14/10/2014

RUI TAVARES

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Agora sem rodinhas

A troika, no fundo, ajudou o governo a aprender a governar. Agora que a troika saiu, é nada certo que o governo tenha aprendido.

A premissa de partida desta crónica é a seguinte: a relação entre a troika e o governo foi, nos últimos três anos, um pouco como a relação entre as rodinhas de apoio e as bicicletas das crianças.

A troika, no fundo, ajudou o governo a aprender a governar. Agora que a troika saiu, é nada certo que o governo tenha aprendido — ou queira aprender. Sem rodinhas de apoio, as guinadas são evidentes. Uma parte do governo quer continuar como no tempo da troika, outra parte acha que já pode fazer malabarismos, e alguns ministros já se estamparam. Fiel ao seu estilo, o primeiro-ministro finge que não vê o problema e segue em frente.
Isto tem implicações para duas coisas importantes no nosso futuro próximo: quando vamos chegar a eleições, e em que estado chegamos lá.

A primeira deveria ser resolvida pelo bom senso. Tudo aconselha a que as eleições sejam antecipadas para antes do Verão de 2015. Por um lado, o esgotamento e desorientação do governo. Por outro lado, o tempo de que precisamos elaborar um orçamento democraticamente legitimado, a tempo para 2016. Por um terceiro lado, o facto de os quatro anos deste governo se cumprirem em junho de 2015. Por outro lado ainda, a necessidade de dar tempo à formação de um novo governo com um renovado mandato democrático a tempo das negociações do "semestre europeu", a partir de outubro/novembro de 2015. O argumentário a favor de eleições antecipadas é um polígono.

Dois pontos adicionais apenas:
Como pode este governo insistir no cumprimento das metas orçamentais e na integração das políticas nacionais no quadro europeu, e depois deixar que o próximo governo se apresente diminuído, com um orçamento preparado por um governo de gestão, no momento de defender perante as instâncias europeias políticas que provavelmente não são as suas? (Sabemos a resposta: este governo até prefere que seja assim).

E como podemos querer preparar o país para a renegociação do quadro financeiro europeu, que decorrerá principalmente em 2016 e que terá de ser preparada em 2015, sem um governo (de preferência novo) com uma estratégia europeia (de preferência nova) que possa tirar o máximo partido dos fundos europeus que vão determinar a maior parte do investimento disponível até quase 2020? É absolutamente aconselhável que o país possa, em eleições, escolher as grandes opções para esse novo ciclo.

Precisamos definitivamente de largar as rodinhas e escolher o nosso caminho.
O caos na justiça e na educação não é um bom prenúncio para o nosso próximo ano. O país está exausto desta governação desgastada e não encontra já justificação para o seu prolongamento. Pedro Passos Coelho está acossado pelo caso Tecnoforma e espera que o prolongar da governação lhe dê o tempo suficiente para recuperar com políticas eleitoralistas.

A guinada nesse sentido eleitoralista invalida, ao mesmo tempo, os argumentos de continuidade que o governo poderia apresentar. Quando se torna claro que um governo já não está interessado nos problemas do país mas apenas concentrado em resolver os seus próprios problemas, só há uma decisão a tomar: marcar eleições.

Coordenador do partido  Livre.

IN "PÚBLICO"
13/10/14

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