05/07/2015

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ESTA SEMANA NO
"EXPRESSO"

O que Varoufakis disse na reunião
 que “não orgulha a Europa”


Quando estiver quase a acabar este texto vai encontrar esta pergunta: “Onde é que estavas no 27 de junho? E o que fizeste para evitar o que aconteceu?”. Varoufakis colocou-a no Eurogrupo de sábado, que acabou como o mundo sabe: sem ninguém saber se o 27 de junho foi ou não o princípio de algo incontrolável. O Expresso traduziu o que Varoufakis pronunciou: para que  possa ler e fundamentar informadamente a sua opinião


Nota de Varoufakis no seu blogue, onde disponibilizou o texto
A reunião de 27 de junho de 2015 do Eurogrupo não vai ficar na história da Europa como um momento de que nos possamos orgulhar. Os ministros recusaram o pedido do governo grego para que fosse concedido ao povo grego uma mera semana durante a qual diriam 'Sim' ou 'Não' às propostas das instituições — propostas cruciais para o futuro da Grécia na Zona Euro. A simples ideia de que um governo consulte o seu povo quanto a uma proposta problemática que lhe é feita pelas instituições foi tratada com incompreensão e muitas vezes desdém que roçava o desprezo. Chegaram a perguntar-me: 'Está à espera que as pessoas normais compreendam questões tão complexas?'. 
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Na verdade, a democracia não teve um bom dia na reunião do Eurogrupo deste sábado! Mas as instituições europeias também não. Depois de o nosso pedido ser rejeitado, o presidente do Eurogrupo quebrou o pacto de unanimidade (emitindo uma declaração sem o meu consentimento) e tomou mesmo a dúbia decisão de convocar um encontro sem o ministro grego, ostensivamente para discutir os 'passos seguintes'.  É possível a coexistência de uma união monetária e da democracia? Ou uma delas tem de desistir? Esta é a questão fundamental a que o Eurogrupo decidiu dar resposta colocando a democracia na gaveta de baixo. De momento, esperemos.

Intervenção de Varoufakis no Eurogrupo
No nosso último encontro (25 de junho), as instituições colocaram na mesa a sua oferta final às autoridades gregas, em resposta à nossa proposta de Acordo ao Nível de Staff (SLA) apresentada a 22 de junho (e assinada pelo primeiro-ministro Tsipras). Depois de uma longa e cuidadosa apreciação, o nosso governo decidiu que, infelizmente, a proposta das instituições não podia ser aceite. Dada a grande proximidade do prazo de 30 de junho, data em que o acordo de empréstimo corrente expira, este impasse preocupa-nos muito a todos e as suas causas devem ser rigorosamente examinadas.
Rejeitámos as propostas de 25 de junho das instituições por causa de uma série de razões poderosas. A primeira razão é a combinação de austeridade e injustiça social que imporiam a uma população já devastada por… austeridade e injustiça social. Mesmo a nossa proposta SLA (de 22 de Junho) é austera, numa tentativa de aplacar as instituições e assim ficar mais perto de um acordo. Só que o nosso SLA tentava passar o fardo desta renovada carnificina austeritária para aqueles que estão mais capazes de a suportar — isto é, concentrando-nos no aumento das contribuições dos patrões para os fundos de pensões em vez de reduzir ainda mais as pensões mais baixas. Ainda assim, mesmo o nosso SLA contém muitas partes que a sociedade grega rejeita.
Assim, tendo-nos empurrado para aceitar uma dose substancial de nova austeridade, na forma dos absurdamente grandes superavits primários (3,5% do PIB a médio prazo, ainda assim um tanto abaixo do número fantasmagórico acordado com os anteriores governos – i.e. 4,5% – , acabámos por ser forçados a fazer escolhas recessivas entre, por um lado, aumento de impostos / encargos numa economia onde os que pagam o que lhes é imposto já pagam com a corda na garganta e, por outro, reduções nas pensões / benefícios sociais numa sociedade já devastada por cortes maciços nos rendimentos básicos dos cada vez mais numerosos necessitados.
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Deixem que vos diga, colegas, o que já trouxemos às instituições a 22 de junho, quando colocávamos na mesa as nossas próprias propostas: mesmo este SLA, o que propúnhamos, seria muito difícil de passar no Parlamento, dado o nível de medidas de recessão e austeridade que implicava. Infelizmente, a resposta das instituições foi insistir em medidas ainda mais recessivas, o mesmo é dizer paramétricas (isto é, aumento do IVA dos hotéis de 6% para 23%!) e, ainda pior, em passar o fardo em massa das empresas para os mais fracos membros da nossa sociedade (isto é, reduzir as pensões mais baixas, retirar o apoio aos agricultores, adiar para as calendas legislação que dá alguma proteção aos trabalhadores violentamente explorados).
As novas propostas das instituições, como vêm expressas no seu documento SLA / Ações Prioritárias  de 25 de junho, transformariam um pacote politicamente problemático — da perspetiva do nosso Parlamento – num pacote extremamente difícil de passar no nosso grupo parlamentar. Mas não é tudo. Fica cada vez pior que isso quando damos uma vista de olhos ao pacote de financiamento proposto.

