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HOJE NO
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FMI anula "milagre económico"
e exige cortes de mais 3 mil milhões
As contas à austeridade não acabam com o fim do programa de ajustamento. Reforma do Estado vai avançar em Março com propostas concretas para o pós-troika
O governo terá de identificar cortes permanentes adicionais no valor
de 3 mil milhões de euros para cumprir o défice previsto para 2015 e
anos seguintes.
No relatório sobre a décima avaliação do programa de assistência, o
Fundo Monetário Internacional (FMI) diz que “para atingir a meta do
défice de 2,5% do produto interno bruto (PIB) e a saída do procedimento
dos défices excessivos em 2015, as autoridades vão precisar de
identificar medidas permanentes adicionais que correspondam a 1,2% do
PIB (2070 milhões). Além disso, será necessário fazer, nos anos
seguintes, um esforço adicional de cerca de 0,5% do PIB (860 milhões)
face às projecções de base para responder às exigências do tratado
orçamental europeu”. Como Portugal continua a ter um nível relativamente
alto de despesa primária, o FMI lembra que as maiores fatias vão para
pagar pensões e salários, não é surpresa que se concentrem aqui os
cortes adicionais.
A racionalização do Estado passa pela criação de uma tabela única
para os salários e suplementos, mas também por reduzir a diferença entre
as transferências sociais e as contribuições para a Segurança Social.
Na carta ao FMI, o governo acrescenta que está a trabalhar em medidas
abrangentes para uma reforma estrutural das pensões, em linha com a
decisão do Tribunal Constitucional quando chumbou a convergência das
pensões do Estado com a Segurança Social, obrigando a reformular a CES
(contribuição extraordinária de solidariedade) para tapar o buraco nas
contas de 2014.
As novas regras do trabalho no Estado, que serão votadas até final de
Junho, fazem parte da proposta de reforma do Estado que irá novamente a
Conselho de Ministros. Em Março, o guião de Paulo Portas irá dar lugar a
propostas ainda preliminares, mas que o executivo quer que reflictam já
um consenso político e social alargado. Estas serão matérias a discutir
na avaliação que começa hoje, mas irão também marcar o período
pós-troika, na medida em que farão parte dos planos orçamentais de médio
prazo que integram o Documento de Estratégia Orçamental em Abril.
Não obstante, o risco de novos chumbos do Constitucional continua vivo e até aumentou nos últimos meses, reconhece o FMI.
Além de deixar antever mais cortes, o Fundo arrefece ainda as
expectativas que os membros do governo têm alimentado de uma possível
descida de impostos no próximo ano, avisando que qualquer reforma fiscal
futura terá de ser feita dentro dos limites orçamentais.
O governo assumiu ontem, a várias vozes, que a “disciplina
orçamental” é para manter no próximos anos, com a ministra das Finanças a
admitir “preocupações” com aquilo que a tentação eleitoral pode trazer.
Paulo Portas também diz que o país não pode “voltar à
irresponsabilidade”, e defende o início de uma redução de impostos
“faseada”.
O fundo avisa que “terá de existir uma resistência firme por vários
ciclos políticos às pressões para aumentar a despesa pública”, enquanto
qualquer reforma fiscal terá de ser feita dentro dos limites do envelope
orçamental.
“Há sempre preocupações em torno dos períodos eleitorais, a
disciplina orçamental não é tão sexy ou atractiva como a despesa
orçamental”, disse Maria Luís Albuquerque quando confrontada com as
tentações eleitorais no pós-troika, durante a conferência da revista
britânica “The Economist”, em Cascais. A ministra preferiu dedicar boa
parte da intervenção às vantagens da consolidação orçamental. Já ao fim
da manhã, o vice-primeiro-ministro esteve no mesmo palco e, à saída,
respondeu às preocupações eleitorais: “Dizer que uma política de início
de moderação fiscal tem de ter prudência orçamental é a mesma coisa que
dizer que o dia é claro e que a noite é escura. É uma evidência”,
rematou. Por isso, o número dois do governo defende que “há que fazê-lo
faseadamente, utilizando o factor tempo”.
Paulo Portas concorda com a ministra quando diz que “o fim do
programa não significa autorização para voltarmos à irresponsabilidade
financeira”, mas diz que “também não podemos viver em excepcionalidade
permanente”.
E a pressão para que a disciplina se mantenha vem dos credores. O FMI
insiste na necessidade de um “consenso político alargado” para
“garantir que os esforços de consolidação orçamental dos últimos três
anos se mantêm e são concluídos”. Mas a resistência socialista é grande,
com António José Seguro a declarar que o que o “separa” do executivo é a
estratégia orçamental, tornando-se difícil que exista um compromisso
para o pós-troika. Num artigo de opinião publicado hoje no i, o
secretário nacional do PS António Galamba fecha a porta: “Ninguém
acredita [no governo], muito menos nós. Esta gente não é de confiança.”
Nestes dois dias de “Lisbon Summit” em Cascais, foram vários os
governantes e representantes de instituições internacionais a insistirem
na importância do consenso político sobre as medidas para o pós-troika,
de forma a conseguir uma saída credível do programa de assistência. Mas
a verdade é que o objecto do acordo ainda é pouco claro.
Maria Luís Albuquerque repete que ainda não há uma “estratégia de
saída”, embora admita que não é obrigatório um programa cautelar a
seguir a um programa de ajustamento. Reconhece que uma saída limpa seria
“uma mensagem forte para os mercados”, mas lembra que, “com ou sem
cautelar, a monitorização vai sempre existir” enquanto o país não tiver
pago” a maior parte da dívida”.
* Sempre manifestámos incredulidade quanto ao milagre de que o governo faz folclore e denunciámo-lo várias vezes, agora que deitaram os foguetes apanhem as canas para chamuscar as mãos.
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