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"PÚBLICO"
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Tirar nacionalidade por crimes de
. terrorismo deixa França em guerra
. terrorismo deixa França em guerra
O Presidente da República, François Hollande, e o primeiro-ministro
francês, Manuel Valls, nem querem ouvir falar em críticas e contestação,
mas é cada vez maior a polémica em torno do seu projecto de retirada da
nacionalidade francesa a todos os cidadãos com dois passaportes que
estejam envolvidos em casos de terrorismo – e que está a dividir os
membros do Governo e a abrir um fosso nas fileiras socialistas.
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A
proposta integra o pacote de medidas de segurança, com implicações
constitucionais, que foram anunciadas no rescaldo dos atentados
terroristas em Paris a 13 de Novembro, que mataram 130 pessoas.
Num
emocionado discurso ao Congresso no palácio de Versalhes,
o Presidente François Hollande lembrou aos deputados e senadores que
França vivia sob um novo regime de excepção, que justificava a ampliação
de poderes extrajudiciais.
Uma das reformas previstas, nesse
quadro excepcional que prevê a condução de buscas sem mandado judicial, é
a de retirar a nacionalidade a todos os cidadãos que tenham outro
passaporte além do francês e que sejam condenados por crimes ligados à
segurança do Estado. Em França, há cerca de 3,3 milhões de pessoas com
dupla nacionalidade – esse era o caso de vários dos terroristas que
participaram nos ataques de Paris.Segundo
explicou Hollande, trata-se de uma punição reservada aos que, não sendo
exclusivamente franceses, agem contra a segurança e os interesses do
país, “atraiçoando os valores da República”.
Mas para
muitas figuras proeminentes do Partido Socialista, aquilo que o projecto
do Governo atraiçoa é a ideologia e os valores da esquerda. “De tanto
querer roubar o protagonismo à extrema-direita, o Governo arrisca-se a
pôr em prática todo o seu programa”, censurou o deputado Pascal Cherki,
um dos “rebeldes” da bancada socialista na Assembleia Nacional.
Ministra da Justiça contra
O
ex-primeiro-ministro Jean-Marc Ayralt também lamentou a ideia de
revogação da nacionalidade de cidadãos nascidos em França – uma proposta
que a ministra da Justiça, Christiane Taubira, criticou publicamente e
descreveu como divisiva e discriminatória. “Coloca problemas em termos
de direitos fundamentais assegurados com o nascimento”, disse, em
referência às garantias de igualdade perante a lei, independentemente de
raça, género, origem ou religião.
Porém, a barragem de crítica e
oposição não emocionou nem demoveu o primeiro-ministro Manuel Valls, que
pretende fazer aprovar a legislação em Fevereiro (para tal, precisa de
três quintos dos votos nas duas câmaras do Parlamento). “O Governo não
desistiu da proposta de autorização da revogação da nacionalidade a
todas as pessoas com dupla nacionalidade”, informou. “Mas o âmbito desta
provisão é limitado, uma vez que apenas se aplica a pessoas que tenham
sido condenadas por um juiz por crimes contra a nação, que incluem
crimes de terrorismo”, precisou.
Como outros países,
a legislação francesa já contempla a possibilidade de revogação da
nacionalidade, mas apenas no caso de cidadãos nascidos no estrangeiro e
que requereram a naturalização. E mesmo nesses casos, a revogação só é
automática se forem condenados por um crime, se ainda não tiveram
passado dez anos da naturalização e se continuarem a deter a
nacionalidade original.
Opinião pública a favor
O
Governo acredita ter a opinião pública do seu lado, e as sondagens
dão-lhe razão. Quase nove em cada dez franceses apoiam a proposta do
Governo: 86% dos inquiridos pela empresa Elabe para o canal BFM-TV
disseram concordar com o plano de Hollande, que para 67% não entra em
contradição com os “valores da esquerda”.
No lado oposto do
espectro político, o projecto é bem-vindo. A líder da Frente Nacional,
Marine Le Pen, até reivindicou o crédito pelas reformas constitucionais
anunciadas por Hollande, escrevendo no Twitter que a “retirada da
nacionalidade é o primeiro resultado concreto dos 6,8 milhões de votos
depositados [no partido de extrema-direita] nas eleições regionais”.
Para
quem discorda dela, a medida representa uma facada nos princípios
fundamentais consagrados na Revolução Francesa, nomeadamente o droit du sol,
que concede a todos aqueles que nascem no país o direito à
nacionalidade. Em 2011, o então Presidente Nicolas Sarkozy propôs
revogar esse direito a todos os criminosos violentos – perante a feroz
oposição dos socialistas.
Patrick Weil, um reputado historiador e
cientista político que é conselheiro do Presidente, pediu a François
Hollande para desistir da ideia, que a ser aplicada tornaria França “na
primeira democracia do mundo a inscrever na sua Constituição o princípio
da desigualdade de tratamento”, escreveu. A proposta, considera, ameaça
a coesão social e “introduz a ideia de punição diferente para o mesmo
crime, com base na circunstância do nascimento. Que haja pessoas (que
muitas vezes nem sabem que detêm uma segunda nacionalidade) que possam
simplesmente ser banidas da sociedade é um retrocesso”, considerou Weil,
que ensina na universidade norte-americana de Yale.
A presidente
da câmara de Paris, Anne Hidalgo, classificou o efeito prático da
medida, em termos de combate ao terrorismo como “irrelevante”. Já o
efeito simbólico e político da sua aprovação será tremendo, observou:
fazendo eco da opinião de historiadores e comentadores, a autarca disse
que a proposta de Hollande e Valls evoca períodos menos “felizes” da
História francesa, como quando o regime colaboracionista de Vichy
retirou a nacionalidade a milhares de judeus e outros cidadãos
estrangeiros, em plena Segunda Guerra Mundial.
* Uma proposta absurda e xenófoba. Os cidadãos que cometem crime são julgados em tribunal, uma garantia do "Estado de Direito".
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