HOJE NO
"i"
Juízes dizem: Menezes e Seara
não se podem recandidatar
Rui Rangel e Eurico Reis defendem que lei de limitação de mandatos é clara e impede candidaturas dos autarcas com mais de três mandatos
Os juízes Rui Rangel e Eurico Reis defendem que os presidentes de
câmara que já cumpriram três mandatos não podem candidatar-se a outra
autarquia. Candidaturas como a de Fernando Seara, em Lisboa, Luís Filipe
Menezes, no Porto, ou Fernando Costa, em Loures, podem ser travadas
pelos tribunais no entender destes magistrados.
A interpretação que Eurico Reis faz da lei leva-o a defender que “a
solução mais acertada é aquela que diz que são três mandatos e ponto”.
Para o juiz-desembargador do tribunal da Relação de Lisboa, se “o
legislador não distinguir as situações o intérprete não pode fazê-lo”.
Também o juiz Rui Rangel afirma que “a lei é clara”. “O legislador
pretende que haja uma incapacidade absoluta de alguém migrar para outra
câmara”, assegura.
Se os partidos insistirem em apresentar candidatos que violem este
princípio, Rui Rangel, presidente da Associação de Juízes pela
Cidadania, acredita que haverá nomes “sufragados pelos partidos para ir a
votos e uma decisão [dos tribunais] a dizer que [determinado candidato]
não pode ir”, porque “o legislador quis que as pessoas não se
perpetuassem no cargo”. A questão pode ter sérias implicações em
Outubro, quando os eleitores forem às urnas para escolher os seus
representantes locais.
Em causa está a lei da limitação de mandatos, publicada em Agosto de
2005, que prevê que “o presidente de câmara municipal e o presidente de
junta de freguesia só podem ser eleitos para três mandatos
consecutivos”. A lei não esclarece se essa limitação se aplica aos
autarcas que se candidatam a outra câmara e, para desfazer esse
equívoco, o PSD pretendia avançar com uma proposta para clarificar o
diploma, mas não chegou a fazê-lo. Nem entre os sociais-democratas– o
partido que mais candidatos tem nesta situação – a questão é consensual.
Paulo Rangel, um dos autores do diploma, já tinha defendido que a
violação à lei levaria a perdas de mandato. “Acho que isso é um risco
que pode acontecer e não só eu”, disse o eurodeputado do PSD.
Em sentido contrário, Pedro Santana Lopes, que também contribuiu na
preparação do texto, disse ontem ter “a certeza absoluta” de que “a lei
foi feita para proibir mais do que três mandatos na câmara em questão”,
deixando a porta aberta a candidaturas em outras autarquias.
Posições políticas à parte, Rui Rangel lamenta que sejam “os tribunais a
resolver um problema de bom-senso, quando deviam ser os partidos a
resolver” a questão. “Não venham depois dizer” – como aconteceu com os
pedidos de fiscalização sucessiva da constitucionalidade do Orçamento do
Estado – “que é a Justiça a politizar” o assunto, sublinha o juiz.
jurisprudência
A
lei autárquica define que serão os juízes que recebem as listas a
aceitar ou não as candidaturas e, em caso de dúvidas, o assunto poderá
ir parar ao Tribunal Constitucional.
Eurico Reis acredita que a decisão do Supremo Tribunal Administrativo
(STA) sobre o processo que envolve Macário Correia criou uma espécie de
jurisprudência. Ao decidir que o autarca de Faro perdia o mandato por
ilegalidades cometidas quando era ainda presidente da câmara de Tavira, o
STA definiu que “a territorialidade é irrelevante”, e “os tribunais
comuns não podem ignorar a interpretação” feita por uma instância
superior, entende Eurico Reis.
A grande questão agora prende-se com a interpretação do espírito de uma
lei cuja letra final “tem uma redacção equívoca”, como admite o próprio
Santana Lopes. A Comissão Nacional de Eleições já publicou mesmo uma
deliberação em que defende que a limitação “é restrita ao exercício
consecutivo de mandato como presidente de órgão executivo da mesma
autarquia”.
O PSD apoia-se no parecer da CNE para justificar o facto de ter
desistido de fazer uma clarificação à actual legislação. Eurico Reis
sublinha, porém, que a posição da CNE “não tem poder vinculativo” e que
“o princípio republicano de que as pessoas não podem eternizar-se nos
cargos tem de prevalecer, porque a carne é fraca e o poder corrompe”.
* Dois juízes a lutar contra o caciquismo instalado, muito bom.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário