29/09/2017

PAULA FERREIRA

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A conquista da intolerância

A Europa tal como aprendemos a conhecer está a desaparecer. Lentamente, é certo, como quase todas as transformações da história. A definhar ou fechando o círculo. Na Alemanha, a extrema-direita assumiu o seu verdadeiro rosto. Um rosto negacionista, não sente culpa pelo Holocausto: e colheu os frutos. Chega ao Parlamento, como terceira força política, e trará sérias dificuldades a Merkel. Primeiro, para a chanceler formar governo; depois, na futura governação, Angela Merkel precisará dos equilíbrios necessários para suster a onda populista.

Eles, os votantes nos radicais que rejeitam a solidariedade alemã, não esqueceram a vergonha. Pelo contrário, mostram--se orgulhosos de um passado tenebroso. Foi aliás com esses argumentos que cresceram: primeiro contra o apoio da Alemanha, no seio da União Europeia, aos países do Sul mergulhados em tremenda crise financeira (como Portugal e a Grécia); depois, contra os refugiados, que procuraram em massa, é certo, o país em fuga do inferno da guerra. Se Merkel decidiu, e ainda bem, abrir as portas a quem nada tinha, nem casa nem terra, não pensemos que o fez com propósitos exclusivamente altruístas. A Alemanha, tal como o resto da Europa, está envelhecida - precisa de gente e de mão de obra, de preferência barata.

A política de portas abertas de Angela Merkel parece ter feito aumentar a popularidade dos radicais. Já tínhamos visto isto acontecer. Demasiadas vezes. Na tolerante Holanda, na fraterna França, em países, para muitos, sinónimo da democracia. Também nos Estados Unidos da América o populismo ocupa a Casa Branca, com consequências imprevisíveis.

A 25 deste mês, a Coreia do do Norte declarou ter o direito de retaliar, depois das declarações de Donald Trump, nas Nações Unidas. É verdade, o que o presidente dos Estados Unidos fez há dias na sede da Sociedade das Nações, criada para manter a paz, é intolerável. Ou devia sê-lo. "Os Estados Unidos têm grande força e paciência, mas, se forem forçados a defenderem-se ou aos seus aliados, não teremos outra escolha senão destruir totalmente a Coreia do Norte". Os mais otimistas poderão classificar essas palavras como mais uma das suas tiradas de mau gosto; outros classificam Trump e Kim Jong-un como loucos e sossegam com isso.

E não existem, de facto, motivos para ficarmos indiferentes perante o discurso da destruição total. Trump dá sinais mais do que alarmantes, depois de si nada ficará como antes. O Ártico, um dos últimos redutos da vida selvagem do planeta, é a sua mais recente vítima. O petróleo fala mais alto.

* EDITORA-EXECUTIVA-ADJUNTA

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
26/09/17

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