Ser bom e sem vergonha
Os portugueses nunca estão bem. Experimente perguntar por aí como estão e verá que mesmo que tenham acabado de receber a melhor notícia do mundo estão sempre “assim-assim”, “vão andando”, ou pior: estão “como Deus quer”. O estado de espírito parece não ter nada que ver com vontade própria mas antes resultar de um desígnio superior e castigador.
Estar
bem é que não pode ser; óptimo, então, nem se fala. Heresia! Há um
pudor instalado em sorrir - diz que é sinal de pouco juízo! -, em
afirmar com segurança que a vida corre bem.
Cá para mim, é tudo
um disparate. Se nós próprios não somos capazes de nos orgulhar daquilo
que fazemos bem, se não conseguimos sentir-nos realizados com as
pequenas conquistas diárias e relativizar os momentos menos bons, com
certeza não serão os outros, os que estão à nossa volta, a fazê-lo por
nós.
Muito da maneira como nos vêem é responsabilidade nossa. O
reflexo da imagem que temos do que somos e alcançamos. Basta ver como
tantos nos retratam lá fora: um povo de maus costumes, preguiçoso e
conformado, que precisa de rédea curta e voz de comando para chegar onde
quer que seja. Injustiça pura e dura.
Mas é culpa nossa, porque
em vez de valorizarmos o nosso melhor, de o apregoarmos a alto e bom
som, baixamos a cabeça e envergonhamo-nos do sucesso. Não queremos
mostrar-nos com receio de que vejam em nós o sapo que queria ser boi e
acabou por rebentar de tanto se fazer inchar. Mas é precisamente isso
que temos de ser: mais inchados, mais orgulhosos, mais vaidosos. Engolir
menos sapos. Ser mais italianos. Mais americanos.
Não faço a
apologia da vaidade sem suporte nem contexto - muito menos da presunção
-, mas não há razão para se menorizar, se de facto é um bom
profissional. Pelo contrário, só tem a ganhar com isso. Cada vez que
desvaloriza o seu trabalho, está a alimentar a tentação dos que estão ao
seu lado, acima e abaixo, de interiorizarem que talvez apenas tenha
tido sorte daquela vez, em lugar de criar neles a convicção de que sem
si não teria sido possível chegar ao sucesso.
Esqueça a vergonha.
Se é bom, mostre-se e apresente-se como tal. Faça-se pesar pelo valor
que tem. É o primeiro passo para ser visto por aquilo que é.
Chefe de redacção adjunta do Dinheiro Vivo
IN "DINHEIRO VIVO"
09/12/13
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