18/06/2013

CARLA HILÁRIO QUEVEDO

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A paz do fingimento

O primeiro-ministro David Cameron está a ser alvo de acusações de indiferença por ter ido passar férias a Ibiza com a mulher logo depois do brutal homicídio no bairro de Woolwich de um soldado britânico por radicais islâmicos.
O caso, que o Governo tratou como um acto de terrorismo, chocou o país e qualquer pessoa que tenha visto as imagens terríveis do assassino com as mãos ensanguentadas, a falar para uma câmara como se o acto que acabara de cometer fosse plenamente justificado. Perante a barbárie, David Cameron decidiu pegar na família e ir para a praia. Como se esperava, a decisão foi usada politicamente contra ele. Apesar de todas as explicações sobre como está perto de Inglaterra e como é fácil comunicar hoje em dia, ninguém entende a ausência neste momento assustador. Fico surpreendida com o erro de Cameron. Qualquer político profissional sabe que é pago para fingir preocupação. Sem esse fingimento não há paz.

Estupidez narcísica
Li um artigo na Slate sobre um tema que ainda hoje intriga muita gente: o bigode de Hitler. Não é um texto exaustivo, mas ficamos a saber que, no início do século passado, aquele bigodinho que nos parece ridículo era considerado elegante e aristocrático. Era conhecido por ‘escova de dentes’, embora o da sinistra criatura nazi fosse uma versão mais abreviada dos lados do que o original celebrizado pelo Kaiser Guilherme II. Um amigo de Hitler, Ernst ‘Putzi’ Hanfstaengl, aconselhou-o a tirar o bigode porque estava fora de moda, ao que este terá respondido que voltaria a ser moda porque era usado por ele. O mais curioso é que o bigodinho estava associado não só à personagem de Charlie Chaplin, como era também usado por Oliver Hardy, que conhecemos por Bucha (do Estica). É preciso ter um ego do tamanho do mundo para imaginar que o seu bigodito apagaria da história os bigodes das duas personagens mais geniais e divertidas da época.

Infantil e excelente
Reconheço que há qualquer coisa de infantil nesta versão do Grande Gatsby, realizado por Baz Luhrmann (Moulin Rouge, Romeu e Julieta e aquela chatice da Austrália). O luxo, as festas, o guarda-roupa e o romantismo de Jay Gatsby, o fascínio do vizinho Nick Carraway, a menina rica Daisy e até a luxúria do seu marido Tom, tudo parece o mundo dos adultos visto por olhos de adolescentes. O próprio 3D, que se impõe de uma maneira espectacular durante o filme, parece um brinquedo de crianças. Mas o filme também pode ser encantador para os adultos em geral, como foi para mim. Gatsby está feito com ternura, ironia e inocência dramática. Mas o filme não é perfeito. Tive de me abstrair de Carey Mulligan, uma das actrizes menos interessantes que surgiram na última década. Mas, mesmo com ela, e apesar dela, vale a pena ver esta versão opulenta do Grande Gatsby com um Leonardo DiCaprio no seu melhor, sem aquela intensidade cansativa a que nos habituou.

Onde menos se espera
Membros em topless do grupo feminista ucraniano FEMEN invadiram a final do programa Germany’s Next Top Model apresentado por Heidi Klum. No corpo tinham escrito a tinta ‘Heidi Horror Picture Show’ e acusavam a organização de se servir da indústria da moda para promover a prostituição. No seu extremismo, as FEMEN tocaram num aspecto importante para o feminismo mais conservador, que rejeita a objectificação da mulher, que é contra a prostituição e a pornografia. O ponto é simples: a exploração sexual não é aceitável. Não tenho nada contra esta visão do mundo, pelo contrário, embora não tenha antipatia por Heidi Klum. Mas, para as FEMEN, que aparecem despidas para chamar a atenção, a decisão individual tem limites. Não cabe a nenhuma mulher decidir pôr o seu corpo à venda. Ninguém tem o direito de ser explorado, vendido e maltratado. Tenho simpatia pelas FEMEN, porque vejo coragem onde outros vêem exibicionismo.

Não posso acreditar
Na quinta-feira, 30 de Maio, houve uma greve do Metro. Sempre que a actividade dos serviços é suspensa, quem sente de imediato os efeitos dos protestos são os clientes da rede de transportes, além dos outros que não têm motorista. Durante aquela manhã houve nas redes sociais vários relatos de pessoas cujos carros tinham sido rebocados. Não tardou que corresse o boato de que era tudo um plano concertado da EMEL. Com a greve, o afluxo de carros em Lisboa tinha aumentado e era visível o rodopio de rebocadores para trás e para a frente na cidade. Mesmo assim, não quis acreditar na interpretação conspirativa que circulava. Não quero imaginar que uma greve de transportes públicos se possa tornar uma oportunidade de lucro. Claro que se alguém me mostrasse os valores arrecadados naquele dia pela EMEL, mudaria de opinião. E se aconteceu o que dizem, a minha ira fará cair raios e pragas de gafanhotos sobre essa empresa impiedosa.

IN "SOL"
11/06/13

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