08/04/2015

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HOJE NO
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Caso Vistos Gold.
Fugas de informação levaram 
arguidos a destruir provas

Ex-director do SEF recebeu um SMS de um elemento da Unidade Contra Terrorista a avisar que seria alvo de buscas no dia seguinte. Empresário chinês já tinha avisado em Março, em mandarim, que estavam “todos sob escuta”

Foi uma detenção mais do que anunciada. A 23 de Março de 2014, Zhu Xiaodong, um dos empresários chineses suspeitos de corrupção activa no processo Vistos Gold, avisou por telefone um concidadão com o qual falava em mandarim sobre a detenção de uma pessoa e de registos criminais falsificados: “Não fales sobre estas coisas ao telefone. Todas as chamadas estão sob escuta agora. Pessoas como nós que tratamos da emigração, estamos todos sob escuta.” 
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Mais ou menos por esta altura, António Figueiredo, então presidente do Instituto dos Registos e Notariado (IRN), fez o mesmo aviso a Eliseu Bumba, um cidadão angolano que aparece referenciado no processo: era preciso ter “cuidado” pois o seu telefone “de Portugal” estava sob escuta. Foram as últimas conversas telefónicas que a Polícia Judiciária interceptou dando a entender que havia uma teia de corrupção montada na administração pública em torno da atribuição de autorizações de residência para investimento (ARI) a cidadãos chineses. Os excertos das escutas constam de um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, a que o i teve acesso.  
Perante o aviso de que estariam sob escuta, os principais arguidos do processo começaram a mudar de tom ao telefone e a evitar determinados temas. Manuel Palos, então director do SEF, por exemplo, não voltou a pedir favores em troca da rapidez na atribuição dos vistos dourados.  
E António Figueiredo, então presidente do IRN, ao mesmo tempo que deixou de falar ao telefone com os chineses sobre autorizações de residência, desdobrou-se em contactos para apurar se, efectivamente, as suas conversas estavam a ser interceptadas.   
Mas esta não terá sido a única fuga de informação que chegou aos ouvidos dos que estavam há meses a ser vigiados naquela que foi baptizada de “Operação Labirinto”. Oito meses depois do aviso de que estavam a ser investigados, e um dia antes de serem detidos, Manuel Palos, o homem que liderava o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, foi avisado de que havia uma mega-operação de buscas montada para o dia seguinte.  
O aviso nem sequer chegou com grandes disfarces: Palos recebeu um sms de um membro do SEF com funções na Unidade Contra Terrorista (UCAT) – grupo que reúne, entre outros, elementos do SIS, SIED, PSP, GNR e PJ. Os investigadores ficaram estupefactos: os mandados de busca eram apenas do conhecimento de um grupo restrito de intervenientes – 8 magistrados do DCIAP e 5/6 directores da PJ – e nem todos eles tinham conhecimento do conteúdo de todos os mandados.  
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A verdade é que a operação de buscas chegou sem surpresa, dando tempo aos arguidos para destruírem e ocultarem provas, nomeadamente comunicações electrónicas, conforme indiciava uma escuta telefónica a Jaime Gomes, antigo sócio de Miguel Macedo e também arguido no processo, e como uma perícia informática viria a provar.  
Manuel Palos terá demonstrado uma “conduta de facilitação contínua”, pelo menos desde Novembro de 2013, data em que começaram as intercepções telefónicas. Mas essa conduta, segundo os investigadores, terá sido “abruptamente interrompida” já nos primeiros meses de 2014. O Ministério Público suspeita que a primeira fuga de informação ocorreu em finais de Fevereiro, início de Março daquele ano, altura em que Palos começou a fazer questão de frisar ao telefone que “todos os processos têm de seguir os trâmites normais, independentemente de quem solicite urgência na solicitação”.  
Palos teria como missão acelerar os procedimentos, ou seja, ser uma espécie de “facilitador burocrático” na obtenção de vistos dourados pelos clientes dos empresários chineses. O Ministério Público suspeita mesmo que a partir da primeira fuga de informação “plantou” conversas telefónicas só para “simular” que a sua conduta nos vistos gold era correcta.  
Ao mesmo tempo, o homem que liderava o Instituto dos Registos e Notariado servia-se da sua rede de contactos no SIS, na magistratura, no SEF, e na PJ, para indagar, “directa ou indirectamente” se estava a ser alvo de intercepções. Por duas vezes, como já relatado pela “Sábado”, o contactado foi Almeida Rodrigues, director nacional da Polícia Judiciária. Da primeira vez, no início de Março de 2014, António Figueiredo fez a pergunta por telefone, a partir do seu secretariado. Da segunda, em Abril, aproveitou-se de uma deslocação a Angola para questionar Almeida Rodrigues directamente. À pergunta do director da PJ sobre quem o teria informado, Figueiredo terá respondido apenas: “Um magistrado.”  
Numa conversa telefónica que consta dos autos do processo Figueiredo acrescentou um pormenor: refere-se à fonte de informação como um procurador próximo do Ministério da Justiça. 
As conversas telefónicas entre Figueiredo e Zhu começaram a aparecer cifradas, com referências imperceptíveis a “fábricas de batatas”, e uma conversa telefónica entre o então presidente do IRN e a filha deu a entender que Figueiredo mantinha outro número de telefone, que não era conhecido, e para o qual a filha teria tentado ligar, mas sem êxito.  
O facto de haver indícios de que uma equipa do Serviço de Informações e Segurança (SIS) terá efectuado um primeiro “varrimento electrónico” no gabinete do presidente do IRN , a 27 de Fevereiro, também não é encarado pelos investigadores como uma mera coincidência temporal. 
Certo é que, apesar de todas as cautelas, Manuel Palos deveria continuar com dúvidas pois em Maio, numa conversa com um indivíduo chamado “Zé”, aquele lembrou-o de que se estivesse a ser investigado por causa dos “vistos gold”, Alexandra Góis, funcionária do SEF destacada em serviço no DCIAP, já o teria avisado.  
Nessa mesma conversa falam sobre “o homem do IRN”. Zé diz ser voz corrente que, para além da posição que exerce, Figueiredo teria um escritório que trataria desse tipo de investimentos. E logo de seguida pergunta a Palos se aquele não o tem chateado. O director do SEF diz que não, que só pede o que os outros pedem.  
Os cuidados dos arguidos foram reforçados em Junho de 2014, depois de a “Sábado” avançar que estava a ser investigada uma teia de corrupção e tráfico de influência à volta da atribuição dos vistos dourados. Três semanas antes da divulgação da notícia, a informação já seria do conhecimento do secretário de Estado do Ministério da Administração Interna, João Almeida.  

