Acerca
da sobrevivência
Não há maneira de cortar nas pensões de sobrevivência sem isso criar um
choque na opinião pública – até pelo nome da dita prestação. Sabendo
isso, o Governo só piorou essa reacção. Piorou-a porque Paulo Portas
apareceu triunfal, na conferência de imprensa pós-troika de
quinta-feira, contente com a sua habilidade de substituir cortes
drásticos por “pequenas e médias medidas”. Pecou porque isso não é
inteiramente verdade e pecou por uma omissão que agora lhe sai cara –
tornando evidente que o discurso político do “novo ciclo” chegou cedo
demais face à realidade dos factos.
Há um outro problema que deve ser
assinalado: o da coerência destes cortes todos. Só falando de pensões,
já temos a CES (a taxa que é suposto ser transitória), o aumento da
idade da reforma, a famosa convergência dos sistemas público e privado,
juntando-se agora esta medida. Sem uma explicação coerente sobre tudo – e
sobre como tudo fica – a opinião pública ficará sempre com a impressão
de uma casa desconstruída peça a peça, à medida das necessidades. Pior,
os potencialmente atingidos ficam sem saber o que lhes cabe ou não.
Dito
isto, face à actual situação, não tenho a ilusão de achar que ainda há
medidas boas por tomar, daquelas que não custam a ninguém. E acho, salvo
melhor explicação dos críticos, que esta medida não é tão gravosa como
outras que se perspectivam. Primeiro porque aplicar a chamada “condição
de recursos” a quem a recebe (fazendo prova dos seus rendimentos e
propriedades) me parece justo, tando em conta que não se trata de uma
prestação em que houve descontos directos. Segundo, porque da época da
sua criação para hoje o Estado Social cresceu e garante outra rede a
quem dela precisar (medidas como o Rendimento Mínimo, por exemplo). Por
fim, porque se anuncia um patamar mínimo, antes do qual não há
descontos.
Para austeridade, os cortes na CGA parecem-me bem piores.
Errata:
Um
eminente deputado da oposição alertou-me, e bem, que a TSU se aplica
também à nossa morte. Ou seja, estruturalmente falando a pensão de
sobrevivência é de descontos directos.
Isso não anula, na minha opinião, a hipótese de alterar o regime, sob
pena de protegermos os direitos adquiridos a duas gerações. Depende do
como? Claro. Mas isso depende sempre.
IN "SOL"
07/10/13
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