Legislativas
e presidenciais
O Presidente da
República não governa, não legisla, não absolve, não condena nem manda
prender. O Presidente da República limita-se a presidir e, nas presentes
circunstâncias, poderia até demitir o Governo e convocar eleições
legislativas antecipadas por sua exclusiva vontade, mas é coisa que não
quer nem se atreve. Em 2011, o Presidente limitou-se a aceitar o pedido
de demissão de um primeiro-ministro humilhado no Parlamento por toda a
oposição. Em 2013, admitiu fazê-lo, se quisessem, mas apenas quando a
"troika" fosse embora... Como não quiseram, resignou-se e calou-se para
sempre, como as testemunhas em casamento canónico.
Compreende-se
que almas generosas se apressem na multiplicação de candidaturas para o
substituir. Não se trata de um mero desfile de vaidades: a candidatura à
Presidência é um ato cívico, uma decisão respeitável do foro da
consciência individual. Mas que as eleições presidenciais do próximo ano
possam suscitar o "frenesim" que percorre atualmente toda a Comunicação
Social, isso é um denso mistério! Vivemos nestes últimos quatro anos a
mais profunda e dolorosa crise da história da nossa democracia. As
políticas do Governo comprometeram deliberadamente o desempenho de
funções essenciais do Estado, afetando de forma indiscriminada a
generalidade dos serviços públicos com prejuízos irreparáveis nos
cuidados de saúde, no funcionamento da justiça, na segurança social, nas
escolas ou na investigação científica. As empresas públicas foram
vendidas ao desbarato para benefício dos investidores internacionais e
para ocultar o fracasso do cumprimento das metas orçamentais prometidas
aos credores. Porém, este trabalho metódico de destruição do Estado não
conduziu à recuperação económica que o Governo prometia e de que o povo
tanto precisa. Bem pelo contrário, a falência das empresas e a
degradação do valor do trabalho produziram um aumento inédito do
desemprego que obrigou os mais jovens e qualificados a abandonar o país.
Durante quatro anos o Governo e a sua maioria parlamentar apregoaram
que essa política era o único caminho possível e opuseram-se ferozmente,
também na União Europeia, a quaisquer iniciativas que pudessem
contradizer a ortodoxia orçamental que diziam professar - não porque
nela acreditassem mas sim porque lhes servia de álibi perfeito para o
projeto de "destruição criadora" que secretamente os movia.
Com as
eleições legislativas à porta, o Governo deixou de governar e entrou em
campanha eleitoral apesar de o primeiro-ministro ter garantido, em
tempos que já lá vão, que as eleições não lhe interessavam... Aliás,
tudo quanto disseram nos últimos quatro anos deixou de valer! Com o
mesmo à-vontade com que se "esqueceram" do que tinham prometido nas
eleições de 2011, também agora se "esqueceram" de tudo o que fizeram em
quatro anos de governação, proclamaram o fim da crise e voltaram às
promessas radiosas de 2011 que tencionarão cumprir tanto quanto
cumpriram as anteriores. Prova flagrante desta leviandade cínica é a
recuperação do projeto, abortado há dois anos, de reduzir a TSU (taxa
social única). Ao contrário da versão original - que pretendia
transferir para os trabalhadores parte dos encargos que competiam às
empresas - a nova versão agora anunciada pretende aliviar o montante da
contribuição da classe patronal para "diminuir os custos do trabalho",
mas sem aumentar os descontos devidos pelos trabalhadores. Como se a
desvalorização do trabalho e dos salários ainda não fosse suficiente
para alcançar os padrões de "competitividade" que o Governo persegue,
não se hesita agora em comprometer a sustentabilidade da Segurança
Social, transferindo encargos presentes para as gerações futuras, por
mero oportunismo eleitoralista.
Em outubro, esgota-se o mandato do
Governo, encerra-se esta legislatura e realizam-se as eleições
legislativas. É o momento de os eleitos de 2011 prestarem contas do que
fizeram e de o Governo, com a maioria parlamentar que o apoiou, se
submeter ao veredicto dos eleitores. É o momento da esquerda demonstrar
que tem uma alternativa política. É aqui que se joga o nosso destino
coletivo.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
16/04/15
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