19/12/2013

JOANA PETIZ

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Ser bom e sem vergonha

Os portugueses nunca estão bem. Experimente perguntar por aí como estão e verá que mesmo que tenham acabado de receber a melhor notícia do mundo estão sempre “assim-assim”, “vão andando”, ou pior: estão “como Deus quer”. O estado de espírito parece não ter nada que ver com vontade própria mas antes resultar de um desígnio superior e castigador.

Estar bem é que não pode ser; óptimo, então, nem se fala. Heresia! Há um pudor instalado em sorrir - diz que é sinal de pouco juízo! -, em afirmar com segurança que a vida corre bem. 

Cá para mim, é tudo um disparate. Se nós próprios não somos capazes de nos orgulhar daquilo que fazemos bem, se não conseguimos sentir-nos realizados com as pequenas conquistas diárias e relativizar os momentos menos bons, com certeza não serão os outros, os que estão à nossa volta, a fazê-lo por nós.

Muito da maneira como nos vêem é responsabilidade nossa. O reflexo da imagem que temos do que somos e alcançamos. Basta ver como tantos nos retratam lá fora: um povo de maus costumes, preguiçoso e conformado, que precisa de rédea curta e voz de comando para chegar onde quer que seja. Injustiça pura e dura.

Mas é culpa nossa, porque em vez de valorizarmos o nosso melhor, de o apregoarmos a alto e bom som, baixamos a cabeça e envergonhamo-nos do sucesso. Não queremos mostrar-nos com receio de que vejam em nós o sapo que queria ser boi e acabou por rebentar de tanto se fazer inchar. Mas é precisamente isso que temos de ser: mais inchados, mais orgulhosos, mais vaidosos. Engolir menos sapos. Ser mais italianos. Mais americanos.

Não faço a apologia da vaidade sem suporte nem contexto - muito menos da presunção -, mas não há razão para se menorizar, se de facto é um bom profissional. Pelo contrário, só tem a ganhar com isso. Cada vez que desvaloriza o seu trabalho, está a alimentar a tentação dos que estão ao seu lado, acima e abaixo, de interiorizarem que talvez apenas tenha tido sorte daquela vez, em lugar de criar neles a convicção de que sem si não teria sido possível chegar ao sucesso.

Esqueça a vergonha. Se é bom, mostre-se e apresente-se como tal. Faça-se pesar pelo valor que tem. É o primeiro passo para ser visto por aquilo que é.

Chefe de redacção adjunta do Dinheiro Vivo

IN "DINHEIRO VIVO"
09/12/13

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