Reformas antecipadas,
progressão nas carreiras
e greve dos professores
Seria obviamente possível reduzir a idade de reforma, reduzindo
simultaneamente o valor do pensão. Será que é isso que os portugueses
desejam com os salários relativamente baixos que auferem?
1. O tribunal arbitral decidiu, e bem, em relação
à anunciada greve de professores na quarta-feira, dia de exames
nacionais do 11º ano (e de provas de aferição do 2º ano), que haverá
serviços mínimos. Os sindicatos protestaram, mas sem razão. Existe um
direito à greve, mas existe também um direito à educação (e avaliação) e
em caso de conflito há mínimos que devem ser assegurados.
Um exame
nacional é algo bastante stressante para os estudantes e suas famílias. O
exame do 11º ano conta para a média de entrada no ensino superior pelo
que essa pressão ainda é maior e pode haver agora alunos do 12º a fazer
melhoria de nota. Assim, a greves em dias de exames digo claramente: não
obrigado! E estou convicto que essa é a opinião da esmagadora maioria
dos portugueses.
As motivações para esta greve são sobretudo duas. Uma que os
sindicatos sabem que não é exequível, mas que tem grande apoio na classe
dos professores do básico e secundário (a antecipação da idade de
reforma sem penalizações) e outra, que será objeto de negociação
política aquando do Orçamento de Estado em Novembro, que é o das
progressões nas carreiras.
Nos últimos anos tem havido várias petições para que se crie um
regime de excepção de aposentação para os docentes do ensino não
superior, a última, já deste ano 2017, (a 253/XIII/2),
em processo de apreciação, com 19676 signatários solicitando um regime
de excepção para docentes com 60 anos de idade e 36 de serviço. Em 2016 a
FENPROF apresentou uma petição (32/XIII/1)
com 27977 assinaturas, que levou a dois projetos de resolução de
iniciativa do PEV e do PCP que não foram aprovados, tendo a oposição de
PS, PSD e CDS.
Não deixa de ser curioso a forma “em silos” com que funciona a
Assembleia da República. Como é aposentação de professores, é enviado à
Comissão de Educação, como se a Comissão do Trabalho e Segurança Social
(CTSS) e a Comissão de Orçamento e Finanças (COFMA) nada tivessem a ver.
Logicamente são pedidos pareceres essencialmente a organizações de
professores que, como seria de esperar, apoiam a medida. Não é de
estranhar que quando se pergunta a um universo um pouco diferente, o sindicato dos quadros técnicos do Estado,
a resposta já venha com uma nuance: nada a opor “no entanto
consideramos desejável que a criação de um regime de aposentação mais
justo para os docentes, ora peticionado, seja enquadrado num debate mais
abrangente sobre os regimes de aposentação e reforma”. E se o pedido de
parecer fosse feito a entidades do sector privado a resposta seria
provavelmente diferente. É evidente que a discussão deve partir do geral
para o particular e não iniciar-se e terminar no caso dos docentes.
2. Começar pelo geral é antes do mais reconhecer que
Portugal é dos países europeus em que a idade estatutária de reforma é
das mais elevadas, mas também onde o rácio da primeira pensão sobre o
último salário é mais elevado.
A sustentabilidade da segurança social,
com o aumento da esperança de vida e do rácio de dependência dos idosos,
exige um equilíbrio entre os vários parâmetros do sistema. Seria
obviamente possível reduzir a idade de reforma, reduzindo
simultaneamente aquele rácio, logo o valor do pensão.
Será que é isso
que os portugueses desejam com os salários relativamente baixos que
auferem? Tudo indica que não pois houve em 2016 muito menos pessoas a
solicitarem a aposentação do que previsto pelo governo. Uma das razões
estará decerto na existência de simuladores de pensão para trabalhadores
inscritos na CGA e na segurança social.
Apesar de a partir de trinta anos de descontos e 55 anos de idade ser
possível pedir a aposentação, o corte na pensão, devido à antecipação, é
significativo e isto tem levado a cada vez mais pessoas trabalharem até
à idade estatutária. A antecipação com corte a partir dos 55 é prática
corrente noutros países (ver aqui o caso do Reino Unido).
Indo agora ao caso particular dos docentes, as razões de uma excepção
ao regime geral, prendem-se, segundo os próprios, a um desgaste físico e
psicológico excessivo a partir de certa idade e tempo de serviço.
Outras profissões, decerto que poderão dizer o mesmo, em particular
médicos ou enfermeiros que têm de fazer bancos de urgência. Porém,
reconheço que docentes, em particular educadores de infância e
professores em monodocência no primeiro ciclo do básico, seja muito
complicado e extenuante lidar, em idade avançada, com crianças,
sobretudo porque, ao contrário de professores de outros ciclos, não
podem, ou é mais difícil, reduzir a carga lectiva com o tempo de
serviço. Esta situação não é um problema especificamente nacional e
devemos olhar para as melhores práticas internacionais. Flexibilidade,
ajustamentos aos horários lectivos e mobilidade na função pública para
outras funções, pode permitir responder senão total, parcialmente, a
algumas das preocupações dos professores sem criar iniquidades e
injustiças com outros trabalhadores em funções públicas e com os do
privado.
Finalmente, para as progressões nas carreiras, é também uma questão
que tem de ser discutida no quadro geral do descongelamento progressivo
das carreiras na função pública e do envelope financeiro que a ele
estará associado em sede de Orçamento de Estado. Não me parece existirem
condições de definir com rigor qual será esse envelope financeiro pelo
que me parece prematuro que haja compromissos financeiros entre
Ministério da Educação e sindicatos.
IN "OBSERVADOR"
20/06/17
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