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Os três erros do FMI
Ashoka Mody, professor na Universidade de Princeton, nos EUA, e ex-quadro superior do Fundo Monetário Internacional, aponta, hoje, no jornal alemão "Boersen Zeitung", o enviesamento do FMI na análise da crise mundial e o facto da zona euro estar no "epicentro" destes erros.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) pecou, desde o início da crise mundial, por três erros, diz hoje o professor Ashoka Mody no jornal financeiro alemão "Boersen Zeitung". Mody é professor visitante de Política Económica Internacional na Woodrow Wilson School of Public and International Affairs da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos.
Mody não é um mero académico, desconhecedor dos meandros do FMI. Foi diretor-adjunto nos Departamentos de Investigação e para a Europa no Fundo e desenhou o programa de resgate da Irlanda, onde foi chefe de Missão da organização. Realizou as análises da Alemanha, Irlanda, Suíça e Hungria, ao abrigo das consultas no âmbito do artigo IV do FMI. Trabalhou, também, muitos anos no Banco Mundial.
O enviesamento dos pontos de vista do FMI manifestou-se em três pontos "técnicos" de enorme importância para as projeções económicas. O que leva a que se repercutam nas metas que fixa e nas terapias aplicadas nos países em que intervêm.
O primeiro erro diz respeito ao tempo que o FMI estimou para a retoma depois de uma crise financeira sistémica como a que ocorre desde meados de 2007 - previu uma retoma mais rápida. Sofreu de "otimismo", hoje evidente em todas as revisões sucessivas em baixa das suas projeções de crescimento para o mundo e para os diversos países-chave e para todos os outros, nomeadamente para os "periféricos" da zona euro. Uma das ilusões apontava para um crescimento sustentado mundial de 2011 até 2015 na ordem de uma taxa média de 4,5%. O crescimento em 2011 foi de 3,8% e as projeções do FMI, no último "World Economic Outlook"(WEO), apontam para 3,3% em 2012 e 3,5% em 2013.
O segundo erro, mais grave, teve a ver com os multiplicadores orçamentais, tendo-os estimado mais baixos do que na realidade se manifestam em tempos de crise sistémica. Foi o tema mais debatido desde que o Fundo publicou a hoje famosa "nota técnica" do seu conselheiro económico Olivier Blanchard no recente WEO, uma pequena caixa no relatório que provocou enorme celeuma e destapou o falhanço técnico do Fundo. Resultado, o efeito recessivo da austeridade orçamental foi muito superior ao previsto em geral e nos países "intervencionados". "As economias sobreendividadas da zona euro - Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Espanha - comportaram-se consideravelmente pior do que o projetado, o que foi devido a cortes de despesa pública e aumentos de impostos significativos", diz o autor.
O terceiro erro tem a ver com outro multiplicador, o do comércio internacional, menos referido nas discussões atuais. Este explica porque o abrandamento económico está hoje muito mais baseado globalmente do que se poderia esperar. Este multiplicador aponta para, em períodos de crise, os países com as economias em contração tenderem a provocar nos seus parceiros comerciais um efeito de "arrastamento" - uma espiral de contágio. "Quando a economia de um dado país abranda, passa a importar menos de outros países, reduzindo, por sua vez, o crescimento desses países, o que os leva a cortar também nas importações", afirma Mody. Ou seja, o que, em virtude de políticas de correção da balança externa e de consolidação orçamental, parece ser favorável num dado país acaba por prejudicar os parceiros comerciais, o que, por sua vez, atua como um boomerang.
Depender das exportações não é credível
Ora o comércio internacional tem estado estagnado nos últimos seis meses por efeito deste "arrastamento". Resultado: "A noção anteriormente popular, que se repercutia nas projeções, de que as exportações seriam o caminho de fuga da crise nunca foi credível. Esta noção está hoje de cabeça para baixo - à medida que o crescimento económico estagna, a queda da procura de importações tem levado a que os problemas económicos alastrem e se aprofundem", diz Mody.
Um dos casos sintomáticos foi o que ocorre com a própria Alemanha, a principal economia da União Europeia e a campeã do que é conhecido como "mercantilismo". A sua estratégia de crescimento de exportações, particularmente para responder "a uma procura voraz da China", começa, agora, a sofrer os efeitos de arrastamento - segundo Mody, "a economia alemã entrou num planalto, e poderá inclusive contrair-se".
O mito de que exportar, exportar, exportar resolve a crise rapidamente esboroa-se. "Na medida em que a economia global se tornou cada vez mais interconectada, os multiplicadores do comércio internacional aumentaram", diz o académico, para concluir: "Não reconhecer este impacto na exportação - e, por sua vez, no crescimento - implica que as projeções continuem a falhar".
A zona euro, com o irromper das crises das dívidas soberanas nos países "periféricos" e com a terapia simultânea de austeridade em diversos países e como linha de orientação geral, tornou-se o "epicentro" de todos estes efeitos. Os erros do FMI têm uma repercussão mais grave nesta zona. " A zona euro tem estado no epicentro desta força de contração no crescimento global", aponta o académico
* Quem sabe, sabe.
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