Os acionistas têm
os gestores que merecem
Enquanto existir quem se deixe enganar, haverá sempre quem procure tirar proveito disso. É uma lei da vida. A CMVM não faz milagres e os acionistas das empresas deveriam ser os primeiros interessados em correr com gestores incompetentes ou corruptos.
O ex-presidente da CMVM, Carlos Tavares, defendeu ontem (20/06) que o supervisor do mercado de capitais deveria
ter o poder de avaliar a idoneidade dos administradores das cotadas
não-financeiras, à semelhança do que o Banco de Portugal faz com os
gestores da banca. Carlos Tavares disse ainda, com muita razão, que de
nada serve ter administradores e membros de comissões de auditoria que
não sabem o que fazem nem querem saber. E questionou o facto de os
acionistas das empresas portuguesas não exigirem as devidas
responsabilidades aos membros dos órgãos de fiscalização das empresas,
mesmo quando os gestores destroem valor de forma catastrófica, como se
viu em várias grandes cotadas nacionais ao longo dos últimos anos.
O antigo presidente da CMVM está absolutamente certo no
diagnóstico: os interesses dos acionistas e dos gestores nem sempre
estão alinhados. E os administradores independentes e os membros dos
órgãos de fiscalização nem sempre estarão à altura do que deles se
espera. Apesar dos avanços registados nos últimos anos, este continua a
ser um problema grave que põe em causa a solidez das empresas
portuguesas, a confiança dos investidores no mercado de capitais
nacional e, por arrasto, a capacidade de financiamento da nossa
economia.
Para ajudar a remediar este problema, Carlos Tavares propõe não
só atribuir mais poder à CMVM como criar uma comissão prevista
estatutariamente em cada empresa e composta maioritariamente por membros
independentes, a quem caberia a avaliação do mérito dos candidatos aos
órgãos de administração e fiscalização.
Ora se o diagnóstico não deixa dúvidas, as soluções propostas por
Carlos Tavares têm mérito mas não farão milagres. Afinal, desde a
alvorada da Humanidade que os ladrões estão constantemente um passo à
frente da polícia. Podemos ter as melhores leis do mundo, mas se as
pessoas não forem sérias rapidamente arranjam forma de as contornar. E
mesmo que a CMVM tivesse super-poderes, nunca conseguiria colocar um
“polícia” em cada conselho de administração. Quanto à super-comissão que
avaliaria o mérito dos administradores e demais elementos dos órgãos
sociais, fica a questão: quem fiscalizaria os fiscalizadores?
Enquanto existir quem se deixe enganar, haverá sempre quem
procure tirar proveito disso. É uma lei da vida. O legislador, a CMVM e a
própria comunicação social podem certamente contribuir para que haja
uma melhor governação nas empresas portuguesas, mas os acionistas
deveriam ser os primeiros interessados em correr com gestores
incompetentes ou corruptos. No fim do dia, os acionistas das empresas
têm as administrações que merecem.
. IN "O JORNAL ECONÓMICO"
21/06/17
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