Marcelos para todos
Marcelo Rebelo de Sousa é um homem muito
inteligente. E divertido. Tem sempre histórias e coscuvilhices para
contar (mentira ou verdade, que importa), observações contundentes e
avaliações certeiras para fazer, tudo embrulhado naquela expressividade
conspirativa que relampeja malícia. Sim, é difícil não gostar de Marcelo
- pelo menos de um deles.
E tantos há à
escolha. Do homem que em 2010 foi a uma manifestação contra o casamento
das pessoas do mesmo sexo fazer companhia a Isilda Pegado e PNR
reclamando um referendo ao que nesta semana, no debate com Marisa
Matias, asseverou que sendo presidente promulgaria o diploma da adoção
por casais do mesmo sexo porque o importante, explicou, é assegurar o
bem-estar das crianças, sejam os pais adotivos dois, um, de sexo
diferente ou igual, devendo a decisão ser técnica.
Do
homem que em 1998 defendeu - e conseguiu que fosse para a frente - um
referendo para decidir se o aborto por vontade da mulher deveria
continuar a ser crime, fez campanha pela manutenção desse crime e se
congratulou com a vitória, ao homem que no referendo de 2007 veio dizer
que nunca quis ver mulheres na prisão e que não concordava com os termos
da pergunta (os mesmos da de 1998, que aprovou).
OK:
evolui bués, Marcelo. E logo nas matérias normalmente caracterizadas
(inclusive por ele) como "de consciência". Já nas outras como será?
Vejamos por exemplo o caso do pedido de fiscalização de
constitucionalidade dos cortes dos subsídios de férias e de Natal de
pensionistas e funcionários públicos inscritos no OE 2012, a medida mais
simbólica da era austeritária PSD-CDS. No citado debate com Marisa,
negou ter criticado o pedido; mas em janeiro de 2012, na TVI, tinha sido
claríssimo na sua censura aos deputados do PS que o assinaram e na
certificação de que o TC jamais decretaria a inconstitucionalidade de um
OE: "Não lembra ao careca", disse.
É
verdade que quase se ia safando de ser confrontado com a contradição
(anda tudo, media e campanhas adversárias, muito preguiçoso), mas das
duas uma: ou no seu afã de fazer a corte à esquerda (e portanto de dar
razão a quem lhe chamou cata-vento) mentiu deliberadamente ou não se
recorda do que pensava e defendia há três anos. Lelé da cuca ou
mentiroso: que bela opção. Vale que, se se confirmar a caminhada
triunfal prenunciada nas primeiras sondagens, só o sofreremos um
mandato. Foi ele que o jurou em 26 de janeiro de 2014 na TVI: "Deixo
essa sugestão para os futuros candidatos presidenciais, que proponham
aos partidos, porque têm de ser eles a rever a Constituição, que reduzam
no futuro o mandato apenas a um, e não dois, mais longo, de seis anos
ou sete anos, e, no caso de isso não acontecer, que assumam o
compromisso de serem só por um mandato. Porque mais do que cinco anos,
está provado, a meu ver, é mau." Olha que bom. A não ser que - oh,
bolas, é o Marcelo.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
08/01/16
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