Agora sem rodinhas
A troika, no fundo, ajudou o governo a aprender a governar. Agora que a troika saiu, é nada certo que o governo tenha aprendido.
A premissa de partida desta crónica é a seguinte: a relação entre a troika e o governo foi, nos últimos três anos, um pouco como a relação entre as rodinhas de apoio e as bicicletas das crianças.
A troika, no fundo, ajudou o governo a aprender a governar. Agora que a troika saiu,
é nada certo que o governo tenha aprendido — ou queira aprender. Sem
rodinhas de apoio, as guinadas são evidentes. Uma parte do governo quer
continuar como no tempo da troika, outra parte acha que já pode
fazer malabarismos, e alguns ministros já se estamparam. Fiel ao seu
estilo, o primeiro-ministro finge que não vê o problema e segue em
frente.
Isto tem implicações para duas coisas importantes no nosso
futuro próximo: quando vamos chegar a eleições, e em que estado
chegamos lá.
A primeira deveria ser resolvida pelo bom senso. Tudo
aconselha a que as eleições sejam antecipadas para antes do Verão de
2015. Por um lado, o esgotamento e desorientação do governo. Por outro
lado, o tempo de que precisamos elaborar um orçamento democraticamente
legitimado, a tempo para 2016. Por um terceiro lado, o facto de os
quatro anos deste governo se cumprirem em junho de 2015. Por outro lado
ainda, a necessidade de dar tempo à formação de um novo governo com um
renovado mandato democrático a tempo das negociações do "semestre
europeu", a partir de outubro/novembro de 2015. O argumentário a favor
de eleições antecipadas é um polígono.
Dois pontos adicionais apenas:
Como
pode este governo insistir no cumprimento das metas orçamentais e na
integração das políticas nacionais no quadro europeu, e depois deixar
que o próximo governo se apresente diminuído, com um orçamento preparado
por um governo de gestão, no momento de defender perante as instâncias
europeias políticas que provavelmente não são as suas? (Sabemos a
resposta: este governo até prefere que seja assim).
E como podemos
querer preparar o país para a renegociação do quadro financeiro
europeu, que decorrerá principalmente em 2016 e que terá de ser
preparada em 2015, sem um governo (de preferência novo) com uma
estratégia europeia (de preferência nova) que possa tirar o máximo
partido dos fundos europeus que vão determinar a maior parte do
investimento disponível até quase 2020? É absolutamente aconselhável que
o país possa, em eleições, escolher as grandes opções para esse novo
ciclo.
Precisamos definitivamente de largar as rodinhas e escolher o nosso caminho.
O
caos na justiça e na educação não é um bom prenúncio para o nosso
próximo ano. O país está exausto desta governação desgastada e não
encontra já justificação para o seu prolongamento. Pedro Passos Coelho
está acossado pelo caso Tecnoforma e espera que o prolongar da
governação lhe dê o tempo suficiente para recuperar com políticas
eleitoralistas.
A guinada nesse sentido eleitoralista invalida, ao
mesmo tempo, os argumentos de continuidade que o governo poderia
apresentar. Quando se torna claro que um governo já não está interessado
nos problemas do país mas apenas concentrado em resolver os seus
próprios problemas, só há uma decisão a tomar: marcar eleições.
Coordenador do partido Livre.
IN "PÚBLICO"
13/10/14
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