Em defesa dos cigarros
Já apanhei poucos desses anos em que fumar no trabalho era normal. Mas ao ler, outro dia, um artigo da especialista em Recursos Humanos do Financial Times, Lucy Kellaway, uma onda de recordações obrigou-me a dar-lhe razão.
Dizia ela - que nem sequer fuma - que os rituais do fumo, e até de
beber um whisky para celebrar uma conquista, aproximavam os
trabalhadores e geravam fluxos de informação importantes nas empresas,
além de promoverem relacionamentos mais saudáveis. Proporcionando
momentos de descontracção, era mais fácil ser criativo e encontrar
soluções - num estilo muito Don Draper [o protagonista da série sobre os
anos dourados da publicidade, Mad Men].
Não faço aqui uma
apologia do regresso do fumo livre - até concordo com a proibição em
locais de trabalho que não só evita que os fumadores intoxiquem os
outros como ajuda a reduzir a quantidade de cigarros consumidos durante o
dia. Mas a verdade é que se perderam coisas boas.
Desde que o
cigarro foi banido das empresas, não só se esfumou esse facilitador de
negócios e criador de empatias - acender um cigarro a outra pessoa tem
uma dose de intimidade - como se criou um ambiente de quase batalha. Os
que não fumam contra os outros - que deixam a casa de banho empestada
quando ali prevaricam; que o ar fica irrespirável quando, altas horas,
acreditam que a única outra pessoa no escritório, duas salas ao lado,
nunca vai reparar que está a dar umas passas. Os que fumam contra o
mundo - a matar o vício debaixo de chuva, do outro lado da rua para à
entrada não ficar um tapete de beatas. E a rogar pragas aos que os
atiraram para o exílio.
“E então?” - pergunta o leitor, que de
certeza não é fumador. Bem, se não podemos voltar atrás, pelo menos
devíamos tentar recuperar a parte boa. Não com fins-de-semana de team
building, em que os trabalhadores são artificialmente obrigados a
conviver - a sério, quem é que quer passar os dois dias livres da semana
com os colegas de trabalho?! - e apenas se unem na cusquice sobre
aqueles que se enrolaram à frente de toda a gente ou o outro que vomitou
nos sapatos do chefe. Mas talvez criando condições para que momentos de
convívio e descompressão se tornem naturais. Uma máquina de café
decente num espaço com duas ou três mesas é um bom incentivo.
Chefe de Redacção adjunta
IN "DINHEIRO VIVO"
14/10/13
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