15/04/2012

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ESTA SEMANA NO
"SEMANA INFORMÁTICA "

Gestão de informação 
incipiente nos hospitais

Com sistemas tecnológicos implantados a vários níveis, os hospitais portugueses ainda falham no processo de gestão da informação que produzem e veiculam

Nos últimos anos, os sistemas de informação hospitalares têm sido amplamente questionados e alvo de investimentos que demonstram uma vontade de modernizar um dos sectores mais importantes para o país. A gestão de informação e a digitalização têm sido áreas de investimento recorrente, ou não fosse a saúde um dos sectores nacionais que mais informação produz e gere.

Andreia de Almeida apresentou recentemente à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa uma dissertação de mestrado em Ciências da Documentação e Informação, variante de Arquivística, na qual expõe resultados que acredita poderem ser bastante úteis para a redução de despesas hospitalares, no que diz respeito à utilização racional das TIC e à implementação de sistemas de informação de saúde.

No seu trabalho, «A gestão sistémica da informação nos hospitais públicos portugueses: uma perspectiva actual», a investigadora concluiu que não existe uma política de gestão dos sistemas de informação hospitalares, observando-se que o investimento que tem sido feito nos últimos anos em TIC não se alargou a um investimento em sistemas de informação, o que, segundo ela, explica os resultados negativos obtidos nos questionários que dirigiu aos conselhos de administração dos hospitais públicos portugueses durante um período de aplicabilidade de três meses, entre Janeiro e Março de 2011.

Andreia de Almeida concluiu que a grande maioria dos hospitais nacionais desconhece, por exemplo, o volume de documentação que circula internamente nas suas instalações, o que é «um sério handicap nos seus sistemas de informação». Entre 2008 e 2010, o volume médio de documentação recebida pelas unidades hospitalares situou-se entre os 20 mil e os 30 mil documentos por ano, tendo sido observada uma ténue tendência de crescimento. Por seu turno, os valores médios da documentação expedida situam-se num intervalo compreendido entre os 56 mil e os 68 mil documentos por ano.

O volume médio de documentação clínica produzida revela um comportamento ascendente durante os anos em análise, mais notório entre 2008 e 2009, registando-se um intervalo compreendido entre os 280 mil e os 320 mil documentos por ano. Quais serão as valências que produzem maiores níveis de documentação clínica? Dos números obtidos conclui-se que são os meios complementares de diagnóstico e terapêutica.

Documentação fragmentada

No que diz respeito ao modelo de suporte em voga no ambiente hospitalar, na sua investigação, Andreia de Almeida concluiu que o tradicional paradigma de utilização da documentação em papel é ainda o mais utilizado. No que diz respeito aos suportes dos documentos expedidos ou recebidos considerados para efeito de registo e classificação é o papel a opção mais votada pelos inquiridos (32%), logo seguida pelos documentos de RX/imagiologia (24%) e pelos documentos Office (18%).

A documentação hospitalar é «fragmentada, descentralizada e negligenciada, o que poderá levar a múltiplas consequências, como falhas no processo de gestão hospitalar, perda da memória das instituições ou retrocesso ao nível da investigação médico-científica», alerta a investigadora.

Cerca de 35% das instituições inquiridas admitem possuir uma política laissez-faire no que diz respeito à gestão dos seus documentos digitais, o que parece corroborar uma parca preocupação das autoridades competentes nesta matéria. Esta situação é também visível no tocante à definição de quem manda na gestão da documentação gerada. Em cerca de 62% dos casos é o conselho de administração o responsável pela política de gestão da documentação.

De acordo com a investigadora, é «preocupante que em 19% dos casos as decisões sobre a documentação sejam deixadas com os seus produtores, o que sublinha uma ausência normativa ou uma fraca política de gestão de documentos administrativos em fase genésica no seio do sector hospitalar público».

