07/07/2015

RUI TAVARES

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Solidariedade contra
 a chantagem

Os gregos disseram “não”. Contra ventos e marés, com os bancos fechados e as farmácias e supermercados já com problemas de abastecimento, esta foi uma demonstração de coragem e firmeza perante todos os avisos e pressões, chantagens e ameaças, temores e rancores.

Que “não” disseram os gregos? Os gregos disseram “não” à aplicação de mais um pacote de austeridade. Mas o “não” dos gregos não foi sobre a saída do euro ou o afastamento da União Europeia. Só foi possível que o “não” ganhasse, num país em que 80% das pessoas não quer sair do euro nem da União Europeia, porque o Governo grego conseguiu fazer passar a mensagem de que um “não” no referendo não era um “não” ao euro.
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Esta diferença é relevante porque nos próximos dias vamos assistir a uma enxurrada de comentários dizendo que a Grécia voltou costas à Europa. Já começaram, aliás: o social-democrata alemão Sigmar Gabriel afirmou que o Governo grego queimou as últimas pontes com a Europa e o trabalhista holandês Jeroen Dijsselbloem disse que o resultado do referendo condiciona a presença da Grécia no euro. Pouco me surpreende a atitude deste dois porta-vozes da arrogância institucional da zona euro. São eles, e gente como eles, quem voltou as costas à Europa. São eles quem se apresta a sacrificar um país, primeiro, e todo um projeto de paz e democracia para este continente, depois, no altar das regras burocráticas e mecanismos cegos de uma união monetária mal concebida.
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É preciso fazer barragem a esta atitude revanchista e impedir que ela deite a perder aquilo que, apesar de todas as dificuldades e erros, se construiu na Europa das últimas gerações. Dijssebloem e Sigmar Gabriel perderam uma batalha política contra o Governo grego mas não têm o direito de levar a Europa para um buraco por causa disso. Vários governos europeus fizeram o que fez o grego e vários referendos europeus já deram “não” — na Irlanda, na Dinamarca, na França, na Holanda. Em todos os casos se voltou à mesa de negociações e se fizeram concessões para que os países em causa pudessem continuar no projeto europeu. Os gregos não merecem menos do que isso.
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Esta crise pode acabar amanhã se os mais inflexíveis dos governos europeus entenderem que não é possível exigir mais austeridade a uma economia deprimida e a uma sociedade exaurida. Mas é possível salvar a Grécia e a Europa combinando uma moratória imediata do serviço da dívida grega para os próximos dois anos, uma reestruturação das dívidas excessivas dos países da zona euro e um plano de relançamento económico financiado pelo Banco Europeu de Investimentos. Aí sim, será possível reformar o Estado grego — e o Syriza é provavelmente o partido mais bem colocado para o fazer. Onde o eurogrupo dizia: “Condições primeiro e alívio da dívida depois” é preciso dizer “alívio da dívida já para dar condições de reforma depois”.
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Quem ama a democracia e a Europa não pode deixar a Grécia ser empurrada para a porta de saída da União. Quem ama Portugal, já agora, também não. Nas cimeiras extraordinárias que se seguirão nos próximos dias, o Governo português não pode persistir numa atitude de confronto que, sem resolução desta crise, se poderia voltar contra Portugal mais depressa do que se pensa.

IN "PÚBLICO"
05/07/15


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