ESTA SEMANA NA
"SÁBADO"
"SÁBADO"
Porque gostamos tanto de cães e gatos
Naquele dia de 2004, quando percebeu que algo não estava bem com o
Metralha, Pedro Barros Pereira ( saiu da praia de Ponta do
Ouro, no Sul de Moçambique, e meteu-se no jipe com o dálmata. Uma hora e
pouco depois já tinha percorrido os 170 km que, garante, nunca tinha
feito em menos de quatro horas, e estava a chegar ao veterinário em
Maputo.
Nunca mais se lembrou de que era o dia do seu aniversário. E,
feito o diagnóstico, nem hesitou sobre se seria sensato ou não
deslocar-se à África do Sul sempre que era preciso comprar a ração
caríssima que o cão, com problemas renais, a partir daí passou a ter de
comer – “Só lá é que havia, ia e pronto.”
Quando, em Novembro do ano passado, a namorada, por telefone e com
saudades, ameaçou abrir o portão da casa na Quinta da Marinha para que o
Zephyr fugisse e se perdesse, Jonathan Brum da Silva decidiu que estava
tudo acabado – “Uma mulher para estar comigo tem de aceitar que eu
tenho um cão, que amo o meu cão e que faço tudo por ele.”
Ao procurar
casa em Lisboa, ainda ponderou sobre se devia arrendar um apartamento
ou, pelo dobro ou mais, uma moradia de dois pisos e jardim onde o
labrador pudesse passar os dias. Ganhou a segunda opção.
Depois de lhe ter colocado um chip, de o ter vacinado contra a raiva, e
de lhe ter tirado sangue e enviado a amostra para o único laboratório
credenciado pela União Europeia em todo o estado de São Paulo, Ana
Geraldo recebeu o CZI (Certificado Zoossanitário Internacional) do
Mingau. Só faltava marcar as viagens de regresso a Lisboa, depois de
quatro anos em doutoramento no Brasil. O gato veio em voo directo, desde
o aeroporto de Campinas – 10 horas.
Ela passou pela Colômbia e por
Espanha antes de chegar a Portugal, 28 horas depois do embarque – “Já
não tinha dinheiro para dois bilhetes directos mas não queria sujeitá-lo
a escalas, portanto fi-las eu.”
Seria óbvio perguntar o que estas três histórias têm em comum, por isso a
questão é outra: acha que os comportamentos destes donos foram a)
absurdos ou b) banais? Se respondeu a), é claro que nunca teve nenhum
animal de estimação, mas continue a ler. Se escolheu b), continue a
fazer festas ao seu cão/gato – e não pare também de ler. A resposta
certa era a c), os comportamentos de Pedro Barros Pereira, 36 anos,
consultor de gestão; Jonathan Brum da Silva, 26 anos, consultor e
supervisor financeiro do Banco de Portugal; e Ana Geraldo, 32 anos,
investigadora e engenheira zootécnica, são só o reflexo de 2,6 milhões
de anos de evolução humana. Quem o garante é a antropóloga americana Pat
Shipman, da Penn State University, que em 2011 publicou ‘The Animal
Connection’ (A ligação aos animais, em português) e propôs uma nova
teoria para explicar as relações tão fortes entre seres humanos e
animais de estimação (nomeadamente cães e gatos): “O papel dos animais
na nossa evolução para Homo Sapiens não foi acidental, foi essencial –
foram eles que nos fizeram humanos.”
De acordo com a investigadora, a atenção dada aos outros predadores e a
análise dos seus hábitos foi essencial para que os ancestrais do Homem
conseguissem levar-lhes a melhor, deixando de ser presas, sobrevivendo e
passando eles próprios à condição de caçadores, o que lhes permitiu
aceder aos alimentos mais proteicos – que fizeram depois com que os
cérebros se desenvolvessem e aumentassem de tamanho. Segundo a
antropóloga, a domesticação de animais (que terá tido início há 32 mil
anos) é mais um passo nesta cadeia de evolução: depois de gerações a
estudá-los, os humanos decidiram tirar partido directo dos animais,
utilizando-os como “ferramentas vivas”. Isso explica, diz Shipman, por
que motivos os humanos têm tanto apreço por eles: observá-los e viver
com eles está-nos no ADN. “O estabelecimento de relações íntimas com
outros animais é único e universal à nossa espécie. Nenhum outro
mamífero adopta outras espécies no mundo selvagem – as gazelas não tomam
conta de chitas bebés, e os leões da montanha não criam veados.”