O que torna a proposta das instituições impossível de passar no Parlamento é a falta de resposta a uma pergunta:  estas medidas dolorosas dão-nos pelo menos um período de tranquilidade durante o qual podemos realizar as reformas e medidas acordadas? Haverá um choque de otimismo contra o efeito recessivo de uma consolidação fiscal extra que é imposta a um país que está em recessão há 21 trimestres consecutivos? Não, a proposta das instituições não oferece essa perspetiva.
E isso porque o financiamento proposto para os próximos cinco meses é problemático de várias maneiras:
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 primeiro, não estabelece nenhuma provisão para as perdas do Estado, causadas por cinco meses a fazer pagamentos sem desembolsos e de rendimentos fiscais em queda como resultado da constante ameaça da saída da Grécia do Euro que tem andado no ar, por assim dizer;
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 segundo, a ideia de canibalizar o Fundo de Garantia para pagar as obrigações da era do programa SMP do BCE constitui um claro perigo: estes montantes eram reservados, corretamente, para reforçar os frágeis bancos gregos, possivelmente através de uma operação que joga com os seus tremendos Empréstimos Não-Rentáveis que devoram a sua capitalização. A resposta que me foi dada por altos responsáveis do BCE, cujos nomes não revelo, é que, se for preciso, o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF) será reposto para estar ao nível das necessidades de capitalização dos bancos. O ESM é a resposta que me deram. Mas, e este é um mas gigantesco, isto não faz parte do acordo proposto e, mais, não pode fazer parte do acordo uma vez que as instituições não têm mandato para comprometer o SME desta maneira – o que tenho a certeza Wolfgang não deixará de nos recordar. E, mais ainda, se este novo acordo pudesse ser feito, porque é que então a nossa proposta, sensata, moderada, de novo empréstimo do SME à Grécia, que ajude a passar a labilidade dos SMP do BCE para o SME, não é discutida?  A resposta "não discutimos porque não" será muito difícil de transmitir ao meu Parlamento juntamente com mais um pacote de austeridade;
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 terceiro, o plano de desembolsos proposto é um campo de minas de avaliações — uma por mês — que asseguraria duas coisas: primeiro, que o governo grego estivesse imerso, todos os dias, todas as semanas, no processo de avaliação durante cinco meses; e bem antes de estes cinco meses terminarem, entraríamos noutra entediante negociação do programa seguinte — uma vez que não há nada nas propostas das instituições capaz de inspirar a mais leve das esperanças de que no final de mais esta extensão a Grécia possa levantar-se sozinha nos dois pés;
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 Quarto, dado que é claro à sociedade que a nossa dívida continuará insustentável no fim deste ano, e que o acesso aos mercados estará tão distante nessa altura como agora, não se pode contar com o FMI para desembolsar a sua parte, os 3,5 mil milhões com que as instituições estão a contar como parte do pacote de financiamento sobre a mesa.
Estas são razões sólidas para que o nosso governo não considere que tem mandato para aceitar a proposta das instituições ou para usar a sua maioria no Parlamento de forma a empurrá-la contra os estatutos.

