HOJE NO
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Pedofilia na Igreja
Bispos portugueses não obedecem
ao que pediu o Papa Francisco
Quatro casos, quatro maneiras de agir. Suspender sem ouvir primeiro, proteger depois da condenação civil, cair em cima dos jornalistas ou optar pelo silêncio. Assim reagiram os bispos de Braga, Guarda, Funchal e Santarém às acusações de pedofilia
As
regras sobre o tratamento que deve ser dado às suspeitas de pedofilia
na Igreja são claras. Ainda assim, os bispos das dioceses portuguesas
têm lidado de forma diferente com o assunto. A denúncia mais recente
recai sobre um padre de Fafe. Abel Maia foi acusado pelo colega Roberto
Carlos, antigo pároco de Canelas, de ter abusado sexualmente de menores.
O sacerdote ameaçou o bispo do Porto de que, caso fosse mudado de
paróquia, revelaria publicamente o escândalo, com mais de uma década. D.
António dos Santos remeteu imediatamente a carta com a ameaça para as
autoridades civis - o DIAP do Porto já está a investigar - e para a
arquidiocese de Braga, a que pertence o padre suspeito.
A reacção de Braga
A 27 de Novembro, o nome do sacerdote foi publicado no “Correio da Manhã” e, logo no mesmo dia, o arcebispo de Braga emitiu um comunicado a anunciar a “suspensão da actividade pastoral” de Abel Maia, “por razões de prudência, serenidade na investigação e até que todas as dúvidas se dissipem”.
.
As regras da Igreja determinam que, se um padre for investigado na justiça civil ou alvo de uma denúncia, deverá também enfrentar um processo canónico. Isso, porém, não implica que seja imediatamente afastado da paróquia em que trabalha – como aconteceu com Abel Maia. Antes de se partir para a “suspensão”, o acusado e o autor da denúncia devem ser ouvidos para apurar se a acusação é credível. “Algo que não aconteceu: assim que a notícia veio a público, o sacerdote foi retirado da paróquia e o autor da denúncia não foi sequer ouvido por estar no estrangeiro”, nota um canonista.
A reacção da Guarda
No caso do padre do Fundão, D. Manuel Felício chegou a convocar uma conferência de imprensa para dizer que a diocese estava disponível para colaborar com os tribunais civis e mostrar “apoio” às vítimas. Ressalvou, porém, que o padre Luís Mendes não ficaria desamparado, sendo-lhe dadas “as condições necessárias para poder viver com dignidade os momentos difíceis inerentes a todo o processo que passou a envolvê-lo”.
No dia em que o sacerdote foi condenado a dez anos de prisão, o bispo foi mais longe e divulgou um comunicado anunciando que seria “usado o direito de recurso para tribunal de instância superior”. A rematar, D. Manuel Felício deixou uma dúvida no ar: “Continuamos esperançados em que a verdade seja devidamente esclarecida e que a sentença final tenha na devida conta a objectividade das provas efectivamente apresentadas pela defesa.”
O comunicado, contam fontes eclesiásticas, “caiu mal” no clero da Guarda e terá sido até redigido “com a ajuda do advogado do sacerdote” condenado. Uma interferência na justiça civil que os canonistas com quem o i falou consideram “excessiva” e que até obrigou D. Manuel Clemente, então presidente da Conferência Episcopal, a enfrentar perguntas incómodas dos jornalistas. “O apoio da diocese a este recurso com certeza que será fundamentado”, justificou o agora Patriarca de Lisboa.
A reacção do Funchal
Em Abril, o “Tribuna da Madeira” lançou a bomba: a Polícia Judiciária estava a investigar o cónego Carlos Nunes por alegados abusos sexuais no seminário do Funchal. “Eu tenho confiança na equipa do seminário. Com isto digo tudo”, reagiu D. António Carrilho. O bispo garantiu ainda que a diocese iria colaborar com a investigação civil, mas criticou “o modo como se faz na comunicação social a divulgação dessas suspeitas, porque se atingem pessoas e instituições de forma irreparável, sem uma comprovação, apenas a partir da suspeita”. E acrescentou: “A diocese aguarda mas, de facto, e em relação ao segredo de justiça pergunta como é fácil violar e como é que isto acontece.”
