HOJE NO
"OBSERVADOR"
"OBSERVADOR"
Portugal na Grande Guerra.
Desnorte, doença e descalabro
A propaganda e os manuais escolares do Estado Novo inculcaram em
gerações de portugueses uma história pátria seriamente deformada, em que
os portugueses vencem sempre ou, se são derrotados, é apenas num
combate desigual perante circunstâncias terrivelmente adversas e forças
inimigas largamente superiores em número e equipamento e, ainda assim,
lutando com galhardia até ao último alento. É uma visão patrioteira e jactanciosa, que tem por base a crença no excepcionalismo lusitano,
como se os portugueses fossem uma raça superior e como se pouca coisa
acontecesse no mundo em que Portugal não tivesse influência
determinante.
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Após uns anos de olvido, esta mundivisão
lusocêntrica e gabarolas foi regressando, pouco a pouco, às obras de
divulgação histórica e parece hoje bem implantada, a julgar por uma vaga
de livros de sucesso como Histórias secretas de reis portugueses, de Alexandre Borges, Histórias rocambolescas da História de Portugal, de João Ferreira, Vidas surpreendentes, mortes insólitas da História de Portugal, de Ricardo Raimundo, ou Grandes exploradores portugueses, de Susana Lima.
A exaltação patrioteira atinge o clímax em As batalhas que mudaram Portugal,
de Susana Lima, que consegue fazer do inglório esmagamento de uma débil
divisão portuguesa na batalha de La Lys, a 9 de Abril de 1918, um
episódio heróico. Lima chega a afirmar que, em La Lys, “a
coragem lusa sairia cara ao inimigo, que não se conseguiria recompor a
tempo de vencer a I Guerra Mundial”, o que equivale a defender que foi a
resistência que Viriato opôs às legiões romanas que, em última análise,
causou a queda do Império Romano.
Portugal quer um lugar na guerra
Não há motivo de orgulho no desastre de La Lys, tal como não o há em
praticamente aspecto algum da participação portuguesa na I Guerra
Mundial, que foi, desde o princípio um terrível equívoco.
Portugal
não entrou na guerra para honrar a “Velha Aliança” com Inglaterra –
pelo contrário, os britânicos, cientes da debilidade das nossas forças
armadas, começaram por rejeitar as propostas do governo da jovem
República Portuguesa, que via a participação no conflito como uma forma
de obter legitimação internacional.
Filipe Ribeiro de Meneses, em A Grande Guerra de Afonso Costa, acabado de publicar pela D. Quixote, considera que “Portugal,
país pequeno com um grande e apetecível património colonial por
consolidar, não podia ficar arredado da contenda”, sob pena de ver-se
espoliado das colónias após o final da guerra.
Além disso,
realça Menezes, “no imaginário intervencionista a guerra europeia
ultrapassava as questões materiais; representava o ensejo de inverter a
decadência nacional, devolvendo ao país o prestígio há muito perdido e
conduzindo ao reconhecimento pelas potências europeias como uma entidade
viva, claramente distinta de Espanha e capaz de se afirmar na cena
mundial”.
* Somos gabarolas e isso só nos prejudica.
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