Manipulados
A cultura de ganância na banca de investimento não mudou.
Precisamos de mais uns destes para que eu possa cumprir os objectivos
este mês". A frase pertence a um "trader" do HSBC e faz parte de uma
troca de mensagens num grupo de conversação online privado. Esta e
outras mensagens serviram de prova no processo de investigação à
manipulação do mercado cambial.
As conversas foram publicadas pela Financial Conduct Authority, o
supervisor britânico, na quarta-feira. O mesmo dia em que UBS, RBS,
HSBC, JPMorgan, Bank of America e Citi chegaram a acordo com autoridades
do Reino Unido, dos Estados Unidos e da Suíça para o pagamento de 4,3
mil milhões de dólares em coimas por manipulação do mercado cambial,
entre Janeiro de 2008 e Outubro de 2013.
Os "traders" dos vários bancos usavam os grupos de conversação
para combinar transacções que lhes permitiam empurrar o mercado cambial
no sentido que mais lhes convinha, perto do momento em que é definido o
preço de referência dos pares cambiais, usado em vários contratos. As
ordens eram introduzidas não no interesse dos clientes, mas tendo em
conta os seus objectivos pessoais: atingir metas para engrossar os
bónus. "Precisamos de mais uns destes para que eu possa cumprir os
objectivos estes mês", como dizia o "trader". O desplante está espelhado
nos pseudónimos usados: "os jogadores", "os três mosqueteiros",
"soldados da fortuna".
As mensagens revelam um "modus operandi" muito idêntico à
manipulação da Libor e outras taxas de juro do mercado monetário. O mais
inquietante é a prática ter continuado no mercado cambial, mesmo depois
das coimas milionárias aplicadas no caso Libor a partir de 2012. Prova
de que a cultura de ganância na banca de investimento não mudou. Sinal
de que os controlos internos para evitar este tipo de casos continuam a
não ser suficientes.
A vigarice já passou também pelos contratos de energia, metais
preciosos, derivados e até acções - há quem defenda que a negociação
algorítmica também vicia o jogo. Tantos casos fazem crer que sempre foi
assim. A diferença é que alguns começam a ser apanhados pelos
supervisores.
Os bancos pagaram 207 mil milhões de euros, entre 2009 e 2013, em
coimas, acordos judiciais e provisões por práticas ilícitas, de acordo
com a CCP Research Foundation, uma organização que promove as melhores
práticas e ética na gestão. A soma impressiona. Mas não parece
dissuadir. Desde que foi conhecida a "multa" de 4,3 mil milhões de
euros, os bancos visados registam ganhos em bolsa ou perdas ligeiras.
Tal é o peso que os investidores deram à punição.
Director-adjunto
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
17/11/14
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