Ao mesmo tempo, não temos mandato para rejeitar também as propostas das instituições, sabendo do momento crítico da história que vivemos. O nosso partido recebeu 36% dos votos e o governo no seu todo representa pouco mais de 40%. Conscientes do peso da nossa decisão, sentimo-nos obrigados a colocar a proposta das instituições ao povo da Grécia. Empenhar-nos-emos a explicar-lhes completamente o que significa um "Sim" à proposta das instituições, a fazer o mesmo relativamente a um voto "Não", e a deixá-los decidir. Da nossa parte aceitaremos o veredito do povo e faremos tudo o que for necessário para o implementar — para um lado ou para outro.
Há alguma preocupação de um voto "Sim" ser um voto de desconfiança no nosso governo (já que recomendamos o "Não"), caso em que não podemos prometer ao Eurogrupo que estaremos em posição de assinar e implementar o acordo com as instituições. Não é assim. Somos democratas convictos. Se o povo nos der uma clara instrução para assinarmos as propostas das instituições, faremos tudo o que for preciso para o fazer - mesmo que isso signifique um governo remodelado.

Colegas, a solução do referendo é ótima para todos, dados os constrangimentos que enfrentamos:
 se o nosso governo aceitasse hoje a oferta das instituições, prometendo levá-la ao Parlamento amanhã, seríamos derrotados no Parlamento com o resultado de umas novas eleições a serem convocadas dentro de um longo mês – depois, o atraso, a incerteza e as perspetivas de uma solução bem-sucedida seriam muito, muito mais diminutas; mas mesmo se conseguíssemos fazer passar no Parlamento as propostas das instituições, enfrentaríamos um problema maior de propriedade e implementação. Em termos simples, tal como no passado os governos que impuseram políticas ditadas pelas instituições não puderam ganhar o povo para as tarefas, também nós iríamos falhar em consegui-lo.

Quanto à questão que será colocada ao povo grego, muito se disse sobre qual devia ser. Muitos de vós disseram-nos, aconselharam-nos, instruíram-nos até, que deveríamos fazê-la como uma pergunta de "Sim" ou "Não" ao Euro. Deixem-me ser claro nisto. Primeiro, a questão foi formulada pelo Governo e já passou no Parlamento — e ela é "Aceita a proposta das instituições como nos foi apresentada a 25 de junho, no Eurogrupo?”  Esta é a única questão pertinente. Se tivéssemos aceitado essa proposta há dois dias, teríamos tido um acordo. O governo grego está agora a fazer ao eleitorado a pergunta que você me fez, Jeroen – especialmente quando disse, e passo a citá-lo, "pode considerar, se quiser, isto como uma proposta de pegar ou largar". Bem, foi assim que a encarámos e estamos agora a honrar as instituições e o povo grego pedindo a este último que dê uma resposta clara à proposta das instituições.
Para os que dizem que, efetivamente, este é um referendo ao Euro, a minha resposta é: podem muito bem dizer isso, mas não faço comentários. É o vosso julgamento, a vossa opinião, a vossa interpretação. Não é a nossa! A vossa visão tem uma lógica mas apenas se contiver uma ameaça implícita de que um "Não" do povo grego à proposta das instituições seria seguido por manobras para expulsar a Grécia, ilegalmente, do Euro. Tal ameaça não seria consistente com os princípios básicos da governação democrática europeia e com o Direito Europeu.
Para os que nos dão instruções para colocar a questão do referendo como um dilema euro-dracma, a minha resposta é cristalina: os tratados europeus preveem saídas da Uniâo Europeia. Não preveem nenhuma medida para uma saída da Zona Euro. Com razão, claro, uma vez que a indivisibilidade da nossa União Monetária faz parte da sua razão de ser. Pedir-nos  que coloquemos a pergunta do referendo em termos de uma escolha envolvendo a saída da Zona Euro é pedir-nos para violarmos os Tratados da União Europeia e as leis da EU. Sugiro a quem queira que nós, ou outro governo, faça um referendo sobre a participação na União Monetária Europeia que recomende antes uma mudança dos Tratados.