Em Portugal, as estatísticas apontam nesse sentido: em 2012, e apesar da
crise, a percentagem de casas com animais subiu dois pontos. Segundo o
estudo GfKTrack2Pets, feito pela GfK, uma das maiores empresas
internacionais de estudos de mercado, em metade das casas do País há
pelo menos um animal. Os cães ganham (estão em 34% dos lares), os gatos
vêm logo a seguir (17%). Segundo os últimos números divulgados pela
Sociedade Mundial para a Protecção dos Animais, em 2007 havia mais de
1,8 milhões de cães domésticos em Portugal. Gatos eram 993 mil. As
motivações dos donos podem variar. O que não se altera é a ciência por
trás delas.
Em 2011, um grupo de
investigadores do Instituto de Tecnologia da Califórnia, liderado pelo
neurobiólogo Florian Mormann, observou as ondas cerebrais de voluntários
submetidos a imagens de pessoas, animais, objectos e paisagens. As
conclusões foram publicadas na revista Nature Neuroscience: a amígdala
do hemisfério direito do cérebro, associada ao processamento de emoções,
foi a que demonstrou mais actividade sempre que surgiam fotografias de
animais – fossem fofinhos ou aterradores. “É possível que esta
selectividade reflicta a importância que os animais tiveram no nosso
passado evolutivo”, pode ler-se no artigo.
Inês Fontoura cresceu a implorar um animal de estimação. “O
meu pai não queria, dizia que era alérgico”, recorda. No dia em que ele
saiu de casa, depois de se divorciar da mãe, a relações-públicas, agora
com 35 anos, arranjou uma gata bebé, a Pinduim, hoje com 12 anos. Logo a
seguir, um amigo trouxe-lhe mais dois, também recém-nascidos, que tinha
encontrado numa casa abandonada na zona de Loures, a Mel e o Bibas.
Tempos depois, adoptou mais um gato, o Piolho. E depois outro, preto, o
Buscapé. Também não teve coragem de enxotar o cão abandonado, cheio de
medo e de pulgas, que se enfiou no porta-bagagens do seu carro antes da
partida para Lisboa, depois de dias a rondar a casa da família, na costa
alentejana: chamou-lhe Óscar. Apesar de não viver com todos (no seu
apartamento só estão dois dos gatos, os outros vivem ou com a mãe e o
padrasto ou na casa do Alentejo), garante: “Trato os animais melhor do
que as pessoas, acho que são mais indefesos.”
De acordo com pesquisas recentes, nove em cada dez americanos garantem
que os sentimentos que têm em relação aos seus animais de estimação são
semelhantes ou mais fortes do que os que os ligam às pessoas mais
próximas. No Reino Unido, 90% dos donos de animais assumem mesmo: o cão
ou o gato são mais um membro da família.
O investigador japonês Miho Nagasawa já tinha comprovado, através de
análises à urina de um grupo de voluntários, que as suas brincadeiras
com cães eram responsáveis pela libertação de grandes quantidades de
oxitocina, a chamada hormona do amor, presente também no orgasmo e nas
mulheres em fase de amamentação. Mas o trabalho publicado recentemente
pela sueca Kerstin Uvnäs-Moberg, investigadora na Universidade Uppsala e
uma espécie de autoridade universal no estudo da oxitocina, veio
reforçar a tese de que brincar ou simplesmente conviver com animais
domésticos não só relaxa como pode reduzir a tensão arterial e aumentar a
tolerância à dor – tudo efeitos se cundários da hormona. As amostras de
sangue retiradas antes das sessões de festas entre donas e animais não
tinham quaisquer vestígios de oxitocina, mas as colhidas minutos depois
sim, e com altos níveis de concentração. “O mais fascinante é que os
picos da hormona são muito semelhantes aos níveis que costumamos
observar em mulheres que amamentam”, explicou a cientista à cadeia de
televisão ‘PBS’.
