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HOJE NO
"PÚBLICO"
Dirigente nacional do PSD declarou
à câmara de que é vereadora que
demoliu obra ilegal sem o ter feito
Ampliar uma moradia sem licença camarária não é coisa inédita. Mas
requerer ao presidente da câmara o arquivamento do processo de embargo e
da respectiva multa com a falsa alegação de que o acrescento da casa
tinha sido demolido é menos vulgar. E, depois disso, construir mais um
anexo sem licença e em violação do Plano Director Municipal mais raro é.
VICE PRESIDENTE DA CÂMARA DE VALONGO |
Mas quando se sabe que tudo se passou há cerca de dez anos, mantendo-se
ainda hoje as duas construções ilegais, e que a infractora era
vereadora da câmara que lhe embargara a obra três anos antes, as coisas
tornam-se mais complicadas. E que pensar quando a vereadora em causa foi
vice-presidente da câmara no mandato que agora terminou; foi número
dois da lista de um dos partidos candidatos às últimas eleições
autárquicas no mesmo município; e é um dos 18 membros da comissão
política nacional desse partido?
A vereadora desta história chama-se Maria da Trindade do Vale (62 anos)
e o partido pelo qual foi eleita vereadora da Câmara de Valongo
(distrito do Porto), e de cuja comissão política nacional é membro, é o
PSD.
Foi em Março de 2000 que os fiscais da Câmara de Valongo detectaram a
construção clandestina, em fase de acabamento, de uma pequena ampliação
nas traseiras da moradia de Trindade do Vale, em Ermesinde. Os trabalhos
foram embargados e, um ano depois, a proprietária foi informada de que
poderia requerer a legalização da obra, "caso a mesma fosse
legalizável". Se nada dissesse dentro de oito dias, o acrescento seria
demolido pelo município. A proprietária nada disse. E nada aconteceu.
No final desse ano, porém, a então professora e presidente da Adice,
uma poderosa instituição particular de solidariedade social que ainda
dirige, integrou a lista do PSD para as autárquicas de 2001 em Valongo.
Não foi eleita, mas assumiu logo as funções de assessora para a área da
Acção Social do presidente da câmara, o social-democrata Fernando Melo,
que no ano passado deixou o município, após 18 anos na presidência.
Passado mais um ano, em Fevereiro de 2003, sem que a questão da obra
ilegal e o respectivo processo de contra-ordenação - que deveria
conduzir ao pagamento de uma multa - tivesse tido qualquer evolução, a
assessora torna-se vereadora da Acção Social. A promoção deveu-se à
saída de Marco António Costa, o então vice-presidente da autarquia,
ex-secretário de Estado da Segurança Social e actual coordenador da
Comissão Política Nacional do PSD, figura muito chegada à sua
substituta.
Dois meses depois, a nova autarca pede uma audiência ao arquitecto que
dirigia o serviço de gestão urbanística, Vitor Sá, na qual lhe é dado
conhecimento de que a obra ilegal é passível de legalização. Na
informação redigida pelo técnico lê-se que Trindade do Vale ficou de
decidir se mandaria demolir o acrescento ou se iniciaria o processo de
legalização.
Quatro meses mais tarde, em Agosto de 2003, comunicou ao técnico que
tinha resolvido demolir a obra, requerendo ao presidente da câmara e seu
colega de vereação, já em Junho de 2004, o arquivamento do processo.
Motivo alegado no pedido, consultado na semana passada pelo PÚBLICO nos
serviços do município: a requerente "decidiu não apresentar o processo
de licenciamento das obras que tinha efectuado, por ter entendido
proceder à sua demolição. Ora, uma vez que já se encontram demolidas as
obras", requer "o arquivo oficial do processo".
O processo foi então arquivado, embora lá não conste o deferimento do
pedido da vereadora. Mas nove anos depois, em Setembro deste ano, um
blogue de Valongo (A Terra Como Limite, da autoria de Celestino
Neves), mostrou, com fotografias, que afinal o prometido não tinha sido
cumprido. Isto é: o acrescento clandestino continua no local, conforme o
PÚBLICO verificou na semana passada.
A análise do processo camarário permite, contudo, chegar a uma outra
conclusão. Posteriormente ao embargo dessa obra no ano 2000, e em data
desconhecida, Trindade do Vale construiu mais uma obra ilegal no pequeno
quintal da sua moradia. Desta vez foi um anexo, tipo caixote, com uma
janela, erguido por cima de uma das garagens da residência - anexo que é
o único com aquelas características na correnteza de moradias geminadas
da Rua de Leonardo Coimbra, em Ermesinde. O processo camarário nada
diz, todavia, sobre esta segunda obra clandestina.
Em resposta ao PÚBLICO, contudo, o município esclareceu anteontem o
caso, por escrito, afirmando estar "perante duas situações distintas":
uma respeita à ampliação embargada em 2000; e outra tem a ver com um
"anexo de um piso edificado sobre a garagem, [que] não se encontra
licenciado nem é passível de o ser, já que contraria o disposto no
regulamento do PDM em vigor."
Entretanto, no dia 25 do mês passado, já depois da posse do novo
executivo camarário, de maioria PS, o processo de contra-ordenação
instaurado em 2000 foi "eliminado", depois de prescrito sem qualquer
multa aplicada, por ter sido ultrapassado o prazo de conservação
obrigatória.
O PÚBLICO tentou conhecer a posição de Trindade do Vale desde sexta-feira, por email
e por telefone, deixando recados na Câmara de Valongo, onde é agora
vereadora da oposição, e na Adice, mas nunca obteve resposta. O novo
presidente da câmara, o socialista José Manuel Ribeiro, escusou-se, por
agora, a comentar o caso. Celestino Neves, o autor do blogue que revelou
parte da história e que foi eleito para a Assembleia Municipal de
Valongo como independente na lista do PS, disse ao PÚBLICO que vai
apresentar, brevemente, uma queixa ao Ministério Público contra a
vereadora.
* Em actividades pulhíticas o PSD tem a maioria.
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