Colegas,
É tempo de tomar medidas. A razão por que estamos hoje neste impasse é só uma: a proposta de base do nosso governo ao Eurogrupo e às instituições, que fiz aqui no Eurogrupo na minha primeira intervenção de sempre, nunca foi levada a sério. Era uma sugestão de que fosse criado terreno comum entre o Memorando existente e o nosso novo programa de governo. Por instantes, a declaração do Eurogrupo de 20 de fevereiro levantou a hipótese desse terreno comum - dado que não fez referência ao Memorando e se concentrou numa nova lista de reformas do meu governo que seria apresentada às instituições.
Lamentavelmente, logo após o 20 de fevereiro, as instituições e a maioria dos colegas aqui na sala desejaram trazer de novo o Memorando para o centro da discussão e reduzir o nosso papel a mudanças marginais no mesmo. Foi como se nos dissessem, parafraseando Henry Ford, que podíamos ter qualquer lista de reformas, qualquer acordo, desde que fosse o memorando. O terreno comum foi assim sacrificado a favor da imposição ao nosso governo de um recuo humilhante. É a minha visão. Mas não é importante neste momento. Agora é o povo grego que decide.
A nossa tarefa, no Eurogrupo de hoje, deve ser limpar o chão para uma passagem suave para o referendo de 5 de julho. Isto significa uma coisa: que o nosso acordo de empréstimo seja prolongado por poucas semanas para que o referendo decorra em condições de tranquilidade. Logo após 5 de julho, se o povo votar "Sim", assinaremos a proposta das instituições. Até lá, durante a próxima semana, à medida que se aproximar o referendo, qualquer desvio à normalidade, especialmente no setor bancário, seria invariavelmente interpretada como uma tentativa para coagir os eleitores gregos. A sociedade grega pagou um enorme preço, através de uma enorme contração fiscal, no sentido de fazer parte da nossa união monetária. Mas uma união monetária democrática que ameaça um povo prestes a dar o seu veredito com controlos de capitais e encerramentos de bancos é uma contradição nos termos. Gostava de pensar que o Eurogrupo respeitará este princípio. Quanto ao BCE, que tem a custódia da nossa estabilidade monetária e da própria União, não tenho dúvida de que, se o Eurogrupo tomar hoje a decisão responsável de aceitar um pedido de extensão do nosso acordo de empréstimo que acabo de colocar na mesa, fará o que é preciso para dar ao povo grego mais uns dias para exprimir a sua opinião.
Colegas, este é o momento e as decisões que tomamos são momentosas. Daqui a uns anos poderão mesmo perguntar-nos: "Onde é que estavas no 27 de junho? E o que fizeste para evitar o que aconteceu?" E no mínimo deveríamos ser capazes de responder: demos a um povo que vive sob a maior depressão uma hipótese de reconsiderar as suas opções. Tentámos a democracia como meio de quebrar um impasse. E fizemos o que tínhamos a fazer para lhes dar uns dias para pensar e decidir.


POST SCRIPTUM DE VAROUFAKIS NO SEU BLOGUE
O dia em que o presidente do Eurogrupo quebrou a tradição da unanimidade e excluiu por sua vontade a Grécia de um encontro do Eurogrupo  Na sequência da minha intervenção, o presidente do Eurogrupo rejeitou o nosso pedido de extensão, com o apoio do resto dos membros, e anunciou que o Eurogrupo iria emitir uma declaração colocando o ónus deste impasse na Grécia e sugerindo que os 18 ministros (ou seja, os 19 ministros das Finanças da Zona Euro, exceto o ministro grego) se reunissem mais tarde para discutir formas e meios de se protegerem.

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Nesse ponto pedi conselho jurídico ao secretariado sobre se uma declaração do Eurogrupo podia ser emitida sem a convencional unanimidade e se o presidente do Eurogrupo podia convocar uma reunião sem convidar o ministro das Finanças de um Estado-membro. Recebi a seguinte e extraordinária resposta: "O Eurogrupo é um grupo informal. Por isso não está sujeito aos tratados ou a regulamentos escritos. Embora a unanimidade seja convencionalmente usada, o presidente do Eurogrupo não está preso a regras explícitas". Deixo os comentários ao leitor.
Pela minha parte, tiro esta conclusão:
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Colegas, recusar alargar o prazo do acordo de empréstimo por um par de semanas e assim dar tempo ao povo grego para deliberar em paz e calmamente sobre a proposta das instituições, especialmente dada a alta probabilidade de o povo aceitar estas propostas (contrariando o conselho do nosso governo), causará danos permanentes na credibilidade do Eurogrupo como um corpo democrático de decisão que reúne estados parceiros que partilham não só uma moeda comum, mas também valores comuns.

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* Não isentando este governo grego de algumas responsabilidades, mas a dívida não é dele, ficamos a perceber a prepotência da finança europeia que não admite um governo de esquerda num país da U.E.. Quem considerar os socialistas de esquerda não sabe distinguir entre um penico e uma chávena.


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