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Juíza cita Gato Fedorento para votar contra absolvições no caso Taguspark
Juíza usou sketch humorístico para mostrar que em casos de corrupção é preciso interpretar escutas e fazer uso da prova indirecta
Juíza
que deu o voto de vencida no caso Taguspark defende que ficou
demonstrado em julgamento que Rui Pedro Soares, Américo Thomati e João
Carlos Silva cometeram um crime de corrupção passiva para acto ilícito e
deviam por isso ter sido condenados numa pena de prisão não inferior a
três anos. Que poderia até ser suspensa, desde que estes pagassem "ao
erário público o prejuízo causado com o pagamento ao jogador Luís Figo"
como contrapartida pelo "apoio político-partidário" a Sócrates "nas
eleições legislativas de 2009".
Na declaração de voto que consta da sentença a que o i
teve acesso, a juíza do colectivo do Tribunal de Oeiras chega mesmo a
citar uma expressão usada pelos humoristas Gato Fedorento num sketch
alusivo às escutas telefónicas a Valentim Loureiro - "Quero corrompê-lo e
bem" - na tentativa de mostrar que a conclusão de culpa em escutas
telefónicas de casos de corrupção não pode ser feita apenas quando os
intervenientes referem "assumida e directamente" expressões como
"negócios ilícitos", "pagamentos" ou "corrupção". Este é um dos exemplos
dados pela magistrada de Oeiras para sustentar porque não concordou com
a decisão das colegas, que optaram por absolver os três arguidos. A
maioria do colectivo concluiu que não poderia haver condenação por
corrupção passiva porque os indícios que resultam das transcrições das
escutas telefónicas "não foram corroborados em julgamento" e porque
aquele crime pressupõe "aceitação ou promessa de vantagem patrimonial ou
não patrimonial" e esses indícios de promessas ou subornos não foram
apurados.
Rui Pedro Soares e os dois ex-administradores do pólo
tecnológico de Oeiras podem até não ter confessado os factos, e as
testemunhas podem também não o ter admitido "de forma directa", mas não
era de esperar que o fizessem, diz a magistrada. Além disso, neste tipo
de criminalidade, insiste a juíza, "não existem vítimas/ofendidos
específicos que prestem em tribunal o seu depoimento com conhecimento
directo e presencial dos factos". Sendo assim, o que resta é recorrer "à
prova indirecta" e "às regras da experiência comum". Para sustentar
esta tese, a magistrada cita acórdãos da Relação de Lisboa e do Supremo
Tribunal de Justiça (STJ) que vão no mesmo sentido: "A prova nem sempre é
directa, de percepção imediata; muitas vezes é baseada em indícios",
lê-se no acórdão do STJ.
Assim, a magistrada não ficou com dúvidas
de que "os arguidos obtiveram o apoio político-partidário do jogador de
futebol Luís Figo à campanha legislativa de 2009 mediante a celebração
de um contrato de patrocínio publicitário firmado entre o referido
jogador e o Taguspark e que garantia àquele o pagamento, pelo período de
três anos, do montante global de 750 mil euros". E que esse contrato
"não correspondeu a qualquer interesse comercial da empresa Taguspark",
tendo sido determinado por "interesses contrários" à empresa de capitais
maioritariamente públicos.
Apesar de em julgamento Rui Pedro
Soares ter negado qualquer intervenção no apoio público dado por Figo a
Sócrates, e qualquer intervenção na contratação do ex-futebolista pelo
Taguspark, a magistrada concluiu que as suas declarações "não só não
foram confirmadas pela demais prova produzida em audiência" como até
"foram infirmadas". Como tal, alguns factos que constavam da acusação da
9.a secção do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de
Lisboa deveriam ter sido dados como provados.
Na opinião da
magistrada, ficou demonstrado que Rui Pedro Soares encomendou um estudo
de popularidade de figuras públicas relacionado com o sentido de voto
dos portugueses e depois interveio no apoio de Figo a Sócrates. Apesar
de Luís Figo ter alegado que já não se recordava de quem tinha sido o
interlocutor, a juíza considerou "absolutamente inverosímil" que este
não se recordasse da sua identidade. Além disso, o argumento usado por
Rui Pedro Soares - de que os contactos que manteve com Figo diziam
respeito a negociações com a PT - também não colheu frutos, já que
Zeinal Bava não só disse desconhecer esse interesse como chegou a
afirmar que Figo dificilmente "seria sondado para ser figura" de uma
campanha da empresa de telecomunicações.
As declarações em
julgamento de Thomati e João Carlos Silva, conjugadas com as escutas
telefónicas nascidas do processo Face Oculta, foram suficientes para que
a magistrada também não se deixasse convencer pelos seus depoimentos.
Ambos disseram que o contrato com Figo foi pensado para contrariar a
quebra das receitas do parque tecnológico. Acontece que não houve
qualquer plano promocional "à excepção de um filme" e "o valor de 250
mil euros por ano que o Taguspark se obrigou a pagar ao jogador excedia
manifestamente o orçamento" para o marketing. As contradições, aliadas à
circunstância de os accionistas do Taguspark desconhecerem que Figo
"tinha cedido ao parque todos os seus direitos de nome, voz e imagem"
seis meses depois da assinatura do contrato convenceram a juíza de que o
negócio não foi "lícito".
Argumentos da juíza vencida
Rui Pedro Soares
•
As conversas telefónicas entre este e o seu assessor Paulo Penedos, ou
entre Penedos e João Carlos Silva, foram um dos elementos decisivos
paraa juíza formar a convicção de que deveria ter sido condenado.
•
Juíza está convencida de que o ex-administrador foi quem encomendou um
estudo de popularidade relacionado com o sentido de voto dos
portugueses, já que o autor do estudo mal o conhecia e Zeinal Bava,
ex--presidente executivo da PT, atestou que “não o pediu” nem tenciona
pagá-lo.
• É “inverosímil” que Figo não se recorde de quem foi o
interlocutor das conversas para o apoio a Sócrates. As escutas e os
depoimentos testemunhais, diz, “demonstram cabalmente quem foi o
negociador”.
• Numa das escutas Rui Pedro Soares informa Penedos de
que vai a Milão porque o Taguspark ia associar a sua imagem a Figo. Os
emails mostram também que recebeu a entrevista de Figo ao “Diário
Económico” no dia anterior à publicação, não tendo sabido “explicar a
razão desse envio”.
Os outros arguidos
•
Para a magistrada,as escutas mostram a “concertação de intenções entre
João Carlos Silva e Américo Thomati e adivisão de tarefas”.
• A estrutura accionista desconhecia o contrato.
• Valor do contrato era demasiado elevado para uma empresa com quebra de receitas.
* E fez-se justiça, obrigada pelo seu testemunho sra. juíza.
.
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