Não são só as mulheres que sentem os animais de estimação como filhos.
Jonathan Brum da Silva (na imagem), por exemplo, é inseparável de
Zephyr. Já o levou a andar de caiaque, em Carcavelos, e todos os
domingos faz caminhadas desintoxicantes com ele – em Maio deste ano, a
American Heart Association (a congénere norte-americana da Sociedade
Portuguesa de Cardiologia) divulgou um estudo feito com mais de 5.200
adultos e concluiu que os donos de cães têm 54% mais hipóteses de
atingir as doses diárias de exercício físico recomendado, pelo que
apresentam níveis de colesterol mais baixos, têm menos tendência para a
obesidade e correm menos riscos de desenvolver doenças cardíacas.
Quando lhe ofereceram o cão, há dois anos, Jonathan estava a trabalhar
em Lisboa mas já tinha aceitado uma proposta de trabalho em Kufstein, no
Tirol, Áustria. “Fiquei com ele à mesma. Partimos os dois de Lagos,
onde cresci, na minha autocaravana. Fomos até Sagres, depois subimos
para Vigo, fizemos toda a costa espanhola, passámos por Biarritz, Sul de
França, Mónaco. Quando víamos uma praia de que gostávamos, parávamos,
fartei-me de falar com ele, ia sentado no banco ao meu lado. Na altura
ainda estava com uma ex-namorada, perguntava-lhe o que é que ele achava
dela, se devíamos acabar ou não”, recorda.
Percebeu que a relação não tinha futuro quando, durante a semana que
passou num veleiro, entre as costas italiana e croata, sentiu mais falta
do labrador, que tinha ficado em Trento com os pais de um amigo, do que
da rapariga. Hoje, de regresso a Lisboa, diz que o cão, que vê como um
filho, o tornou uma pessoa melhor: “Uma pessoa que tem um cão mostra ao
mundo que tem maturidade suficiente para ser responsável por outro ser
vivo, é quase como que uma passagem para a idade adulta. Muito do que
sou e do que consegui nos últimos dois anos deve-se a ele. Como o tenho,
quero que ele tenha orgulho em mim e ser um exemplo a seguir por ele.
Esforço-me mais no meu trabalho, sou mais correcto. No próximo ano quero
fazer mais uma viagem de caravana com o Zephyr. A ideia é enchermos o
carro de brinquedos e irmos distribui-los a Marrocos.”
De acordo com John Homans, editor-executivo da ‘New York Magazine’ e
autor de ‘What’s a Dog For’ (Para que serve um cão, sem tradução em
Portugal), lançado em 2012, é para isto mesmo que os cães (e quem diz
cães, diz gatos) hoje servem: para preencherem espaços vagos nas vidas
dos humanos. “Nos últimos 40 anos assistimos a uma explosão das
populações de animais domésticos nos países ocidentais. As pessoas têm
vidas mais isoladas, têm menos filhos, os casamentos não duram.
Simplesmente estamos a deixar que os animais preencham os espaços vazios
das nossas vidas”, explicou-lhe um investigador.
Quando o Mingau lhe apareceu à porta, cheio de sarna e com apenas dois
meses, em Dezembro de 2010, Ana Geraldo (na imagem), a única portuguesa a
fazer o doutoramento na Universidade de Pirassununga, no estado de São
Paulo, viu no gato uma espécie de âncora, um motivo mais para continuar a
viver a 8 mil quilómetros de casa. Claro que tinha amigos e colegas com
quem estar, mas a relação que estabeleceu com o animal era diferente:
“Era uma companhia. Sabes aqueles momentos em que precisas de estar com
alguém que te conforte? Em que dás e recebes? O Mingau é isso mesmo, é o
meu gato, é a minha família. E ele precisa de mim, passei a estar ali
não só porque estava a estudar mas também porque tinha o Mingau.”
