embora possa refrear uma queda na economia, não garante uma inversão automática nem um crescimento económico instantâneo. Mesmo que possa aliviar a pressão das políticas de austeridade, não pode anulá-las sob pena de comprometer toda a reforma do Estado que é vital para o regresso do país aos mercados e a uma vida sem a dependência da ‘troika'. E, mesmo que possa aliviar as medidas restritivas necessárias ao ajustamento orçamental, o certo é que quanto mais défice o país estiver disposto a suportar, mais dívida terá de acumular - para pagar mais tarde. E esse, é importante não esquecer, já é o problema que o país tem nas mãos - e que os portugueses já estão a pagar.

Por tudo isso, é preciso cuidado com aquilo que se pede. Flexibilizar seria bom, porque enquanto o pau (vulgo austeridade) vai e vem, folgam as costas (que é como quem diz, o povo). Mas convém não folgar em demasia: flexibilizar não é relaxar. Quanto maior a flexibilização, maior o preço que se terá de pagar mais tarde - o que significa que, antes de pedir mais tempo ou mais espaço de manobra, é preciso garantir que se consegue suportar a dívida que aí se vai acomodar. E também convém fazer bem as contas quando se pede ainda mais que 0,5%, como o líder do PS, que gostaria de levar a flexibilização da meta do défice até 5% - vamos conseguir sustentar mais 1%?

Seja qual for a decisão, sejam quais forem as contas, uma coisa é certa: Portugal merece a flexibilização que anda a pedir. É como disse esta semana o economista e catedrático alemão Friedrich Schneider: "Portugal tem cumprido o programa de ajustamento, tem procurado reduzir as despesas, aumentou os impostos, a população tem suportado grandes sacrifícios." Melhor performance que a portuguesa, só a da Irlanda. Por tudo isso, vale a excepção à regra. A flexibilização, mesmo que seja apenas de 0,5%, é mais do que um brinde da ‘troika' ao país. É uma prova de que, afinal, os portugueses não estão a mudar a sua vida em vão.

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
20/09/13

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