ESTA SEMANA NO
"SOL"
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Pedidos de asilo disparam
Há quem chegue sozinho, só com a roupa do corpo. E há famílias
inteiras, incluindo mães com bebés ao colo, sem um tostão. Só nos
primeiros três meses do ano, Portugal foi procurado por 224 refugiados,
mais 245% do que no mesmo período do ano passado.
A maioria destes
pedidos de asilo (126) foi apresentada por ucranianos, que deixam para
trás um país em guerra, e também por cidadãos chineses - algo que nunca
tinha acontecido - que alegam “perseguição religiosa”.
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A manter-se este ritmo, o número de solicitações deverá
ultrapassar a média anual dos últimos anos (400 a 500). Mas, garante ao
SOL a presidente do Conselho Português para os Refugiados (CPR), Teresa
Tito de Morais, o país está preparado para responder a todas as
situações. “Tem de estar. É uma questão de direitos humanos. A Itália
viu-se confrontada com uma pressão migratória inédita e teve de
encontrar políticas de acolhimento”, sublinha, acrescentando que os
países que fazem fronteira com o Mediterrâneo não estão livres de sofrer
uma pressão desse tipo. “Mas mesmo que o Algarve não seja 'invadido',
Portugal tem o dever de assumir as suas responsabilidades, como membro
da União Europeia”. E, há várias formas de apoio: “Asilo e vistos
humanitários, programas de reinstalação mais generosos e possibilidade
de reunião familiar”.
Desde o início do ano, o CPR - que é financiado pelo Fundo Europeu
para os Refugiados, pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e
pela Segurança Social - começou a apoiar 133 novos requerentes de asilo
de 21 nacionalidades, dos quais 82 são ucranianos (12 deles menores,
tendo o mais novo seis meses).
Uns perseguidos e outros apanhados no conflito
“Vêm por causa do medo, instabilidade e incerteza que se vive no
país. Alguns foram perseguidos, outros apanhados num conflito
generalizado”, explica a responsável do CPR, acrescentando que muitos
refugiados têm familiares e amigos em Portugal ou já viveram cá como
imigrantes.
Foi o caso de Vadym. Aos 39 anos, este ucraniano com formação em
engenharia mecânica viu-se forçado a abandonar o seu país por se sentir
“ameaçado”. “Cada dia morrem civis, crianças... Um amigo meu desapareceu
e depois foi encontrado morto”, conta ao SOL.
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Antes de fugir para Portugal, onde já vivera 10 anos, Vadym passou
quatro meses como saltimbanco, fugindo de um lado para o outro com a
mulher e os três filhos menores. Em Junho, deixou a cidade de Donetsk,
principal palco do conflito separatista e foi para o extremo oposto do
país, onde permaneceu três meses sobrevivendo com as poupanças de uma
vida. Dali, a família voltou a mudar-se para uma pequena cidade, a 70
quilómetros de Donetsk, onde permanecem até hoje a mulher e os filhos.
Ele veio para garantir sustento à família. Tinha um negócio de
imobiliário (investia e arrendava apartamentos), um salário acima da
média (15 mil euros) e uma vida confortável, mas perdeu tudo: “As casas
são assaltadas assim que ficam abandonadas e tudo fechou: bancos,
correios, grandes superfícies, só ficaram lojas de rua, mas a comida
está muito mais cara. Quando havia bombardeamentos, faltava água e
luz”.
Em Outubro passado, aterrou em Lisboa e sobreviveu os primeiros dias
num hostel. Pediu asilo ao SEF, foi aprovado e já tem autorização de
residência provisória (seis meses). Mas o processo não termina aqui: na
segunda fase do processo, após uma 'investigação' mais profunda, o SEF
emite, geralmente no espaço de um ano, a decisão final e pode ou não
conceder o estatuto de refugiado ou de protecção subsidiária. Vadym tem
esperança de conseguir o segundo. Encontrar trabalho é o passo seguinte
e, depois, comprar um apartamento maior e trazer a família para cá. Por
enquanto, usa o Skype para matar saudades: “Falamos todos os dias”. E
sobrevive num quarto alugado com um subsídio de 150 euros por mês.
