A Cidade da Luz
está a perder o brilho
A ameaça do terrorismo e a crise migratória juntamente com a
atual crise económica e social formam os principais desafios de
segurança do nosso continente. Em Portugal, não temos vivido de perto o
drama do terrorismo, nem o drama migratório. Contudo, estas ameaças
existem e dizem respeito a todos nós, do norte ao sul da Europa, dos
mais pobres aos mais ricos países europeus.
Prova viva desta realidade é a crescente degradação social que a
monumental cidade de Paris tem vindo a evidenciar ao longo dos últimos
anos. Um dos mais prestigiados centros mundiais de cultura e arte, com
os museus mais proeminentes do mundo, uma riquíssima história reflectida
em cada rua, em cada edifício, em cada monumento, perde-se no meio de
uma poluição sonora e visual opressiva, num crescimento demográfico não
controlado, adensado por uma multidão de turistas, vendedores
itinerantes e indigentes sem abrigo que todos os dias invadem a cidade
da luz em busca ávida e descontrolada, quase em jeito de saque, das suas
riquezas económicas e culturais.
Após o atentado ao jornal satírico Charlie Hebdo e o recente ataque
frustrado no comboio Thalys Paris-Bruxelas, forças militares
antiterroristas substituíram os tradicionais polícias nas ruas de Paris,
alterando por completo a imagem de “vie en rose” da cidade, em
reflexo da necessidade de uma proteção civil reforçada perante as
ameaças imprevisíveis e potencialmente mortíferas.
Esta situação tem vindo a complicar-se mais ainda nos últimos meses,
devido ao súbito e contínuo aumento do número de imigrantes e refugiados
que estão a entrar no espaço da UE. Segundo a Agência da ONU para os
Refugiados, apenas no mês de outubro entraram na Europa quase 218.400
refugiados, tanto quanto a totalidade de refugiados que chegaram às
praias do sul da Europa ao longo de todo o ano de 2014.
A França já tomou várias medidas para o acolhimento de um número
significativo de refugiados e apoia e integra iniciativas europeias
visando implementar mecanismos de gestão e recolocação dos migrantes nos
locais de entrada críticos (hotspots), promover a intervenção
de brigadas de proteção civil e equipas de intervenção rápida nas
fronteiras, contra as redes criminosas de tráfico de migrantes, e também
intensificar a cooperação com países terceiros neste domínio.
Em termos orçamentais, a União tem vindo a aumentar o seu apoio
financeiro para a rápida resolução da crise. O financiamento de
emergência disponível no orçamento da UE neste domínio já foi duplicado
este ano, atingindo um montante de 73 milhões de euros, que entretanto
já se esgotou, forçando a Comissão a propor um incremento em 100 milhões
de euros ainda para este ano de 2015. Igualmente, já está previsto uma
dotação orçamental de 600 milhões de euros para 2016, para apoio de
emergência aos Estados-Membros mais afetados pela crise dos refugiados e
para financiamento dos organismos Frontex, EASO e Europol.
Porém, sob a atual situação caótica e descontrolada da crise
migratória e dos perigos do terrorismo, estas medidas não dão resposta à
questão principal e imediata de como integrar estas pessoas, dando
emprego, educação, saúde, e perspetivas para um futuro melhor,
garantindo ao mesmo tempo a dignidade e estabilidade da própria
sociedade europeia.
Paris é um exemplo vivo das alterações demográficas, sociais e
económicas ameaçadoras que as sociedades europeias têm vindo a sofrer. A
crescente degradação que a glamorosa Cidade da Luz tem evidenciado ao
longo dos últimos anos reflete a falta de um plano político nacional
eficiente e de um projeto europeu credível e articulado, para fazer face
aos atuais desafios de segurança europeia.
A Europa deve agir unida, na base dos seus valores humanistas e
democráticos, acolhendo e integrando estas pessoas, mas num quadro de um
plano pan-europeu abrangente que dê soluções adequadas aos desafios
sociais e económicos imediatos associados à integração de todos estes
refugiados.
Professora universitária
IN "OJE"
[Nota: Artigo publicado a 13 de novembro de 2015, pelas 17h15, horas
antes dos ataques terroristas que assolaram mais uma vez Paris]
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