A partir desde momento, a colaboração do director do SEF cessou totalmente, a ponto de os chineses serem obrigados a contratar um escritório de advogados para acelerar a atribuição do vistos. António Figueiredo, porém, nunca terá posto de lado os seus negócios imobiliários, continuando a ter reuniões de investimento e a fazer visitas a imóveis. 
A 18 de Junho, houve nova limpeza electrónica efectuada pelo SIS. E a 2 e a 16 de Junho, Figueiredo contactou directamente a Procuradoria-Geral da República (PGR) no sentido de averiguar se havia algum inquérito pendente em que fosse suspeito. 
Em Novembro, na mesma semana em que foi detido José Sócrates, foram detidos onze suspeitos do caso Vistos Gold, entre eles António Figueiredo (que ainda se encontra em prisão preventiva), Manuel Jarmela Palos (obrigado a apresentações periódicas) e a ex-secretária-geral da Justiça Maria Antónia Anes (que permanece em prisão domiciliária). O Ministério Público avisa que não são os únicos suspeitos.  
Na fundamentação do acórdão da Relação de Lisboa a que o i teve acesso, o Ministério Público sublinha que a investigação “está longe de estar próxima de uma conclusão” e rejeita processos “paralelos”. Frisa haver diversos suspeitos ainda não constituídos arguidos e muita prova ainda a ser procurada através das perícias informáticas, contabilísticas e financeiras em curso.

* Estes criminosos de "colarinho branco" são todos da inteira confiança dos ministros do governo que os tutelam.

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