Pedro Barros Pereira, que viveu com o Metralha entre 2003 e 2007 em
Maputo, diz que sentia o mesmo. A 11 mil quilómetros de casa, tudo o que
tinha era o dálmata, que lhe fazia companhia em casa, até quando ia à
casa de banho, e no surf (para dentro de água o cão ia com colete
salva-vidas, no areal, andava sempre de óculos de sol): “Cheguei a
receber ameaças de morte, as pessoas com quem fui trabalhar não gostavam
muito de mim, a minha função incluía fazer despedimentos... Uma vez
mandaram-me um envelope com uma bala e um recado a dizer que ainda havia
mais cinco para mim. O Metralha dava-me apoio emocional e familiar, não
tinha lá mais ninguém. Quando os meus avós morreram, viu-me a chorar e
veio ter comigo, ficou abraçado a mim a tarde inteira.”
De acordo com Alfredo Pereira, professor do departamento de Zootecnia da
Universidade de Évora com formação na área do comportamento animal e
treino de cães, é verdade que estes animais são capazes de detectar
pormenores e subtilezas muito mais depressa do que os seres humanos. “A
linguagem corporal, o tom de voz, os odores, até a ausência de
comunicação – os cães são sensíveis a tudo isso.” O que já não parece
credível é que os animais sofram com os donos: “As pessoas tristes têm
uma linguagem corporal muito própria, que se nota sobretudo na ausência
de comunicação com o animal. Todos os cães têm personalidades e
comportamentos completamente diferentes, não há um estereótipo, nem
sequer associado às raças. Pode acontecer que uns permaneçam estáveis
perante as alterações dos donos, e que outros tentem desbloquear a
situação, para recuperar a normalidade.”
Está provado: os animais de estimação não servem apenas de consolo nos
maus momentos, aumentam também – e em grande escala – as probabilidades
de os donos socializarem. Uma experiência feita no Reino Unido, na
Universidade de Warwick, teve resultados categóricos: 65 pessoas pararam
para conversar com homens e mulheres que passeavam cães pela trela;
quando essas mesmas pessoas saíram para as mesmas ruas sem os animais
foram abordadas apenas três vezes. Inês Fontoura costuma passear os
cães, que vivem em casa da mãe, com um grupo de vizinhos que todas as
noites se reúne para dar a volta ao bairro com os animais, e confirma a
tendência: “Já fiz um grande amigo assim, conhecemo-nos por causa dos
cães, aproximámo-nos, fui ao casamento dele e tudo.”
Pedro Barros Pereira, dono do Metralha e o amigo a que Inês se refere,
reforça: “Não há miúdo que não me conheça aqui na vizinhança, poucos
sabem é o meu nome, sou o rapaz do dálmata. Em tempos também cheguei a
arranjar namoradas através do Metralha.” Agora já não: é casado e pai de
três filhos, diz – o cão, de 11 anos e o único já com página no
Facebook, Inês, de 2, e João, de 2 meses.
Outra evidência científica: crianças que crescem em casas onde há
animais têm menos probabilidades de desenvolver problemas alérgicos e
asma. E também tendem a tornar-se mais responsáveis, sobretudo se forem
encarregues de tratar dos bichos. Aos 7 anos, Martina (na imagem) já
sabe que é ela que tem de alimentar e de levar a Laika, metade labrador,
metade golden retriever, de apenas cinco meses, a passear. “Estamos a
tentar passar-lhe algumas responsabilidades, achamos que é bom para ela e
ela até gosta. Só reclama de ter de apanhar o cocó, isso não gosta
muito de fazer”, conta a mãe, Cláudia Cascais, 37 anos, account manager
na Cisco.
Alfredo Pereira diz que há vários outros trabalhos sobre os efeitos
positivos dos animais, não só com crianças mas também com reclusos: “Foi
feito um estudo, creio que numa prisão nos Estados Unidos, em que foram
entregues cães abandonados a vários reclusos. Comprovou-se que, com
essa responsabilização, os níveis de agressividade latente, o grau de
excitação e a frequência de disputas baixaram imenso.” Outra evidência
científica mais ou menos conhecida: fazer festas a um animal tem um
efeito relaxante. A novidade, explica o professor da Universidade de
Évora, é que passar a mão pelo dorso de um gato não é o mesmo que afagar
um cão. “O pêlo do gato, sendo mais macio e apresentando uma textura
diferente, parece libertar maiores quantidades de endorfinas, pelo que
se torna mais eficaz na diminuição do stresse.”
