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Banco de Portugal
faz contratação polémica
O Banco de Portugal (BdP) tem contratado várias sociedades de advogados, bancos de investimento e consultoras para assessorar a resolução do BES e a venda do Novo Banco. Mas há uma aquisição de serviços recente que pode suscitar dúvidas, pelo potencial conflito de interesses.
O regulador financeiro contratou os
serviços de apoio jurídico da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira para os
processos relacionados com a resolução do BES. Esta é a sociedade que
trabalha com os chineses da Anbang, o primeiro qualificado para negociar
em exclusivo com o BdP a compra do Novo Banco.
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Apesar de o grupo segurador estar para já fora da corrida após o
fracasso das negociações, houve dois contratos com a Cuatrecasas
assinados em junho e julho, meses em que a Anbang se posicionava como
potencial candidato a futuro dono do Novo Banco.
Contrato por três anos
De acordo com o Portal Base – o site onde se encontram todas as
contratações de serviços feitas por entidades públicas –, os advogados
da firma espanhola e portuguesa foram escolhidos por ajuste direto, ou
seja, sem concurso público. É um regime aplicado normalmente em
contratações urgentes. No Portal, o BdP justifica a modalidade com a
“ausência de recursos próprios”.
O objeto do primeiro contrato não é esclarecedor: “Aquisição de
serviços de assessoria e representação jurídicas”. Apesar de ter sido
assinado a 8 de junho, o contrato “reporta os seus efeitos ao período
compreendido entre 5 de janeiro e 31 de março, sem prejuízo das
obrigações acessórias que possam perdurar para além da cessação do
contrato”. O preço contratual máximo é de 45 mil euros.
O âmbito do segundo contrato é mais esclarecedor: “Serviços de apoio
jurídico, designadamente relacionados com o patrocínio forense do Banco
de Portugal no âmbito dos processos instaurados e dos que possam vir a
ser, na sequência das deliberações do conselho de administração
referentes à resolução do BES”. O preço contratual máximo foi fixado em
200 mil euros.
O contrato é válido pelo prazo de três anos e tem efeitos desde 2 de
abril, embora tenha sido assinado apenas a 8 de julho. O momento da
assinatura é um dos pontos que pode causar polémica. Isto porque os
chineses da Anbang já tinham apresentado uma proposta vinculativa à
compra do Novo Banco – a oferta mais elevada entre os três candidatos na
corrida.
Na assinatura de ambos os contratos com o Banco de Portugal, a
Cuatrecasas foi representada pela advogada Maria João Ricou. A sócia
diretora também coordenou as equipas de direito bancário, financeiro e
de mercado de capitais que negociaram a compra do Novo Banco em nome dos
chineses da Anbang, entre 19 de agosto e 1 de setembro.
A incerteza face às contingências futuras pesaram no fracasso das
negociações. A elevada litigância associada à resolução do BES e à venda
do Novo Banco é um risco que os potenciais compradores não estão
disponíveis a correr, sem garantias.
Regulador e advogados negam conflito de interesses
Ao assessorar o regulador bancário em ações judiciais, há o risco de a
Cuatrecasas ter tido acesso a informações privilegiadas no momento em
que estabelecia as condições contratuais oferecidas pela Anbang.
Um advogado contactado pelo SOL considera que esta situação pode
representar um “potencial conflito de interesses”, na medida em que “a
mesma sociedade poderá estar a aconselhar, representar ou agir por conta
de dois clientes com interesses opostos”. O mesmo jurista acrescenta
que os “advogados e as sociedades devem abster-se de aceitar novos
clientes se tal puser em risco o dever de guardar sigilo profissional”
ou se “do conhecimento dos assuntos do novo cliente possam resultar
vantagens ilegítimas para o antigo cliente”.
O estatuto da Ordem dos Advogados refere mesmo que o “advogado deve
recusar o patrocínio de uma questão em que já tenha intervindo em
qualquer outra qualidade ou seja conexa com outra em que represente, ou
tenha representado, a parte contrária”.
Contactada pelo SOL, fonte oficial da sociedade rejeita qualquer
conflito de interesses. “A Cuatrecasas, Gonçalves Pereira não assessorou
nem assessora quaisquer assuntos ou clientes em conflito de
interesses”.
Já para o supervisor financeiro, “não existe qualquer risco de
divergência de interesses, uma vez que, na matéria em questão, os
interesses estão alinhados e são coincidentes quaisquer que seja o
concorrente à compra, tendo-lhes sido oferecidas as mesmas condições no
processo de venda”.
Fonte oficial do regulador justifica que a contratação da Cuatrecasas
deve-se à “necessidade de apoio jurídico especializado relacionado com
questões de contencioso no âmbito do processo de aplicação da medida de
resolução ao BES”.
O site da Cuatrecasas apresenta Maria João Ricou como uma jurista com
“ampla experiência e um profundo conhecimento nos setores bancário,
financeiro e de mercado de capitais”.
Contratação da TC Capital levantou dúvidas
Não é a primeira vez em que as contratações do BdP geram polémica. A
TSF noticiou em Maio que a ‘boutique financeira’ TC Capital, contratada
em outubro de 2014 para assessorar a venda do Novo Banco, é liderada por
Phillipe Sacerdot, amigo de um dos vice-governadores, António Varela.
O regulador reagiu à notícia, esclarecendo que as contratações são
feitas “em pleno respeito pelas regras dos contratos públicos” e são
tomadas por deliberação do conselho de administração, e “não por
qualquer membro do conselho individualmente considerado”.
* Tão transparente, tão transparente que até parece opaco.
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