ESTA SEMANA
NA "SÁBADO"
Advogado prepara terramoto na justiça
Acusado de corrupção no processo que envolve o ex-vice presidente de Angola, Paulo Amaral Blanco denuncia Daniel Proença de Carvalho, o presidente do Banco Atlântico, Carlos Silva, e indica Marcelo Rebelo de Sousa como testemunha
O
processo em si já é sensível: está em causa uma suspeita de corrupção
de um antigo procurador do Ministério Público, em que o corruptor activo
é Manuel Vicente, antigo vice-presidente de Angola. Entre os dois,
segundo a acusação do Ministério Público, houve um intermediário: Paulo
Amaral Blanco, advogado de Vicente, e também acusado por corrupção. A
dois meses do início do julgamento (28 de janeiro de 2018), Paulo Blanco
contestou a tese do MP, colocando no centro da sua defesa dois
personagens: o advogado Daniel Proença de Carvalho, que já reagiu, e o presidente do Banco Privado Atlântico (BPA), Carlos Silva.
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É
preciso recuar um pouco para se apanhar o fio à meada desta história:
em resumo, segundo o Ministério Público, Orlando Figueira, enquanto
procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal,
arquivou dois processos relativos a Manuel Vicente a troco de
contrapartidas financeiras. Estas passaram por um emprego no Banco Best,
ligado ao BCP que, por sua vez, é controlado pela empresa angolana
Sonangol, e por facilidades de crédito junto do Banco Atlântico.
Em
causa na Operação Fizz estão alegados pagamentos de Manuel Vicente, no
valor de 760 mil euros, ao então magistrado do Departamento Central de
Investigação e Acção Penal (DCIAP) para obter decisões favoráveis.
Em junho deste ano, a juíza Ana
Cristina Carvalho confirmou os crimes constantes na acusação e decidiu
mandar para julgamento Manuel Vicente por corrupção activa em co-autoria
com Paulo Blanco e Armindo Pires, branqueamento de capitais em
co-autoria com Paulo Blanco, Armindo Pires e Orlando Figueira e
falsificação de documento com os mesmos arguidos.
Orlando
Figueira está pronunciado por corrupção passiva, branqueamento de
capitais, violação de segredo de justiça e falsificação de documentos, o
advogado Paulo Blanco por corrupção activa em co-autoria, branqueamento
também em co-autoria, violação de segredo de justiça e falsificação
documento em co-autoria.
A
acusação situa o papel de Paulo Blanco como intermediário. Só que,
depois de dispensado pela Ordem dos Advogados do sigilo profissional,
aquele advogado relatou, na defesa entregue ao tribunal que o irá
julgar, outra versão dos acontecimentos.
A
aproximação entre Orlando Figueira e Angola terá ocorrido, segundo a
versão de Paulo Blanco, primeiro numa viagem àquele país juntamente com o
procurador Vítor Magalhães e, posteriormente, num almoço entre o
próprio, Carlos Silva e Orlando Figueira, no Hotel Ritz, em Lisboa. Um
encontro que terá ocorrido após uma audição no DCIAP do presidente do
Banco Atlântico com o procurador Rosário Teixeira, no âmbito de um
processo que este investigava.
Curiosamente,
segundo Paulo Blanco, o procurador, que recentemente acusou José
Sócrates, optou por não notificar formalmente Carlos Silva para o ouvir
como testemunha, mas através solicitou um contacto através do então
colega, Orlando Figueira. "O arguido nunca, até hoje, percebeu o real
intuito do dr. Rosário Teixeira na realização da citada diligência nas
referidas circunstâncias", referiu a defesa de Paulo Blanco.
Terá
sido durante esse almoço que Orlando Figueira fez saber a Carlos Silva
estar "na inteira disponibilidade" de ir trabalhar para Angola,
manifestando o desejo de sair da magistratura, resolver o problema do
divórcio com a mulher e começar uma nova vida com uma colega
procuradora. Carlos Silva terá manifestado interesse na contratação dos
seus serviços, uma vez que um director do banco em angola estaria de
saída devido a um problema pessoal, em Portugal.
Só
que, no início de Janeiro de 2012, o activista angolano Rafael Marques
terá prestado declarações num processo, envolvendo o Banco Atlântico.
"Tendo tomado conhecimento de tal facto, Carlos Silva decidiu que nenhum
dos bancos poderia contratar Orlando Figueira, aparecendo" com a
sociedade Primagest que "é um mero veículo do BPA". Paulo Blanco admitiu
apenas ter ajudado Orlando Figueira na elaboração do contrato-promessa
de trabalho com um banco, que acabou por não acontecer, e na resolução
de alguns aspectos relativos ao divórcio.
"O
arguido", refere, "não teve qualquer intervenção no contrato de
trabalho" com a Primagest, que segundo a acusação foi a formalidade
necessária para fazer chegar dinheiro ao antigo procurador, "nem no
acordo de revogação", o qual, segundo lhe terá transmitido Orlando
Figueira, "foi elaborado por Daniel Proença de Carvalho".
Este
último advogado volta a aparecer na defesa de Paulo Blanco no chamado
"caso EDIMO", que envolveu suspeitas de fraude fiscal da empresa ligada
ao enteado de Manuel Vicente. O advogado refere ter rejeitado "a oferta
de serviços" de Orlando Figueira, já fora da magistratura do MP,
"recusando também a encomenda, compra e comissões na obtenção de
pareceres jurídicos, Orlando Figueira levou Andre Navarro (gestor do
BPA) e Daniel Proença de Carvalho" a retirarem-lhe a defesa da empresa.
Contactado pela SÁBADO, Daniel Proença de Carvalho não quis prestar
nenhum esclarecimento sobre este caso.
O
nome de Proença de Carvalho volta a ser citado na defesa de Paulo
Blanco, quando este refere que, certo dia, Orlando Figueira lhe contou
que, além da ligação profissional ao BPC, "estava a colaborar
profissionalmente com o BPA, interagindo em Lisboa com André Navarro e
Daniel Proença de Carvalho".
Em
jeito de conclusão, Paulo Blanco critica o Ministério Público por ter
disparado na direcção errada: "Está espelhada no inquérito a identidade
do autor do convite para o procurador Orlando Figueira abandonar a
magistratura do MP"; "Está declarado no inquérito quem interveio na
formalização e celebração do contrato promessa de trabalho, do contrato
de trabalho e na sua revogação"; "Está demonstrado que o arguido não
interveio nesses momentos da vida do procurador Orlando Figueira"
Marcelo Rebelo de Sousa testemunha
O
Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, é uma das testemunhas
abonatórias indicadas por Paulo Blanco, juntamente com Fernando Seara,
professor de Direito e advogado.
Porém,
é no rol das testemunhas com eventual conhecimento directo dos factos
em causa no processo que se encontra um desfile de magistrados: Carlos
Alexandre e Ivo Rosa, juízes do Tribunal Central de Instrução Criminal,
Cândida Almeida, ex-directora do DCIAP, onde correram vário processos
ligados a figuras angolanas, Rosário Teixeira, Ricardo Matos, Vítor
Magalhães, Elisa Santos e Teresa Sanchez, procuradores daquele
departamento, João Maria de Sousa, procurador-geral de Angola, Luís
Neves, director da Unidade Nacional Contra-Terrorismo da Polícia
Judiciária, Orlando Nascimento, presidente do Tribunal da Relação de
Lisboa, Carlos Amaro e Paula Lourenço, advogados, Carlos Silva,
presidente do BPA e Daniel Proença de Carvalho, entre outros advogados,
magistrados e gestores.
* A notícia é o preâmbulo dum enredo digno de telenovela.
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