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IN "SOL"
05/10/18
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O teatro chegou a Tancos…
A ‘operação encoberta’ em Tancos, revelada pelo Ministério Público, foi a cereja em cima do bolo nas despedidas de Joana Marques Vidal
O enredo dos acontecimentos relacionados com o assalto em Tancos, nos
seus mais recentes episódios, oscila entre o vaudeville e um policial
menor, onde se misturam e confluem disputas de louros e ‘guerras’ de
competências.
Pode ser, também, comparável àquelas telenovelas cuja ação
muda repentinamente de foco para manter cativa a audiência, evitando que
esta se perca na oferta da ‘concorrência’.
Quando parecia quase esgotada a polémica ‘encenação’ que antecedeu a
não recondução de Joana Marques Vidal, eis que Tancos irrompeu em força
no palco mediático, esbatendo não apenas as ressonâncias da mudança da
PGR como o afastamento do juiz Carlos Alexandre da instrução dos
arguidos na Operação Marquês.
O último ato, então, mereceu cobertura inédita, sentando jornalistas e
advogados numa sala acanhada para assistirem ao sorteio eletrónico
(tipo FIFA no futebol…), pasmados diante do ecrã do computador - que se
engasgou por duas vezes, vá lá saber-se porquê...
Dir-se-á que mal se entende o recurso à informática quando bastavam
dois papeis metidos num saco com os nomes dos juízes possíveis, e não
havia «um erro no serviço de comunicações», como aconteceu. Porém, se o
sorteado tivesse sido o juiz ‘não desejado’, como teriam reagido os
advogados dos arguidos face ao ‘engasgamento’ do sistema?
A frase lacónica do juiz Ivo Rosa, a quem o algoritmo contemplou com
a ‘taluda’ de dezenas de volumes encaixotados (que as televisões não se
cansaram de exibir), foi lapidar: «Calhou-me a mim».
Pois calhou. E como o algoritmo não se discute, mesmo quando dá
‘erro’, os ilustres causídicos que tomaram a defesa de Sócrates, Vara,
Salgado e outras ‘notabilidades’ da praça, não tardaram a aliviar-se
perante o afastamento do juiz Carlos Alexandre, como se este fosse o
‘mau da fita’, apostado em infernizar a vida aos clientes que
patrocinam.
Foi neste contexto que voltou à cena o caso de Tancos e a
surpreendente detenção do diretor da Polícia Judiciária Militar, com uma
não menos surpreendente confissão, conforme foi noticiado.
Afinal, a deposição do material roubado num terreno na Chamusca não
terá passado de uma ‘encenação’, montada a pretexto de um ‘acordo de
cavalheiros’ com o alegado autor do desvio, para que este ficasse
impune. Tudo em nome de um alegado «interesse nacional».
Lê-se o relato na imprensa e não se acredita. Como é que uma estrutura das Forças Armadas se prestou a tal papel rocambolesco?
De facto, as trapalhadas à volta de Tancos, desde as incongruências
do ainda ministro da Defesa aos ziguezagues do ainda chefe do
Estado-Maior do Exército, têm alimentado as maiores perplexidades.
Quando se escreveu nesta coluna, em janeiro, sobre o
‘fogo-de-artifício’ a que se entregara o CEME, Rovisco Duarte, ao
«exonerar» em direto cinco comandantes de Tancos «para não perturbar as
averiguações internas sobre o furto de material de guerra» -
reconduzindo-os mais tarde como se nada tivesse acontecido -, não se
imaginaria que, além da inépcia do general, a ‘devolução’ do material
roubado tivesse implicado a cumplicidade da Judiciária Militar e de
militares da GNR de Loulé.
A revelação da ‘operação encoberta’, apurada pelo Ministério Público,
foi a cereja em cima do bolo nas despedidas de Joana Marques Vidal. E
outro sério revés para o prestígio das Forças Armadas.
Há muito que Azeredo Lopes e Rovisco Duarte deveriam ter renunciado
às funções - ou serem forçados a fazê-lo -, retirando as consequências
de um roubo improvável que afetou a confiança na instituição militar.
Mas tanto um como outro ‘assobiam ao cochicho’, como se Tancos fosse
um fait-divers, já esquecidos da gravidade que atribuíram inicialmente
ao roubo e ao alarme social que causou.
Há muito ainda para investigar. No mínimo, parece pouco verosímil,
por exemplo, que o alegado autor do furto tenha agido sozinho,
conseguindo apropriar-se de um vasto arsenal, de uma só vez, sem contar
com cumplicidades dentro e fora da unidade.
Não é inédito o desaparecimento de armas e munições. Ainda há dias os
fuzileiros perderam uma caixa com mil munições, que ficou caída na
estrada sem que dessem por isso, valendo um automobilista acidental que
entregou o ‘achado’ à Polícia.
Verificada a negligência, mais estranho ainda foi o facto de quem
recebeu o material nos paióis não se ter apercebido da caixa em falta.
Pelos vistos, anda tudo ao deus dará…
Se nada disto abala o poder instalado, onde as esquerdas se calam e
as direitas consentem, o país poderá interrogar-se com legitimidade
sobre a ‘encenação’ que se segue.
Quanto a António Costa, tem razões para sorrir, como na recente
entrevista à TVI, perante dois entrevistadores que devem ter seguido o
guião à risca…
IN "SOL"
05/10/18
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