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A Venezuela e a cegueira
Na
Venezuela há cerca de meio milhão de portugueses. Se outras razões não
houvesse, esta é suficientemente forte para nos obrigar a olhar a
situação daquele país com pinças. Mas é difícil pedir a um político que
resista à tentação de fazer guerrilha partidária por tudo e por nada.
Assim se explica facilmente a manhã agitada que ontem se viveu no
Parlamento em torno do voto de pesar e de condenação pela morte de
manifestantes na Venezuela.
Ao
elaborarem o texto, PSD e CDS poderiam ter-se cingido à condenação da
violência e ao apelo a uma resolução pacífica. Ao incluírem uma
referência ao reconhecimento do "mandato democrático" de Juan Guaidó,
provocaram a imediata divergência com o BE, PEV e sobretudo PCP. E este
como reagiu? Apresentando um segundo texto que condenava a "nova
operação golpista" e a "campanha de desestabilização e de agressão
contra a Venezuela". Perante a radicalidade da posição pró-Maduro, os
comunistas ficaram a falar sozinhos.
Há
um problema de legitimidade política na posição do autoproclamado
presidente interino. Como há na interferência dos Estados Unidos, sob
uma Presidência pouco recomendável para gerir a crise naquele país. Mas
há, acima da estrita discussão legal sobre a liderança de Juan Guaidó,
um problema de ingovernabilidade que torna insustentável a posição de
Nicolás Maduro. Os venezuelanos encontram-se numa situação sub-humana,
sem acesso a bens essenciais, sem cuidados básicos de saúde, sem
segurança e liberdade de expressão. Dominados pelo medo e pela dureza do
quotidiano.
Há riscos nas tomadas de
posição dos países europeus que, como Portugal, se apressaram a cercar
Maduro? Sem dúvida. Mas com o risco vivem os venezuelanos há muito e
ignorar o desastre humanitário a acontecer debaixo dos nossos olhos é
uma alternativa ainda pior. Manter a fé na suposta legitimidade
eleitoral de Maduro, enquanto o país morre todos os dias, é pura
cegueira ideológica.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
02/02/19
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