Perda de Mandato
Acaba de se colocar perante os tribunais a questão de saber se a perda
de mandato aplicada a autarcas condenados por crimes de responsabilidade
política pode ainda ser executada quando, entre a sentença condenatória
e o trânsito em julgado, o mandato cessou mas foi renovado através de
eleição. A Lei nº 34/87 não dá resposta direta a tal questão.
O artigo 29º da citada lei determina a perda de
mandato de deputados e autarcas que sejam condenados, entre outros, por
crimes de prevaricação, denegação de justiça, corrupção e peculato
cometidos no exercício das suas funções. Porém, a morosidade do processo
pode levar a que o mandato já tenha sido concluído quando a sentença se
tornou irrecorrível.
Se o condenado não foi
reeleito, nem sequer será possível aplicar, nesta parte, a decisão
condenatória que transite em julgado após o termo do mandato. O
condenado pode ter deixado de exercer cargos públicos eletivos, ter
mudado de autarquia ou ter sido eleito para a Assembleia da República, a
Assembleia Legislativa Regional ou o Parlamento Europeu.
É
razoável entender que a lei penal quis determinar a perda do mandato em
que o crime foi praticado, por ter havido uma grave violação da
confiança depositada pelo eleitorado. A sanção de perda de mandato é
acessória em relação à pena de prisão ou multa e fundamenta-se na
violação de uma relação de representação, porque ninguém é eleito para
cometer crimes.
Além disso, a aplicação da perda
de mandato após a cessação do mandato vigente à data da condenação é
muito problemática porque envolve, mesmo no caso de renovação, uma
ampliação da letra da lei. Essa ampliação pode ser considerada uma
analogia que, por razões de segurança jurídica, é proibida nos artigos
29º da Constituição e 1º do Código Penal.
De todo o
modo, este caso constitui um desafio ao legislador. Se é certo que só
uma condenação definitiva (insuscetível de recurso) pode levar à perda
de mandato ou à inelegibilidade, nada obsta a que o efeito da condenação
abranja um novo mandato, de igual ou diferente natureza (por exemplo, o
mandato de deputado), para que o condenado foi depois eleito.
É
possível garantir a eficácia da sanção com vontade política e respeito
pela legalidade. Para tanto, é necessário que os processos sejam mais
céleres e a lei seja clarificada. É possível prever a inelegibilidade ou
a perda de mandatos exercidos aquando do trânsito em julgado da
sentença condenatória, desde que o crime revele indignidade para o seu
exercício.
Professora Catedrática de Direito Penal
IN "CORREIO DA MANHÃ"
11/11/12
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