30/04/2015

LEONÍDIO PAULO FERREIRA

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O Sr. ministro 
quer casar com a 
Sr.ª ministra, mas...

O título da crónica do Le Monde é chamativo: "poligamia em série no governo marroquino". Exagero? Um pouco. É certo que já havia um ministro que não se contentara com uma só mulher, agora outro decidiu-se também por um segundo casamento. E assim já vão dois. Não, três! Sim, porque é preciso notar que o Sr. ministro das Relações com o Parlamento, Lahbib Choubani, quer casar-se com a Sr.ª ministra delegada junto do ministro do Ensino Superior, Soumia Benkhaldoun. Bela história da jornalista Charlotte Bozonnet, visitante regular de Rabat.

O rumor sobre a paixão entre dois membros do governo corria há tempos, mas tornou-se quase oficial quando o líder de um partido da oposição falou do assunto.

Acusado pelas más-línguas de ter estado na origem do divórcio da colega, de ser "um destruidor de lares", o ministro arranjou forma de esclarecer através de "fontes próximas" a um jornal que o falhanço do casamento anterior da amada lhe era alheio. E, como que para provar a boa-fé, ficou-se também a saber que o pedido de casamento à ministra Benkhaldoun seria feito na presença da sua primeira mulher.

Deixemos agora a vida privada (e Choubani é um eterno remodelável, notícia quando prepara o doutoramento, notícia quando critica as roupas de uma jornalista) e falemos da nação: até que ponto os 6% de casamentos polígamos no governo refletem a realidade de Marrocos? Nada. O nosso vizinho do Sul, apesar de país muçulmano, não contará com mais de 800 casamentos polígamos por ano, apenas 0,3% do total de matrimónios.

Para se perceber esta discrepância é preciso relembrar que o governo está nas mãos do Partido da Justiça e do Desenvolvimento. Depois dos protestos de 2011, na onda da Primavera Árabe, houve uma reforma constitucional e eleições, com os islamitas moderados a ganhar, mesmo que apenas com um quarto dos votos, o que facilitou ao rei o papel de fazedor de governos.

Ora, a tradição marroquina mostra a força da emancipação feminina, com atletas como Nawal el Mouatawakel, ouro olímpico, a dar o exemplo. Também há um crescente número de diplomatas, como a embaixadora em Lisboa, e até a política é terreno onde se afirmam cada vez mais. E desde que Mohammed VI assumiu o trono, em 1999, tudo acelerou: a princesa Lalla Salma é o exemplo da árabe moderna, tendo trabalhado como engenheira; e o código da família de 2004 obriga ao consentimento da mulher se se quiser segunda esposa.

Que sejam felizes o Sr. ministro e a Sr.ª ministra. Mas este parece um daqueles casos em que quem governa está aquém da sociedade. É um problema crónico em muitos países muçulmanos. Aqui surpreende porque é em Marrocos.


IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
27/04/15

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