11/05/2017

JOÃO GOBERN

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Identidade

O facto a reter, que merece o sublinhado como sintoma, é este: 18 canções, duas línguas. Multiplica-se o inglês por 17, quer a origem seja o Azerbaijão ou a República Checa. Isola-se - assume contornos de verdade absoluta o "mais vale só do que mal acompanhado" - o português, com a pérola (outra...) que saltou do baú de Luísa Sobral e que o seu irmão, Salvador, elevou a um nível tão contagiante como comovente, frágil mas convicto. Claro que não é apenas o idioma que define uma identidade, longe disso. Mas, neste caso, a letra ajuda a escapar a uma mediocridade que, não é difícil adivinhar, vai manter-se na meia-final de amanhã e repetir-se na final de sábado.

A Eurovisão continua a viver o seu (insuperável?) equívoco. Copia receitas, adota fórmulas, segue modas. Na dúzia e meia de cantigas de ontem, lá estavam os/as imitadores/as das Adeles, das Anastacias, dos Justins (Timberlake ou Bieber), lá andavam ainda os que mantêm como ídolos Barry Manilow, Céline Dion ou Barbra Streisand. Na maioria dos casos, começar a ouvir uma qualquer das propostas apresentadas é reencontrar algo que cola, funde, repete aquilo que já se escutou dezenas de vezes. Duas exceções: as canções da Arménia, com toque local, e da Bélgica, que precisava de intérprete mais segura. Estranho, mas seguiram ambas adiante.

Salvador Sobral nem sequer "facilitou", não limou arestas numa interpretação que cruza momentos pouco convencionais. Mandou às urtigas as coreografias e deu uma lição aos que teimam em entender a música como uma "operação plástica". Mas não nos iludamos: por razões múltiplas, não tem hipótese de ganhar. Se esse absurdo se verificasse, tudo mudaria na Eurovisão, que parece - desde sempre - pouco disponível para pensar e para prescindir dos jogos de máscaras. Não será agora, para nos fazer o jeito.

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
10/05/17

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