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HOJE NO
"JORNAL DE NEGÓCIOS"
Porque somos pouco produtivos?
Ter empresas pequenas não ajuda
Portugal é um país pouco produtivo e, segunda uma análise do Conselho das Finanças Públicas, um dos motivos para isso é a pequena dimensão das suas empresas. Um obstáculo que os governos podem ajudar a corrigir.
Este texto começa sem grande novidade: Portugal é um país pouco
produtivo. Certamente já ouviu isso mais do que uma vez. A novidade pode
ser explicar-lhe os motivos. Um deles, explorado numa recente
publicação do Conselho das Finanças Públicas (CFP), é a pequena dimensão
das empresas portuguesas.
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O autor do texto, Bruno Trancoso da Rocha, explora a possibilidade de "uma
possível conexão entre a composição do tecido empresarial português e o
frágil desempenho da produtividade agregada na economia portuguesa nos
últimos 15-20 anos". O facto de Portugal ter um peso tão grande de
microempresas traduz-se numa produtividade mais limitada.
Talvez
seja útil em primeiro lugar explicar o que é ser produtivo. Por vezes,
são utilizadas definições diferentes. Neste caso, fala-se de PIB por
hora trabalhada. Aquilo que se consegue produzir no tempo em que se
trabalha. A produtividade portuguesa equivale a cerca de 68% da média da
União Europeia e cerca de metade de países como França e Dinamarca. A
análise da instituição liderada por Teodora Cardoso nota que, entre 1995
e 2014, a produtividade total dos factores andou a passo de caracol,
com um crescimento médio de 0,03% ao ano.
"A continuação de
um regime de crescimento reduzido da produtividade traduz-se no longo
prazo em baixo crescimento económico, o que constitui um obstáculo à
sustentabilidade das finanças públicas, resultando nomeadamente no
enquistamento de pressões sobre a receita fiscal e dificultando, assim, a
criação do espaço orçamental necessário para o desenvolvimento de
políticas e investimentos públicos", refere o autor.
Existem vários motivos para esta evolução débil. O CFP concentra-se
num deles: a pequena dimensão das empresas nacionais, quando comparada
com outros países. Os últimos dados que permitem uma comparação europeia
são de 2014 e mostram que Portugal tem quase 42% dos seus trabalhadores
em microempresas (grupos com menos de dez pessoas). Muito acima da
média de 30% da União Europeia e apenas superado pela Grécia e por
Itália. Este maior peso das microempresas ocorre em quase todos os
sectores, com destaque para o comércio, onde quase 51% do emprego esta
nessas empresas, o que compara com 36% na média da UE.
Por
contraste, menos de um quarto dos trabalhadores portugueses está
empregado numa grande empresa (mais de 250 pessoas ao serviço), enquanto
na UE são mais de um terço (22,6% vs. 33,7%).
As empresas
portuguesas são pequenas e têm perdido dimensão. Entre 1986 e 2008,
passou de mais de 15 trabalhadores por empresa para menos de dez. Uma
tendência que, sugerem os dado do INE, terá continuado a acentuar-se nos
últimos anos. Uma empresa exportadora tem hoje, em média, 27,4
empregados, as outras integram 5,9.
"As empresas com dez ou mais pessoas ao serviço são em média
consideravelmente mais produtivas do que as microempresas, o que sugere
que uma trajectória de atenuação da concentração de recursos em
microempresas levaria, em princípio, a ganhos de produtividade", escreve
Bruno Trancoso da Rocha, acrescentando que se as empresas mais
pequenas dessem lugar a outras maiores isso também poderia ajudar as
exportações.
Regulação e maus gestores
Chegados
a este ponto, importa reflectir sobre os obstáculos que impedem o
crescimento das empresas portuguesas. O CFP identifica algumas
possibilidades, sugerindo que parte desses travões pode ser corrigida ou
atenuada por políticas públicas.
O documento nota que as
regulações existentes actualmente constituem um desincentivo ao
crescimento das empresas. Entre essas regulações estão subsídios,
benefícios fiscais, legislação laboral e regras ambientais. "Estas
regras e políticas são frequentemente criadas com o intuito de
favorecer as empresas mais pequenas e/ou estimular o empreendedorismo;
no entanto podem operar, em determinadas situações, como uma forma de
"imposto implícito" sobre a escala empresarial, constituindo um
incentivo para as empresas não crescerem tanto como poderiam", refere a
análise do CFP.
A lentidão da
justiça portuguesa é outro problema. Estudos apontam para uma relação
entre a eficiência do sistema judicial e a dimensão média das empresas.
Por exemplo, um estudo feito em específico para Itália conclui que uma
redução de 10% do tempo médio dos processos em tribunal resultaria num
aumento de 2% do número de trabalhadores nas empresas. Se há país com
problemas nesta área é Portugal. Entre 22 países europeus, Portugal tem a
segunda justiça mais lenta, com um tempo médio de resolução de
processos não criminais de 710 dias face a uma média europeia de 217
dias.
Outro factor menos
discutido é a qualidade da gestão. O nível de formação dos gestores
portugueses é baixo quando comparado com outros países avançados: mais
de dois terços têm nove ou menos anos de escolaridade (nos EUA, por
exemplo, apenas 14% está nessa situação). Um estudo do ano passado de
Francisco Queiró conclui que "uma parte substancial das diferenças no
crescimento das empresas portuguesas é atribuível a diferenças na
educação dos gestores". Mais qualificações podem significar maior aposta
em novas tecnologias, práticas mais avançadas de gestão e de recursos
humanos.
O texto do CFP admite que existirão
certamente outros factores que favorecem um tecido empresarial composto
por empresas mais pequenas, como a estrutura de financiamento, a
instabilidade de acesso ao crédito tenham relevância. Outro incentivo
pode ser a tentação pela informalidade que uma dimensão menor favorece.
O
autor argumenta que solução não deverá ser eliminar as barreiras à
entrada. Essas medidas podem ser úteis, mas são insuficientes e pouco
eficazes. Em vez disso, favorece a criação de programas que apoiem
empresas de elevado crescimento e mais produtivas, embora admita que os
benefícios dessas medidas ainda não são claros, a sua execução é
complexa e envolve uma escolha de vencedores/perdedores, que pode ser
problemática.
"A remoção de entraves ao crescimento das
empresas deve constituir um vector essencial do articulado de políticas
necessário para aumentar a eficiência da economia enquanto sistema de
afectação de recursos", conclui Bruno Trancoso da Rocha.
* A ponderar...
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