Episódios
vagais preocupantes
Um consenso
nacional era, inegavelmente, importante para o País. E até pode vir a
tornar--se uma realidade e a impor-se pela necessidade e a conjuntura.
Mas neste momento, e dentro dos prazos que Cavaco Silva determinou - até
à aprovação do próximo Orçamento -, é uma mera utopia demagógica. É um
verdadeiro "inconseguimento". E o Presidente sabe-o: só insiste na
proposta para poder dizer mais tarde que tinha razão na solução
proposta. E esse mais tarde é daqui a um ano, quando as próximas
legislativas impuserem per se um acordo entre partidos.
Resta saber
quais e com que líderes. Em condições normais, os partidos da coligação
no Governo estariam neste momento com vários problemas em mãos que nem
os juros baixos dos mercados, que permitiram dispensar a última tranche
da troika, conseguiriam disfarçar. O oitavo chumbo do TC, e o que ele
obriga a refazer contas, associado ao desfazer de outra utopia, a do
milagre económico suportado por um crescimento de exportações que afinal
tem pés de barro, fragilizariam ainda mais PSD e CDS. Mas a crise
interna no PS e as lutas fratricidas que está a gerar desviaram as
atenções. Deram um fôlego à coligação e outras preocupações aos
socialistas. Todos pensam em eleições.
Nenhum em acordos. A verdade é
que não há soluções mágicas para tirar o País do fundo do precipício.
Passos já repete a receita de Sócrates. Seguro ou Costa, com ou sem
Passos ou Rio, ajudados por Marinho e Pinto, Portas ou quiçá Louçã, não
terão muitas alternativas para o menu. Nem nomeando juízes à medida para
o Tribunal Constitucional. Só se a UE decidir contabilizar no PIB,
depois da prostituição e do tráfico de droga, as ideias sem nexo.
Não
está provado que houvesse causa-efeito entre os protestos dos
professores na Guarda e o desmaio sofrido por Cavaco Silva. Mas está
demonstrado, por imagens, que enquanto um homem, já com uma certa idade,
que até é a primeira figura da nação, e que estava ali para comemorar
mais um Dia de Portugal, era levado em braços, desfalecido, esses
protestos não pararam, nem os protestantes mostraram qualquer
preocupação humana, quanto mais de Estado. Mário Nogueira lidera o
poderoso sindicato dos professores que se notabiliza apenas por ser
contra tudo e mais qualquer coisa. A sua experiência de professor é
nula. A de político, pelos anos de estratégia de emboscadas que já leva,
devia ser de profissional excelentíssimo. Mas também não é. E é por
isso que continua onde está e não onde queria estar. Porque a imagem que
fica de mais umas celebrações vazias de significado não é a da queda do
Presidente. É a do estado em que vai cair o sindicalismo se mantiver
estes protagonistas.
Ricardo Sá Fernandes gravou um ato de
corrupção. O ato, o da gravação, aconteceu antes da lei que beneficia e
estimula quem denuncie este tipo de casos. Talvez por isso, ou
simplesmente porque sim, Sá Fernandes foi condenado a uma multa, que
agora pode quadruplicar, porque fez a gravação, imagine-se, sem pedir
consentimento ao corruptor. Já o outro ato, o de corrupção, até valeu
uma condenação a Domingos Névoa. Só que a avaliação da pena está no
Supremo Tribunal de Justiça e, como de costume, o caso corre o risco de
prescrição, cujos prazos o Governo está para alargar há ano e meio. Mais
esta triste imagem da Justiça não fará certamente disparar as denúncias
de corrupção e, em consequência, travar o crescimento deste crime.
Ninguém arrisca pagar por denunciar. E vendo os negócios de Névoa todos
acharão que o crime compensa. Eis pois um caso exemplar do pior de
Portugal.
As eleições para a Liga de Clubes, a organizadora dos
campeonatos profissionais de futebol, estão envoltas em polémicas e
pedidos de impugnação. O presidente, que a maioria dos clubes parecia
querer destronar, acabou por ser reeleito na única lista candidata. O
golpe de teatro final, que teve cenas de perseguições, acidentes de
automóvel e segurança reforçada, se foi organizado pelo próprio merece
uma "chapelada": se Mário Figueiredo for tão eficaz e eficiente no seu
cargo, o futebol português vai tornar-se uma das melhores ligas
mundiais. Mas se foi demérito dos restantes candidatos, é mais um rude
golpe para a imagem da nossa justiça e para a utopia dos consensos
nacionais: como é que dois juristas como Fernando Seara e Rui Rangel não
conseguiram entender-se para apresentar uma lista legal?
Os
banqueiros nacionais tinham, até há poucos anos, uma imagem de seriedade
e rigor inquestionáveis. Era o mínimo que se pedia àqueles a quem se
entregava a gestão do dinheiro: podiam enriquecer, mas a confiança
obrigava a que estivessem acima de qualquer suspeita. Tirando da equação
o BPN, porque é simplesmente um caso de polícia ainda que sem ninguém
na cadeia, os últimos acontecimentos conhecidos, entre livros,
investigações ou simples notícias, mostram uma realidade preocupante.
Traições, traficâncias, zangas familiares ou pessoais, negócios mal
explicados, culpas de mordomos com nome francês, trouxeram à tona um
mundo de sombras no qual o sector financeiro nunca podia ter mergulhado.
Porque agora será muito difícil voltar à tona da credibilidade
necessária.
Marinho e Pinto já não vai integrar o grupo de "Os
Verdes" do Parlamento Europeu. Estará ao lado dos liberais. A culpa é
do interrogatório feroz a que os ambientalistas da Europa submeteram o
homem do MPT. Ecologicamente, o ex-bastonário dos Advogados parece que
não tinha nada que se lhe pudesse apontar. O problema nem estaria na
defesa de alguns temas mais fraturantes, ainda que nada tivessem também
que ver com ambiente. Parece que chegou ao conhecimento dos ecologistas
europeus, de mão beijada e sem qualquer objetivo por parte da política
do burgo, obviamente, que Marinho e Pinto põe problemas à adoção por
casais do mesmo sexo, essa grande causa verde, a par dos efeitos
devastadores de El Niño. Quem terá medo deste ogre (ex) verde?
Estes
são episódios vagais da semana que passou. Separados, valem o que
valem. Mas juntos são preocupantes: mostram o estado do País e de quem o
dirige ou quer dirigir.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
14/06/14
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