A reacção de Santarém
Em Julho deste ano foi deduzida uma acusação civil contra um padre da Golegã, acusado de dois crimes de pedofilia. António Júlio foi detido em Dezembro do ano passado e o bispo de Santarém tem optado pelo silêncio. A diocese anunciou a abertura do processo canónico de averiguações e informou estar “disponível” para colaborar com as instâncias civis e ajudar as vítimas. Desde então, D. Manuel Pelino não fez mais comentários.
A investigação na Igreja Quatro casos, quatro posturas diferentes. A “inexperiência” é uma das razões que os canonistas apontam para a disparidade de procedimentos que os bispos portugueses têm adoptado perante as suspeitas de pedofilia. “Só nos últimos dois, três anos é que estes casos ganharam dimensão em Portugal”, lembra um dos especialistas. O mesmo aconteceu nos Estados Unidos na década de 1980, quando rebentaram os primeiros escândalos na Igreja. “Houve posições extremadas. Uns bispos puniram imediatamente, outros tentaram proteger os sacerdotes e atiraram a culpa para a comunicação social”, compara um canonista, ressalvando, porém, que a “inexperiência” não serve de desculpa, uma vez que este caminho já foi feito e as regras são, hoje, inequívocas.
Desde 2001, os delitos relacionados com pedofilia são considerados matéria de investigação reservada à Santa Sé que delega, depois, nos tribunais eclesiásticos das dioceses.
Os bispos devem abrir, obrigatoriamente, um processo preliminar – em que são ouvidas as vítimas, os denunciantes e os membros do clero visados nas acusações. Concluída esta avaliação, e se se confirmarem os indícios de abuso, é instaurado um processo canónico que pode levar ao seu afastamento definitivo.
As vítimas, por outro lado, são aconselhadas, pelas dioceses, a denunciarem o caso às autoridades civis. A investigação fica entregue aos tribunais, cabendo à Igreja colaborar em todos os momentos. Por norma, o processo canónico demora menos tempo que o civil – já que este último pressupõe uma série de salvaguardas, nomeadamente nos prazos.
Assim que a investigação preliminar termina, o bispo não é obrigado a divulgar publicamente as conclusões – mesmo que o padre tenha cometido os abusos sexuais e seja afastado do exercício ministerial.
* As vítimas são de somenos importância, se calhar ainda vão ser consideradas culpadas por andarem a provocar batinas.
A reacção de Braga
A 27 de Novembro, o nome do sacerdote foi publicado no “Correio da Manhã” e, logo no mesmo dia, o arcebispo de Braga emitiu um comunicado a anunciar a “suspensão da actividade pastoral” de Abel Maia, “por razões de prudência, serenidade na investigação e até que todas as dúvidas se dissipem”.
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As regras da Igreja determinam que, se um padre for investigado na justiça civil ou alvo de uma denúncia, deverá também enfrentar um processo canónico. Isso, porém, não implica que seja imediatamente afastado da paróquia em que trabalha – como aconteceu com Abel Maia. Antes de se partir para a “suspensão”, o acusado e o autor da denúncia devem ser ouvidos para apurar se a acusação é credível. “Algo que não aconteceu: assim que a notícia veio a público, o sacerdote foi retirado da paróquia e o autor da denúncia não foi sequer ouvido por estar no estrangeiro”, nota um canonista.
A reacção da Guarda
No caso do padre do Fundão, D. Manuel Felício chegou a convocar uma conferência de imprensa para dizer que a diocese estava disponível para colaborar com os tribunais civis e mostrar “apoio” às vítimas. Ressalvou, porém, que o padre Luís Mendes não ficaria desamparado, sendo-lhe dadas “as condições necessárias para poder viver com dignidade os momentos difíceis inerentes a todo o processo que passou a envolvê-lo”.