No Stress Team é como se chama a escola de treino canino, na zona de
Sintra, onde Rodrigo Antunes, 9 anos, e Duarte Ávila (na imagem), 8,
ambos autistas, fazem Terapia Assistida por Animais. O método está
cientificamente comprovado: um grupo de investigadores liderados por
Marguerite O’Haire, da Faculdade de Psicologia da Universidade de
Queensland, na Austrália, publicou em Fevereiro um estudo feito com 99
crianças autistas, divididas em grupos – a umas foram dados brinquedos, a
outras porquinhos-da-índia. “As crianças com autismo envolveram-se em
55% mais comportamentos sociais quando estavam com os animais”, explicou
a especialista. Também sorriram duas vezes mais.
No dia 27 de Setembro de 2013, foi dia de regresso à terapia para
Rodrigo e Duarte, depois de três meses de férias de Verão. “Devem vir
impossíveis”, preveniu logo Paula Moreira, a responsável pela escola.
Sem termo de comparação, os miúdos pareceram estar apenas com saudades
da setter inglesa Fiona e com pouca paciência para trabalhar: os
primeiros 30 minutos de terapia até correram bem, mas depois disso
ficaram ambos impacientes, chorosos e com vontade de ir embora. “O cão
neste contexto é um elemento facilitador: além de as tranquilizar,
consegue comunicar melhor com estas crianças, que também não falam,
utilizam todos apenas a linguagem corporal”, explica Paula Moreira.
Joana Nogueira, a terapeuta, acrescenta: “Cada um deles tem um plano de
trabalho diferente, mas no fundo o objectivo é trabalhar a interacção
social e desenvolvê-los ao nível cognitivo e motor, fazendo o
reconhecimento de letras, encaixe de puzzles, associação de imagens aos
objectos, saltos...”
No fundo, o cão mascara o trabalho de brincadeira. “Aqui eles percebem
que o pé serve para chutar a bola para o cão e que as mãos servem para
atirar a bola ao cão”, explica Paula Moreira. Quando Rodrigo passeia
Fiona pela trela, está a trabalhar a força e o movimento nas mãos.
Quando Duarte tem de agarrar um pedaço de ração com os dedos em pinça,
para recompensar a cadela, está a trabalhar a motricidade fina.
Os pais garantem que nenhuma outra terapia deu tanto resultado até à
data. “Ele já fez terapia da fala, ocupacional e hipoterapia e todas as
competências que tem em termos de conhecimento foram adquiridas aqui. O
animal é quase uma desculpa para a brincadeira, funciona. Desde que aqui
está, o Duarte evoluiu imenso: corta com uma tesoura, reconhece os
números e as letras do nome, faz encaixes, consegue identificar imagens
num cartão e os objectos correspondentes, desenha círculos, faz riscos
na horizontal e na vertical e sabe pôr a mesa”, enumera o pai, Pedro
Ávila.
Elisabete Antunes, mãe de Rodrigo, também nota progressos: “Às vezes
chega aqui completamente desorientado e depois fica mais calmo, mais
sereno. Está mais receptivo, não tão fechado, mesmo em relação a
animais, tínhamos um peixinho e ele não lhe ligava nenhuma. Antes não
estabelecia contacto com pessoas ou animais, estava sempre fechado na
sua bolhinha. Com a terapia abriu-se uma janela, já consegue olhar-nos
nos olhos, já toca nas coisas. Há tempos, em casa, partiu um candeeiro.
Foi um dos dias mais felizes da minha vida.”
Um dos mais tristes da sua, antecipa Pedro Barros Pereira, será o dia em
que o Metralha desaparecer. Aos 11 anos (o que em idade de cão,
obedecendo à regra dos 7, dá 77), já não salta como antes, tem
dificuldade em correr e sofre de artroses. “Viveu comigo o fim da
adolescência, a fase em que comecei a trabalhar, o ir para fora do País,
conhecer sítios e pessoas novas, fazer loucuras, voltar, ter filhos...
Nem quero pensar. Não vejo a minha vida sem o Metralha.”
* Apenas humanidades, aprendamos.
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