A conquista da intolerância
A Europa tal como aprendemos a conhecer
está a desaparecer. Lentamente, é certo, como quase todas as
transformações da história. A definhar ou fechando o círculo. Na
Alemanha, a extrema-direita assumiu o seu verdadeiro rosto. Um rosto
negacionista, não sente culpa pelo Holocausto: e colheu os frutos. Chega
ao Parlamento, como terceira força política, e trará sérias
dificuldades a Merkel. Primeiro, para a chanceler formar governo;
depois, na futura governação, Angela Merkel precisará dos equilíbrios
necessários para suster a onda populista.
Eles,
os votantes nos radicais que rejeitam a solidariedade alemã, não
esqueceram a vergonha. Pelo contrário, mostram--se orgulhosos de um
passado tenebroso. Foi aliás com esses argumentos que cresceram:
primeiro contra o apoio da Alemanha, no seio da União Europeia, aos
países do Sul mergulhados em tremenda crise financeira (como Portugal e a
Grécia); depois, contra os refugiados, que procuraram em massa, é
certo, o país em fuga do inferno da guerra. Se Merkel decidiu, e ainda
bem, abrir as portas a quem nada tinha, nem casa nem terra, não pensemos
que o fez com propósitos exclusivamente altruístas. A Alemanha, tal
como o resto da Europa, está envelhecida - precisa de gente e de mão de
obra, de preferência barata.
A política
de portas abertas de Angela Merkel parece ter feito aumentar a
popularidade dos radicais. Já tínhamos visto isto acontecer. Demasiadas
vezes. Na tolerante Holanda, na fraterna França, em países, para muitos,
sinónimo da democracia. Também nos Estados Unidos da América o
populismo ocupa a Casa Branca, com consequências imprevisíveis.
A 25 deste mês, a Coreia do do Norte declarou
ter o direito de retaliar, depois das declarações de Donald Trump, nas
Nações Unidas. É verdade, o que o presidente dos Estados Unidos fez há
dias na sede da Sociedade das Nações, criada para manter a paz, é
intolerável. Ou devia sê-lo. "Os Estados Unidos têm grande força e
paciência, mas, se forem forçados a defenderem-se ou aos seus aliados,
não teremos outra escolha senão destruir totalmente a Coreia do Norte".
Os mais otimistas poderão classificar essas palavras como mais uma das
suas tiradas de mau gosto; outros classificam Trump e Kim Jong-un como
loucos e sossegam com isso.
E não
existem, de facto, motivos para ficarmos indiferentes perante o discurso
da destruição total. Trump dá sinais mais do que alarmantes, depois de
si nada ficará como antes. O Ártico, um dos últimos redutos da vida
selvagem do planeta, é a sua mais recente vítima. O petróleo fala mais
alto.
* EDITORA-EXECUTIVA-ADJUNTA
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
26/09/17
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