Cavaco de Rio Maior
Cavaco tem razão. Nunca em 40 anos o PM
indigitado após legislativas deixou de ser o líder da força política
mais votada; os compromissos ratificados pelo país devem ser respeitados
(desde que não ponham o país em causa); a esmagadora maioria dos
portugueses que votaram escolheram partidos europeístas (PSD, PS e
ultimamente também o CDS) que defendem a permanência de Portugal na NATO
e no euro. Sucede também que em 40 anos nunca tinha havido uma maioria
viável da qual não fazia parte a força mais votada. E que a esmagadora
maioria dos portugueses escolheram partidos (PS-BE-PCP) que defendem o
respeito pela Constituição, coisa que da PAF ninguém pode dizer - o que,
estranhamente, não parece preocupar o PR. E não preocupa porque ele
próprio resolveu fazer de conta que a Constituição não existe.
É
que, como toda a gente sabe ou devia saber (anda aí muita a fingir-se
de parva) a Constituição não diz em lado algum que o indigitado tem de
ser o líder do partido mais votado e muito menos que o PR pode colocar
partidos que representam 20% dos eleitores fora do quadro governativo
quando, ainda por cima pela primeira vez - o que um Presidente
democrático e verdadeiramente de todos os portugueses festejaria -, os
partidos em causa querem entrar nele. Entendamo-nos: o acordo entre o
PS, o BE e o PCP apresenta debilidades, sendo a mais notória aquela que
ontem transpirou - BE e PCP não tencionam fazer parte do governo. Opção
pouco compreensível e que denota uma reserva em relação à plena assunção
de responsabilidade que deixa o PS, e um governo PS, numa situação
frágil e perigosa. Se Cavaco tivesse invocado apenas isso como motivo
para escolher indigitar Passos, agregando a esse fundamento o "costume" e
jogando na possibilidade de haver uma cisão no PS, nada a dizer. Mas
Cavaco, invocando os sentimentos dos mercados e "das instituições
internacionais nossas credoras", fez questão de dizer que há no
Parlamento duas forças políticas "intocáveis", às quais não admite
sequer prefigurarem-se como sustentação de um governo.
Ou
seja: Cavaco não usou justificações democráticas e constitucionalmente
sustentadas. Pelo contrário, adotou uma postura autocrática, tornando
claro a uma parte do país que o seu voto e ideias cheiram mal - parte do
país que, curiosamente, serviu para derrubar em 2011 um governo contra o
qual reclamou "um sobressalto cívico". Para Cavaco, BE e PCP só dão
jeito para deitar abaixo governos, nunca para os sustentar. E se os
portugueses decidiram nas urnas virar a página, Cavaco cá está para lhes
emendar a mão. Independentemente da vontade dos eleitores, o homem que
ocupa Belém com a mais baixa votação e pior aprovação de sempre quer
impor a sua, brandindo, como tantos, de Avillez a Barreto, fizeram nos
últimos dias, a sua moca de Rio Maior. Ganha a verdade e a clareza, se
tivéssemos dúvidas. Mas alguém devia lembrar ao PR que quem subiu à
Fonte Luminosa foi o PS, e Costa esteve lá.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
23/10/15
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