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IN "SÁBADO"
05/05/14
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Exportação aos emigrantes
Sou
um amolecido sentimental. Adoro os passarinhos (grelhados na brasa),
quero acabar com a fome (de títulos do Boavista, o meu clube desde a
infância tripeira) e amo o rosto das crianças (de preferência enquanto
fazem birras a milhas de minha casa). Mas não há nada que me comova
mais do que a excelência, esse alquímico paroxismo de trabalho e génio.
Todos os portugueses excepcionais seduzem pelas centelhas do seu brilho,
mas é o labor furioso, obsessivo, apaixonado que os distingue da
multidão. São os casos, por exemplo, de Júlio Pomar e Paula Rego na
pintura, de António Damásio na neurologia, de Eduardo Lourenço no
ensaio, de Souto Moura e Siza Vieira na arquitectura, de Nélson Évora e
Francis Obikwelu no atletismo, de Cristiano Ronaldo no futebol. Pomar
radicou-se em Paris. Rego vive em Londres há quatro décadas. Damásio
esteve nove anos no Iowa, leccionando hoje na University of Southern
California. Lourenço fixou residência em Vence, França, há quase meio
século. Évora e Obikwelu (nascidos, respectivamente, em Abidjan e
Onitsha) foram treinar para Espanha. Ronaldo não trabalha em Portugal há
13 anos. Siza Vieira deu aulas em Bogotá, Lausanne e Harvard, e as suas
obras estão espalhadas pela Holanda, Estados Unidos, Coreia do Sul.
Desde o século XII, quando o filho de um nobre da Borgonha decidiu romper com a sobranceria galega e leonesa, que o génio português se perpetua nos “estrangeirados” – o que seria da prosa de Eça sem as estadias em Bristol e Newcastle, ou da poesia de Pessoa sem a juventude em Durban?
Na semana em que se comemora mais um 1º de Maio, os emigrantes são a marca de água da lusitanidade no mundo. Se no caso da excelência, trabalhar no estrangeiro era uma opção, uma escolha, no caso dos que a ela hoje aspiram, trabalhar além-fronteiras transformou-se no único caminho possível. Outrora, a “fuga de cérebros” era o quadro de honra de um desígnio. Neste Dia do Trabalhador, tornou-se a forçada sangria de um corpo anémico chamado Portugal.
Desde o século XII, quando o filho de um nobre da Borgonha decidiu romper com a sobranceria galega e leonesa, que o génio português se perpetua nos “estrangeirados” – o que seria da prosa de Eça sem as estadias em Bristol e Newcastle, ou da poesia de Pessoa sem a juventude em Durban?
Na semana em que se comemora mais um 1º de Maio, os emigrantes são a marca de água da lusitanidade no mundo. Se no caso da excelência, trabalhar no estrangeiro era uma opção, uma escolha, no caso dos que a ela hoje aspiram, trabalhar além-fronteiras transformou-se no único caminho possível. Outrora, a “fuga de cérebros” era o quadro de honra de um desígnio. Neste Dia do Trabalhador, tornou-se a forçada sangria de um corpo anémico chamado Portugal.
05/05/14
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