No dia em que o sacerdote foi condenado a dez anos de prisão, o bispo foi mais longe e divulgou um comunicado anunciando que seria “usado o direito de recurso para tribunal de instância superior”. A rematar, D. Manuel Felício deixou uma dúvida no ar: “Continuamos esperançados em que a verdade seja devidamente esclarecida e que a sentença final tenha na devida conta a objectividade das provas efectivamente apresentadas pela defesa.”
O comunicado, contam fontes eclesiásticas, “caiu mal” no clero da Guarda e terá sido até redigido “com a ajuda do advogado do sacerdote” condenado. Uma interferência na justiça civil que os canonistas com quem o i falou consideram “excessiva” e que até obrigou D. Manuel Clemente, então presidente da Conferência Episcopal, a enfrentar perguntas incómodas dos jornalistas. “O apoio da diocese a este recurso com certeza que será fundamentado”, justificou o agora Patriarca de Lisboa.
A reacção do Funchal
Em Abril, o “Tribuna da Madeira” lançou a bomba: a Polícia Judiciária estava a investigar o cónego Carlos Nunes por alegados abusos sexuais no seminário do Funchal. “Eu tenho confiança na equipa do seminário. Com isto digo tudo”, reagiu D. António Carrilho. O bispo garantiu ainda que a diocese iria colaborar com a investigação civil, mas criticou “o modo como se faz na comunicação social a divulgação dessas suspeitas, porque se atingem pessoas e instituições de forma irreparável, sem uma comprovação, apenas a partir da suspeita”. E acrescentou: “A diocese aguarda mas, de facto, e em relação ao segredo de justiça pergunta como é fácil violar e como é que isto acontece.”
A reacção de Santarém
Em Julho deste ano foi deduzida uma acusação civil contra um padre da Golegã, acusado de dois crimes de pedofilia. António Júlio foi detido em Dezembro do ano passado e o bispo de Santarém tem optado pelo silêncio. A diocese anunciou a abertura do processo canónico de averiguações e informou estar “disponível” para colaborar com as instâncias civis e ajudar as vítimas. Desde então, D. Manuel Pelino não fez mais comentários.
A investigação na Igreja Quatro casos, quatro posturas diferentes. A “inexperiência” é uma das razões que os canonistas apontam para a disparidade de procedimentos que os bispos portugueses têm adoptado perante as suspeitas de pedofilia. “Só nos últimos dois, três anos é que estes casos ganharam dimensão em Portugal”, lembra um dos especialistas. O mesmo aconteceu nos Estados Unidos na década de 1980, quando rebentaram os primeiros escândalos na Igreja. “Houve posições extremadas. Uns bispos puniram imediatamente, outros tentaram proteger os sacerdotes e atiraram a culpa para a comunicação social”, compara um canonista, ressalvando, porém, que a “inexperiência” não serve de desculpa, uma vez que este caminho já foi feito e as regras são, hoje, inequívocas.
Desde 2001, os delitos relacionados com pedofilia são considerados matéria de investigação reservada à Santa Sé que delega, depois, nos tribunais eclesiásticos das dioceses.
Os bispos devem abrir, obrigatoriamente, um processo preliminar – em que são ouvidas as vítimas, os denunciantes e os membros do clero visados nas acusações. Concluída esta avaliação, e se se confirmarem os indícios de abuso, é instaurado um processo canónico que pode levar ao seu afastamento definitivo.
As vítimas, por outro lado, são aconselhadas, pelas dioceses, a denunciarem o caso às autoridades civis. A investigação fica entregue aos tribunais, cabendo à Igreja colaborar em todos os momentos. Por norma, o processo canónico demora menos tempo que o civil – já que este último pressupõe uma série de salvaguardas, nomeadamente nos prazos.
Assim que a investigação preliminar termina, o bispo não é obrigado a divulgar publicamente as conclusões – mesmo que o padre tenha cometido os abusos sexuais e seja afastado do exercício ministerial.
* As vítimas são de somenos importância, se calhar ainda vão ser consideradas culpadas por andarem a provocar batinas.
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