De modo a averiguar a existência de uma aplicação informática que gerisse a documentação administrativa ou clínica em fase genésica, a investigadora questionou os responsáveis e apurou que em cerca de 62% dos casos os inquiridos admitiram a existência de aplicações. No entanto, não deixa de ser ainda um número bastante reduzido, uma vez que 38% da amostra testemunha não possuir qualquer meio informatizado para a gestão da documentação clínica e administrativa.

Questionados quanto à existência de uma aplicação informática de gestão documental, sobre as ferramentas utilizadas, os fornecedores, o sistema operativo e as bases de dados utilizadas, os responsáveis apontam uma vasta panóplia de aplicações, bem como de fornecedores. O SAM e o SONHO, fornecidos pela ACSS, são as aplicações informáticas mais utilizadas pelos elementos da amostra. Cerca de 8% dos inquiridos referem a utilização de programas desenvolvidos pela equipa interna, tendência que mostra pontos positivos, nomeadamente do ponto de vista económico e da resolução das necessidades específicas de cada instituição.

Os dados revelam ainda uma hegemonia dos sistemas operativos Microsoft, que acumulam 67% das respostas dos inquiridos. No que diz respeito às bases de dados utilizadas, foi detectada uma grande hegemonia das bases de dados Oracle (71%), em detrimento das bases de dados Access (29%).

Na investigação sobre a previsão da aquisição de novas aplicações deste tipo, cerca de metade dos elementos da amostra (46%) referiu planear a aquisição de uma nova aplicação dentro de um a três anos.

Actualizar aplicações já existentes

Todavia, para estas instituições, que opções considerarão mais desejáveis na aquisição de novo software? De facto, não são as alternativas comerciais as mais preferidas pelos inquiridos, que apontam na sua maioria (46%) como melhor opção para a implementação de um novo sistema informático uma actualização da aplicação já existente com novas funcionalidades, aos quais se podem somar os 8% de inquiridos que apontam uma aplicação desenvolvida pela equipa interna como a melhor solução. Todavia, 34% da amostra revelou que as aplicações comerciais proprietárias são a melhor opção, o que contrasta com uma minoria de 4% que acredita nos benefícios do software livre na área da saúde.

Quanto à existência de um sistema de gestão integrada da informação clínica e administrativa, os resultados do estudo permitem concluir que só em 15% dos casos tal se verifica, o que constitui uma percentagem extremamente baixa e que vem sublinhar, uma vez mais, a existência clara de uma fragmentação da informação hospitalar e de uma utilização incorrecta e incipiente das tecnologias da informação por parte das unidades hospitalares públicas portuguesas.

Mesmo sob este cenário, Andreia de Almeida afirma que não vale a pena estabelecer um diagnóstico da situação actual em termos de sistemas de informação hospitalares e delinear problemas sem apontar possíveis resoluções. «Talvez a principal solução se prenda com uma necessidade de centralização do tratamento desta informação, tanto na fase genésica quanto na fase pós-genésica, diminuindo a sua fragmentação, extinguindo os arquivos departamentais espalhados pelos diversos serviços dos hospitais e retirando deles todo o poder decisório face a esta informação, criando-se um arquivo único e centralizado», recomenda a investigadora.

O investimento que tem sido feito nos últimos anos, por si só, não foi suficiente para uma boa gestão dos sistemas de informação, importantíssimos para uma gestão hospitalar eficaz, e consequentemente para a melhoria da prestação dos cuidados de saúde aos utentes. «Cabe, pois, às autoridades competentes o poder decisório de alterar este quadro, claramente negativo, a que foi votada esta informação tão importante e sensível para o Serviço Nacional de Saúde a vários níveis, e acreditar que mesmo com menos recursos é possível uma melhor gestão dos sistemas de informação hospitalares», conclui Andreia de Almeida.


* À atenção do sr. ministro da saúde, o melhor ministro deste governo, mas atenção que os outros são péssimos...


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