Da dívida às fotos
para alemão ver acabando
. nos erros do futebol
O
tema que tem agitado os dias políticos dá por vários nomes:
mutualização, renegociação ou reestruturação da dívida pública. E parece
dividir os prós e contras em barricadas opostas. Mas, entre o ser e o
parecer vai uma grande distância. E na verdade o que há mesmo é um
consenso alargado sobre o assunto.
O único problema é nem todos o
poderem assumir. O Governo não o pode dizer publicamente, só o pode
desejar em privado. O PSD, por solidariedade governamental, também não
pode ter nenhum dos seus membros a gritá-lo aos sete ventos, ainda que
possam surgir descuidos, como o de Miguel Frasquilho.
O Presidente, como
é óbvio, tem de manter uma posição institucional, sem sombra de
suspeitas perante os credores, de apoio ao rigor com que saldamos os
nossos compromissos, mesmo que deixe escapar, em prefácios ou no meio de
comunicações ao País, aquilo que realmente pensa. E o próprio PS, na
pole position para assumir o poder daqui a menos de ano e meio, tem de
manter algum low profile que não alarme os mercados. Mas a verdade é que
os números, os factos, as projeções e a realidade dizem que não vai ser
possível liquidar a dívida nacional de acordo com o que está
estabelecido. E haverá um momento em que isso ficará claro como a água.
Ainda não é o momento. Mesmo assim, já há muita gente a moderar o
discurso de há semanas. O bicho--papão acabará transformado em D.
Sebastião. É dos livros.
Os pequenos produtores florestais vão ser
premiados no IRS. Quem tiver mais filhos também. As horas extra estão
igualmente na calha para ter descontos neste imposto. Além dos
incentivos fiscais, o Governo já admite repor parte dos salários
cortados, ainda que não voltando aos níveis de 2011. O PS, já a fazer
contas para estar no poder em 2015, repete a proposta. E entre o
realismo eleitoral socialista e o eleitoralismo de pré-campanha do PSD
há uma certeza: os dois partidos já só pensam em legislativas.
Fazem-se
fotos simbólicas para alemão ver. Juntam-se ex-ministros das Finanças
com o mesmo recado. Olha-se para as europeias apenas como se fosse a
volta de aquecimento de um Grande Prémio de Fórmula 1. E vão-se começar a
fazer ultrapassagens, perdão, promessas impossíveis de cumprir. A
tentação eleitoral é demasiado grande e como de costume ninguém
resistirá. Vale dar benesses a quem plantar uma árvore, ou fizer um
filho, quiçá até para quem queira escrever um livro. Acabar a tratar com
ironia com alguns destes temas é lamentável. Ninguém fica bem no
boneco.
Em setembro do ano passado foi um aqui d"el rey sobre a
necessidade de alterar a lei eleitoral. Até havia, e há, imagine-se!, um
consenso generalizado entre todos os partidos. A cobertura jornalística
das autárquicas, manietada pelas baias da Comissão Nacional de
Eleições, fora o sinal de que eram precisas mudanças urgentes. Bem... o
conceito de urgente na política depende de muitos interesses. Talvez por
isso, a discussão só foi retomada em fevereiro, a três meses das
europeias. E não vai ser possível fazer nada a tempo da campanha,
ficando tudo na gaveta até às legislativas, se entretanto der jeito.
Agora, quando os principais partidos até estão próximos um de outro no
que toca ao pensamento europeu, não convinha muito. Expunha demasiado.
Depois logo se verá.
O futebol é o exemplo máximo da resistência
às mudanças na Europa. O desporto que nasceu em Inglaterra e depois se
espalhou por boa parte do mundo, continua agarrado a tradições que não
fazem sentido no mundo tecnológico nos nossos dias e que o tornam uma
das mais obsoletas modalidades da atualidade. Vem isto a propósito da
discussão nacional das últimas semanas, com as queixas de enganos dos
árbitros a favor de uma ou outra equipa, com maior ou menor
intencionalidade.
Feliz do país que em vez de guerras, mortes ou fome,
pode centrar a discussão da atualidade em penáltis por marcar, diga-se
para começar. Quanto ao problema em si, ele manter-se-á enquanto a
questão de fundo não for resolvida e se mantiver ad eternum o mesmo
debate de sempre. Só introduzindo os meios tecnológicos, à disposição e
já testados, com informações em tempo real para árbitros e outros
agentes do jogo, os erros humanos podem ser minimizados. O resto é
conversa para entreter adeptos.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
22/03/14
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