Isto (ainda não)
é uma reforma
O Governo fez as contas a quanto terá de cortar no próximo ano para cumprir a meta do défice.
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O resultado é um número pesado - 1,4 mil milhões de euros
- o que, ainda assim, não é tão grande como os 1,7 mil milhões de
algumas estimativas recentes ou mesmo os dois mil milhões que se chegou a
temer serem precisos para cumprir a vontade de Bruxelas. Mas, se havia
boas notícias no anúncio feito esta semana pela ministra das Finanças,
elas esgotam-se nisto: na revelação de que a tesoura da austeridade vai
cortar menos e de que o esforço dos portugueses será aliviado em 2015 -
se é que podemos considerar uma boa notícia ouvir dizer que "apenas"
será preciso cortar 1,4 mil milhões de euros (muito por obra e graça,
recorde-se, de uma boa execução orçamental e da melhoria de uma série de
indicadores que também resultam de um brutal ajustamento das famílias e
dos portugueses nos últimos anos). Chamemos-lhe, por isso, uma notícia
menos má.
A parte difícil vem a seguir: saber como o Executivo chegou a
esse número (porque não anunciou medidas concretas) e como tenciona
executá-las (o que faz levantar dúvidas sobre o seu sucesso). Lançar um
número tão certinho para cima da mesa e adoptar a política do "depois
logo se vê como lá chegamos" é sempre uma má medida. Como são todas
as estratégias sem metas: não funcionam. Para começar, como se pode
anunciar um número se a discussão das medidas com a ‘troika' só começa
na próxima semana e o anúncio das decisões foi empurrado para o final do
mês? O que sabe o Governo para chegar a este número que não pode ainda
contar ao país? Depois, os caminhos indicados são demasiado vagos para
servirem de orientação. Por onde vão passar os cortes nos ministérios?
Vão implicar a eliminação de mais funções sociais do Estado, em áreas
sensíveis e problemáticas como a Saúde ou a Educação? E com que
critério? Ainda não se sabe. Como vão garantir os cortes nos chamados
"consumos intermédios", precisamente uma área onde o Governo não
conseguiu cumprir a meta de redução acordada com a ‘troika' no último
ano (e vamos ver como será este ano)? E se essas gorduras do Estado são
possíveis de eliminar agora, por que razão isso não se fez antes de toda
a sobrecarga fiscal e asfixiante corte de rendimentos que se exigiram
aos portugueses? Ainda não se percebeu. E tudo isto sem esquecer que,
entre a revelação de um número e o anúncio adiado de medidas, ficam no
limbo milhares de pensionistas e funcionários do Estado, os principais
alvos dessa espécie de reforma do Estado que se anda a desenhar, sem
saberem o que realmente os espera no próximo ano.
Pelo meio, é bom saber que tudo o que está em cima da mesa, seja
lá o que for, não implica qualquer contributo adicional para a
consolidação orçamental, leia-se, mais sacrifícios - palavra de
ministra. Mas até se saber rigorosamente o que vai sair deste plano para
a reforma-do-Estado-que-nunca-mais-acontece, é difícil ficar tranquilo.
Seja qual for o caminho, os portugueses já sabem que vão ter cortes (e
ainda duros) pela frente. Só precisam de saber como se preparar para
eles. Mais: falta ainda saber qual o peso que a variável "eleições em
2015" tem nestas contas que permitiram chegar a um número tão exacto.
IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
17/04/14
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