A todos os adultos, o CPR concede um subsídio mensal de 150 euros (75
euros para menores e 50 para crianças até aos três anos) durante dois a
três meses, altura em que passam a ser apoiados pela Segurança Social. E
aos que precisam o CPR garante alojamento - no centro da Bobadela
(Loures) ou em quartos alugados -, mais alimentação em géneros. Todos
têm ainda direito a apoio médico e jurídico, e frequentam aulas de
língua portuguesa. Neste momento, dos 82 ucranianos apoiados pelo CPR,
apenas cinco estão na Bobadela, sendo os restantes apoiados em
alojamento externo.
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Mas há quem dispense esta opção e opte por ficar em casa de
familiares ou amigos. É o caso de Victor: há cerca de um mês, fugiu da
Ucrânia com a namorada e instalou-se na casa da mãe dela, que já vive em
Portugal há 15 anos. Aos 26 anos, este jovem formado em engenharia
tomou a decisão mais difícil da sua vida: deixou os pais e o irmão, os
amigos e um emprego estável (que lhe rendia 700 euros por mês).
'Não quero matar ninguém e por isso fugi'
Mas agora está “em paz”. Deixou um país que o empurrava para a
guerra. “Jovens da minha idade, na região onde vivia (Lviv) estão a ser
levados para o Exército. Muitos simplesmente desaparecem, outros morrem.
Oficialmente, dizem que foi um acidente num treino militar... Já
aconteceu isso a amigos meus”, conta Victor, com o olhar perdido no
vazio, submerso em tristeza e revoltado contra quem começou uma “guerra
não oficial”. “Não há direito. Não quero matar ninguém e por isso
fugi”.
Ficar em Portugal, aprender a língua e encontrar trabalho - é tudo o
que deseja. Mas o caminho pode não ser linear. Quando deixou a Ucrânia,
foi à Polónia pedir um visto e, daí, veio de autocarro para Portugal. “O
SEF diz que, como tenho documentos polacos, vão enviar o processo para
lá. Mas tenho medo porque sei que a Polónia não concede asilo a ninguém:
simplesmente reenvia as pessoas para a Ucrânia”.
Ao todo, neste momento, o CPR apoia financeiramente 189 refugiados de
24 nacionalidades diferentes (dos quais só 70 estão no centro da
Bobadela), sendo a Ucrânia o país mais expressivo, seguido do Paquistão
(13), Marrocos (oito), China (cinco) e Irão (quatro).
Chineses católicos dizem-se perseguidos
Até ao final de Março, o SEF tinha recebido 22 pedidos de asilo
inéditos: todos cidadãos chineses que se dizem vítimas de “perseguição
política”. Até 15 de Abril, este número já tinha subido para 34. Ao que o
SOL apurou, são oriundos da província de Shanxi e fazem parte de um
culto religioso de índole católica.
Segundo fonte oficial do SEF, são na maioria mulheres, com idades
compreendidas entre os 20 e 50 anos, e têm profissões variadas:
agricultores, empregados de comércio e hotelaria e comerciantes. Desde o
início deste mês, cinco já começaram a ser apoiados pelo CPR, mas a
maioria está ainda a aguardar a primeira decisão do SEF.
Entre 2009 e 2014, o SEF recebeu e analisou 1.818 pedidos de asilo.
Neste período, foram concedidos 87 estatutos de refugiado e 544
estatutos de protecção humanitária. República Democrática do Congo,
Colômbia, Guiné, Somália, Costa do Marfim e, mais recentemente, Síria,
Paquistão e Serra Leoa são os países de origem de grande parte destes
refugiados - que têm, em média, entre 19 e 39 anos e são, na maioria, do
sexo masculino.
Portugal é
dos países da Europa que menos refugiados têm recebido e dos que menos
gastam com refugiados”, nota a presidente do CPR, recusando falar em
custos médios: “Não é uma questão de dinheiro, mas de solidariedade
internacional. Falar em números é criar um conflito ideológico e um pólo
de racismo e xenofobia em relação aos refugiados”.
* Temos o dever de ajudar quem nos procura em absoluto desespero, porém, qualquer dia o governo chinês proíbe Portugal de acolher cidadãos daquele país.
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